EM DIREÇÃO À  META  SUPREMA

(Paramartha Prasanga)

Swami Virajananda

 

 

1- Para realizar Deus, o aspirante deve ter paciência, perseverança, pureza de coração e da mente, intenso anelo e os seguintes seis atributos: shama (tranquilidade mental); dhama (restrição dos sentidos); uparati (desapego aos objetos); titiksha (imunidade a toda espécie de aflições); shraddha (fé nas palavras do instrutor espiritual e nas Escrituras) e samadhana (concentração da mente no Ideal Escolhido ou Deus).

 

2- As realizações, visões e experiências semelhantes advindas das práticas espirituais devem ser ditas somente ao Guru e a mais ninguém. Mantenha sempre o seu tesouro espiritual e os seus pensamentos mais íntimos bem resguardados em seu interior. Eles não devem ser alvos da curiosidade alheia por se tratarem de posses sagradas a serem partilhadas em segredo por nós e o Senhor. Da mesma forma, não devemos falar de nossos defeitos e culpas: perderíamos a auto-estima e o respeito dos outros. Os mesmos são para serem confessados ao Senhor. Ore a Ele, para que lhe dê força para superá-los.

 

3- Para começar a meditação, sente-se imóvel por um determinado tempo e observe a mente. Deixe-a vagar para onde quiser; pense que é a testemunha, aquele que vê. Sentado, observe como a mente flutua e afunda, corre e salta. Pense então: “não sou o corpo, nem os sentidos, nem a mente; estou totalmente separado da mente; a mente também é material, uma forma somente mais sutil de matéria. Sou o ATMAN, o Eu, o Mestre. A mente é minha serva”. Sempre que um pensamento ocioso surgir na mente, tente dominá-lo imediatamente, com firmeza.

 

4- Comumente respira-se pela narina esquerda quando se descansa, pela direita quando se trabalha e por ambas durante a meditação. O estado mais favorável à meditação é quando o corpo e a mente se tenham acalmado e haja igual fluxo de alento por ambas as narinas. Mas não dê demasiada atenção à respiração, nem faça disso o guia regulador de suas atividades.

 

5- Quando a mente está absolutamente calma, a respiração fica estável e segue-se kumbhaka (retenção do alento). Com o controle da respiração, a mente se focaliza num único ponto. Bhakti (devoção a Deus) também proporciona a retenção do alento, sem esforço (kumbhaka) e o controle da respiração. Mesmo sem a prática do yoga, chega-se automaticamente ao controle do alento (pranayama), bastando para isso lembrar-se de Deus, fixar o pensamento Nele e fazer japa com devoção.

 

6- Não existe outro método fácil ou conveniente para se centrar a mente a não ser abhyasa (esforços repetidos e sustentados) e vairagya (desapego aos objetos dos sentidos).

 

7- O tempo dedicado a japa e à meditação, mesmo que seja de uns dez ou quinze minutos, faça-o com todo o coração e com toda a alma. O Senhor é Aquele que habita dentro de nós, o Guia Interno. Ele vê nossos corações. Sua medida não é o tempo decorrido na meditação sobre Ele, nem o número de japas recitados, mas o anelo interior do devoto.

 

8- No começo, japa e meditação têm um gosto seco. Deve continuar a praticá-los, mesmo que lhe pareça estar tomando remédio; no entanto, depois de tê-los praticado firmemente durante três ou quatro anos, encontrará alegria. Então, se você faltar à meditação, mesmo por um dia que seja, sentir-se-á infeliz, desarticulado, por assim dizer.

 

9- O auto-esforço (purushakara) é necessário para a realização espiritual. Resolva com determinação: “realizarei Deus por meus próprios esforços, cumprindo práticas espirituais” e, mantendo-se firme na prática de japa e meditação, sentado na postura correta, no mínimo duas horas pela manhã e pela noite, durante três ou quatro anos, verifique se será ou não bem sucedido.

 

10- Não é bom para os chefes de família praticar pranayama ou yoga em demasia. Aqueles inclinados a fazê-lo, devem observar estritamente regularidade e moderação em todas as etapas da vida. Devem tomar alimentos nutritivos e sátvicos (puros) em horas certas, exercer atividades bem ordenadas, levar uma vida sem preocupações num lugar saudável e isolado, com ar puro e clima temperado, manter os intestinos limpos, usar a fala com moderação e acima de tudo, observar imperativamente brahmacharya (perfeita continência). A violação dessas instruções pode causar moléstias do coração ou do cérebro.

 

11- Quando, pela prática contínua de japa e meditação , a mente se tenha tornado calma e purificada, ela própria será o seu Guru ou Guia. Terá adequado entendimento de tudo e encontrará solução para as dúvidas espirituais e as perguntas que lhe surjam. A mente lhe dirá o que deve fazer, uma coisa após a outra e como você deve conduzir-se.

 

12- Ao praticar japa, medite também na forma do Ideal Escolhido, senão japa jamais se tornará profunda. Mesmo que a forma da divindade não se manifeste na meditação, comece por qualquer parte, pela forma que chegou. Tente várias vezes. Prossiga, mesmo falhando. Não há porque desistir pelo fato de não ser logo bem sucedido. Virá a meditação tão facilmente quanto se deseja? Repetidos esforços devem ser feitos para trazer a mente dispersa nos objetos e concentrá-la no objeto de meditação. O sucesso advirá com a continuidade da prática.

 

13- Japa é a repetição mental do mantra. A contagem é feita nos dedos, no rosário (mala) ou ainda conservando-a na memória. Esses são meios preliminares de auxílio para que a mente não se desvie dos objetivos e se fixe no objeto de adoração, de outra forma, não saberemos quando a mente foge para outra direção e quando cochilamos. Assim, ainda que este processo possa parecer trazer-lhe pequenas distrações no começo, permitir-lhe-á, no entanto, observar as divagações da mente, detê-las facilmente, trazendo-a de volta e fixando-a no objeto da meditação.

 

14- Jamais pense que é fraco. Tenha fé firme em você mesmo. Pense: “nada há que eu não possa fazer. Posso fazer tudo o que desejar”. Por que aceitar derrotas? Saiba que ao dominar a mente, o mundo inteiro estará a seus pés. Quem não tem auto-confiança, não tem realmente fé em Deus. Swami Vivekananda dizia: “ateu é verdadeiramente aquele que não tem fé em si mesmo e Deus também não lhe ouve as orações”.

 

15- Asana é a postura na qual podemos sentar-nos firmes e comodamente para meditação, por muito tempo. A espinha deve ser mantida ereta e o peito, pescoço e cabeça devem estar retos para que o peso inteiro da parte superior do corpo se sustente sobre as costelas e o tronco não se incline para a frente ou para trás. Uma postura inclinada não é saudável em nenhum caso.

 

16- A mente inevitavelmente estará inquieta por ocasião da meditação, enquanto não se tenha enraizado em você a idéia de que o mundo é não-substancial e transitório e que somente Deus é a única realidade. O amor a Deus crescerá e, então, a mente se tornará calma para você poder libertar-se da sede dos prazeres sensórios. Todos os prazeres do mundo se tornarão triviais e insípidos, se apenas uma pequena partícula do amor de Deus for experimentada.

 

17- De japa, meditação, adoração ritualística, oração, lembrança de Deus, leitura de livros sagrados, associação com homens santos, conversação sobre temas divinos, retiro em solidão e cultivo de pensamentos espirituais, de quaisquer dessas atividades devemos tirar proveito, praticando as que mais nos atraem e nos alegram, de acordo com nossa disposição e oportunidade apresentada.

 

18- O homem sensato não tenta diagnosticar a própria doença nem prescrever sua medicação pela simples leitura de livros de medicina. Em caso de doença deve ser buscado o conselho médico. Da mesma forma, se após ler muitos livros e Escrituras com a mente confusa e atormentada por dúvidas e receios, escolher uma disciplina particular, poderá seu progresso ser interrompido numa perda de esforços, caso não resulte em mal maior, pois as várias Escrituras divergem e até se contradizem na indicação dos métodos para os diferentes temperamentos, capacidades e estágios de vida. É portanto perigoso em muitos casos decidir por si mesmo o que será exatamente aconselhável para você. Somente o Guru poderá dirigi-lo no caminho certo. Eis por que o conhecimento espiritual tem que ser obtido diretamente de um Guru. Saiba que a iniciação e as instruções dadas por ele são o único caminho que você deve seguir. Se fizer as práticas espirituais conforme suas prescrições, sem desviar-se e com inteira fé nelas e nele, esteja certo do sucesso. De qualquer forma, jamais abandone as práticas e procure outros métodos sob qualquer conselho. Se saltar de uma coisa para outra, o resultado será perder o caminho e ficar à deriva sem qualquer proveito.

 

19- A fé opera milagres, torna o impossível, possível. A fé faz soltar as velas do barco para velejar até à terra firme. Aquele que duvida, afoga-se mesmo em pouca água.

 

20- Esperança é vida. A esperança é a fonte de toda fortaleza e esforço. Se a esperança for abandonada, sofre-se a agonia da morte e a pessoa se transforma em morto-vivo. Mantenha a esperança até o último alento. Jamais abandone a esperança de realizar Deus enquanto a morte não chega. Se Deus quiser, poderá derramar Sua graça sobre você a qualquer momento. Tenha fé de que Ele poderá revelar-Se ainda que no último instante.

 

21- Quando Deus, através do Guru, em Sua misericórdia sem limites lhe deu o siddhamantra (fórmula mística do nome particular da divindade e chave do portal do seu santuário) saiba que Ele deu-se livremente; mas é necessário que você tenha firme convicção disso. Se perder esta jóia sem preço, por descuido ou negligência, saiba que você é incapaz de receber Sua graça. A apreciação certa desse dom é a prática, até que o objetivo seja atingido. Somente assim você estará apto a pagar-Lhe um pouco da dívida. Quanto mais realizar que Deus é o que está mais próximo e que é o mais íntimo e querido dos nossos mais íntimos e queridos, maior receptáculo de Sua graça você terá. Através da graça divina ficará livre e venturoso nesta vida.

 

22- Enquanto o amor e a devoção a Deus não crescerem, não se pode ser consciente da natureza transitória e não-substancial do mundo. A mente é só uma, não pode ser dividida em compartimentos, uma parte devotada a Deus e outra tomada de desejos por nome, fama e objetos dos sentidos. Deus não pode ser realizado a menos que a mente inteira lhe seja entregue. Se não puder fazê-lo, você terá que renascer várias vezes e sofrer infelicidades intermináveis.

 

23- Para renunciar ao mundo, não é necessário ingressar numa Ordem Religiosa ou retirar-se para a floresta. A verdadeira renúncia é mental. Abandonando mentalmente o mundo, permanecer você nele ou na floresta será a mesma coisa. Se fugirmos para a floresta sem renunciar completamente ao apego aos objetos dos sentidos, o mundo nos seguirá onde formos. Teremos os mesmos problemas e não haverá como fugir dos objetos mundanos.

 

24- Se é mesmo necessário estar no mundo, faça de Deus o seu mundo, erigindo-Lhe um lar. O que quer que faça, veja ou ouça, pense que tudo é Deus. É uma brincadeira, um jogo com Ele. A vida é um jogo no qual a própria Mãe é o jogador e você é seu companheiro. Se souber que a Mãe está jogando com você, o mundo então será muito diferente. Você descobrirá que nesse mundo não há felicidade, nem infelicidade; nem bem, nem mal; nem apego, nem aversão; nem cobiça, nem ciúme. Consequentemente, toda ilusão, interesse próprio e conflito se desvanecerão e os pares de opostos não o atormentarão mais. Toda a idéia de união ou separação, de amigo ou inimigo, de alto e baixo, de “eu e meu”, serão inexistentes no jogo da Mãe Divina; haverá somente a existência de inexaurível felicidade, amor sem limites e paz infinita. Se uma única gota dessa felicidade for experimentada, os objetos mundanos perderão o sentido e serão desprezíveis.

Um átomo que seja desse amor fará com que o mundo inteiro seja mais querido que os mais queridos e a felicidade celestial será cada vez mais sentida em cada poro do corpo. Não haverá receio nesse jogo, nenhuma ansiedade, nenhuma ligadura, nenhum cansaço, será sempre um jogo novo. Que infinidade de maneiras de jogar a Mãe conhece! Você se perde no próprio pensamento e nele se funde. No momento do êxtase transcendental, o jogo cessa; pois, quem está jogando e com quem joga? Esta beatífica experiência, estado venturoso de união, está além do alcance da fala e da mente; só sabe quem sabe. Grande alegria! Ó que grande alegria!

 

25- Queremos gozar ao máximo todos os prazeres mundanos e ao mesmo tempo realizar Deus. Sonho vão! Não podemos fazê-lo, amigo meu!

 

26- Se Deus chegar e disser: “que deseja você? Deseja a mim ou quer levar uma vida feliz, cheia de nome, fama, saúde e bens por cem anos, com esposa, filhos e netos?” Quase certo, você verificará que todos suplicarão ansiosamente por aquelas coisas, à exceção de um em cada dez milhões.

 

27- Para a realização de Deus há que desejar-se a Ele de coração e alma, cem por cento, nem menos de uma milionésima parte de um por cento ou a menor fração desta parte. O que a maioria de nós busca é realizá-lo facilmente, sem muito trabalho e aborrecimento e qualquer sacrifício. Desejamos um compromisso com Deus e com o mundo. Pensamos que se o Guru , com sua infinita misericórdia, pode trazer Deus até nós e nos dar a salvação, nada poderia ser melhor do que isso. Ah, como pode ser assim? O Senhor deve ter sua cota inteira e certa até o último centavo.

 

28- Quem realmente deseja Deus, encontra-O. Aquele que não O deseja está sujeito a dançar ao som dos cinco demônios, tornar-se o joguete dos cinco elementos que compreendem o material do corpo e do universo: a terra, a água, o fogo, o ar e o éter. Estará à mercê das más influências de toda espécie.

 

29- Deixando-se enganar por uma propaganda, muitos correm a comprar ouro por preço irrisório. Mas só o ouro genuíno é ouro; algo que simplesmente brilha como ouro não é ouro, mas algo falso e espúrio. E lá se vai o seu dinheiro.

 

30- A oração não consiste em recitar uma fórmula determinada. Isso não dará fruto. Você deve sentir uma real necessidade interna pelo que está orando, deve sofrer intensa dor e agonia enquanto sua prece não for atendida. Você não deve descansar até descobrir a maneira e os meios de atingir o objeto de sua oração, a despeito de insuperáveis dificuldades no caminho, esforçando-se de coração e alma para consegui-lo, como se a vida dependesse somente disso. Só então sua prece será atendida e alcançado o desejo do seu coração. Orações assim atingirão o trono do Altíssimo.

 

31- O mais alto conhecimento, devoção e espiritualidade só podem ser adquiridos através de muito esforço próprio. Você terá que lutar duramente para consegui-los; só assim se tornarão duradouros e seus, enchendo-lhe a mente de inenarrável alegria. Ninguém poderá presenteá-los a outrem. A prática espiritual deve ser diligentemente executada; só então atingir-se-á a realização. O crescimento depende da intensidade do esforço espiritual. Aquilo que é obtido sem disciplina ou sem árduo esforço perde sua gravidade, não é valorizado e não traz aquele sentido de felicidade conquistada com tanto empenho. Além disso, pode-se esvair tão facilmente como chegou e será de pouca utilidade quando nós formos atingidos por pesados golpes. Em meio a perigos, dificuldades, provas e tribulações, isso será totalmente varrido de nossas vidas. Para tornar muito sua a espiritualidade, você deve saturar-se da idéia da realização do Ser. Sua natureza tem de ser totalmente superada para que surja a nova personalidade. É como nascer outra vez, no mesmo corpo. Será isso uma brincadeira de criança? Só lhe será possível o objetivo se você estiver bem desperto e lutar ao máximo, como se a vida inteira estivesse em jogo. Continue, pois, com as práticas espirituais sem interrupção, com devoção pura até alcançar a meta.

 

32- Se abandonar  o pequeno “eu” por amor aos outros,  não somente encontrará o  “Eu” verdadeiro como fará com que os outros lhe sejam íntimos também. Quanto mais busque salvar o seu pequeno “eu”, mais se afastará do verdadeiro “Eu” e se afastará dos outros.

 

33- Continue a lutar sem cessar.  Lute como um herói.  Nunca olhe para trás e prossiga sempre adiante rumo ao objetivo! Não dê atenção se você se sentir exaurido, ferido ou mutilado durante a caminhada. Seja hábil, intrépido. Não tenha medo! Coragem! Coragem! Não permita sequer um pensamento de derrota em sua mente. Caia o corpo, mas a realização do objetivo seja o seu mantra. Vitória ou morte! Seja essa sua decisão. Se tiver que morrer, morra como herói. Somente assim o forte poderá ser tomado.

 

34- A lamentação ou auto-piedade são inúteis. “Sou infeliz, sem valor, vil e fraco”, “não posso fazer nada por mim mesmo”, são afirmações dos fracos, dos imbecis, que nada fazem. Poderá fazer algo uma pessoa assim? Com firmeza, permaneça desperto e siga em frente; somente então chegará ao sucesso. Por acaso percorrerá você a estrada se, de início, sentar-se simplesmente a dizer: “ó que estrada comprida e difícil?” Jamais chegará ao fim. Levante-se, caminhe, prossiga e a estrada se tornará cada vez mais curta. Coragem, fortaleza, esperança e auxílio, tudo isso lhe chegará inesperadamente. O caminho se tornará cada vez mais fácil e reto e, em pouco tempo, você atingirá o objetivo. Ó! a alegria da realização!

 

35- Muitos estão sob a impressão de que se fossem iniciados por um Guru iluminado (siddha), todas suas infelicidades seriam extintas de maneira misteriosa somente pela graça do Guru - doenças incuráveis seriam sanadas; empregos conseguidos; haveria felicidade mundana e prosperidade; facilmente conseguiriam casamento adequado para seus filhos e a aprovação nos exames do colégio e da faculdade; seriam ganhos os processos jurídicos; prosperariam nos negócios; estariam livres das contrariedades familiares e escapariam das más influências dos astros como Saturno e assim por diante.

Não suplique tais coisas ao Guru. Saiba que não há conexão entre iniciação, entrada no caminho espiritual e assuntos triviais e mundanos. Solicitar tais favores ao Guru é infantilidade, não é sinal de espiritualidade. Ele não é Providência Onipotente, nenhum dispensador de dons terrenos, nenhum governante dos destinos das pessoas. Não é correto embaraçá-lo com tais pedidos inoportunos, que não tendem senão a tornar o discípulo mais um objeto de desprazer para o Guru do que um recipiente de favores e bênçãos. O relacionamento entre Guru e discípulo deve ser de natureza puramente espiritual, concernente a assuntos espirituais somente.

 

36- Serviços de adoração com o desejo do fruto é simplesmente como comprar nas lojas. A verdadeira espiritualidade não é obtida com este estado de espírito. E qualquer resultado conseguido assim será extremamente parco e evanescente. A adoração com o desejo do fruto não purifica a mente, não dá suprema devoção por Deus, nem salvação, nem paz duradoura, nem alegria. Sri Ramakrishna não podia aceitar nem mesmo tocar coisas a Ele oferecidas com desejos ou motivos sub-reptícios.

 

37- Para realizar Deus, nesta vida, você tem que fazer sadhana, práticas espirituais, com toda energia e habilidade, oferecer-Lhe tudo e, se for possível, um pouco mais. Como costumava dizer Sri Ramakrishna: “Tenha fé e devoção até mais que a medida total”. Significa que deve tornar-se como um vasilhame que transborde de fé e devoção. Quantos possuem essa medida abundantemente? Todavia, não há razão para desespero. Continue com a sadhana da melhor forma que puder. Mas tenha sempre a firme convicção de que por mais duramente que você possa lutar, nada é e jamais será o bastante quando o objetivo é a realização do Ser, pois, em última análise, este objetivo só pode ser atingido pela graça divina.

 

38- Mas a graça de Deus somente desce sobre aquele que se tenha esforçado ao máximo, que não se tenha poupado, que não se tenha abandonado à deriva e que tenha, finalmente, chegado a conhecer, após muitas lutas, que é impossível realizá-Lo somente pelo auto-esforço, sem a Sua graça. Quando o aspirante sente que está perdido numa tristeza impenetrável, a ponto de afogar-se num mar sem limites, com as forças totalmente exauridas pelos esforços em manter-se à tona, então, somente então, o Senhor o levanta por Suas mãos de lotus para levá-lo além do campo da vida e da morte, onde há felicidade imensa e paz permanente. A posse de uma partícula que seja dessa ventura faz o jiva, a alma individual, sentir-se feliz além de toda medida.

 

39- Como pode você temer tanto o mundo, como se ele fosse devorá-lo ?  Seja bravo e destemido. Seja herói e faça pouco do mundo e o mundo perderá a força que exerce sobre você. “Sou muito fraco”, “sou um decaído, cheio de erros e nada valho”, “nada pode ser realizado por mim”, “sou incapaz de fazer qualquer coisa”. Enquanto você não abandonar tais pensamentos negativos, jamais terá sucesso em obter qualquer coisa na vida. Varra essas idéias para bem longe de sua mente. Levante-se e diga como herói: “que coisa existe que eu não possa fazer? Sou filho da Imortalidade. A Imortalidade é meu direito por nascimento. Nada poderá despojar-me dela!”

 

40- Sempre que a fraqueza ou desatenção assaltarem-lhe a mente, repita essa afirmação: “Sou divino e nada mais. Eu sou BRAHMAN, o Absoluto. A infelicidade e a tristeza não podem tocar-me. Sou existência, conhecimento e beatitude. Sou eternamente livre por natureza. Ó minha mente, diga  OM TAT SAT OM”.

 

41- Lembre-se do Senhor e pense Nele o mais que puder. Saiba que apenas Ele é seu mais íntimo, mais querido e mais próximo. Aquele que é seu único refúgio e riqueza agora e sempre, só Ele deve ser amado com todo seu coração e toda sua alma. Pensa-se na bem-amada, julgando obter-se a felicidade e alegria por isso e ressente-se de outras conversações ou distrações que afastem a mente do desejo de estar sempre em companhia da bem-amada; todavia esse amor mundano, como tudo mais no mundo, termina com separação e morte. Mas não há fim para o amor de Deus. É um tesouro inesgotável. Quanto mais você bebe dele, mais sedento se sentirá e por fim perder-se-á em beatitude, esquecendo-se de si e absorvendo-se Nele. Então, a existência da pequena individualidade se desvanecerá à maneira de um cadáver e a divindade tomará seu lugar. A consciência divina (qualidade de SHIVA) iluminará a alma, a dança da morte cessará para sempre e você atingirá a imortalidade.

 

42- Você leu bastante e ouviu  muitos conselhos espirituais. Se não tentar segui-los de alguma forma na vida cotidiana, nenhum deles dará fruto; ninguém o tornará apto fazendo por você. Terá que fazê-lo você mesmo. Deus o auxiliará e lhe derramará Sua graça. Se você se dispuser a trabalhar com toda a sinceridade, o próprio Deus carregará seu fardo sobre os ombros e o conduzirá parte do caminho. Primeiro, auto-esforço; a seguir, a graça e, por fim, realização da realidade.

 

43- É extremamente difícil conseguir verdadeira espiritualidade, nem todos podem obtê-la. Deve-se ter alguma substância intrínseca, bons hábitos passados ou impressões inatas e tendências para o bem, retidão e sinceridade, um sentimento de necessidade interior. Até o Mestre (Sri Ramakrishna), tão amoroso e tão cheio de misericórdia, não olhava para aqueles que ele considerava como “alburno* molhado”, necessitando de muito sopro para servir de lenha. Em outras palavras, costumava dizer: “a realização neste nascimento não é para as pessoas de mente totalmente mundana”.

 

* Alburno, s.  m. (bot.) camada lenhosa que em certas plantas dicotiledôneas, se formou durante o ano precedente e que ainda não tem a consistência das camadas anteriormente formadas.

 

44- Deve-se evitar a prática de japa e meditação prolongados indevidamente através de um esforço abrupto que ocasione sensação de extremo cansaço ou exaustão.

 

45- Continue praticando japa e meditação com grande devoção, perseverança, paciência e, gradualmente, a mente se tornará tranqüila e a meditação profunda. E você sentirá prazer pela meditação. Um só dia que falhe, tudo se tornará insípido e você se sentirá deslocado e bastante inquieto, como o viciado a quem faltasse a droga na hora certa. Você anelará permanecer imerso na meditação, a sós.

 

46- BRAHMAN  e SHAKTI Purusha (puro espírito) e prakriti (natureza) são dois em um e um em dois. Em realidade, não são diferentes. A idéia de separação só dura enquanto nos atemos ao sentido de dualidade e à noção de adorador e Adorado.

 

47- É muito bom sonhar com o Guru, com o Ideal Escolhido e com deuses e deusas, pois isso encoraja e deleita a mente. Mas não se sinta infeliz ou deprimido se não tiver tais sonhos freqüentemente. Ao experimentá-los, não saia falando sobre eles com qualquer pessoa. Deve contá-los somente a seu Guru, se desejar. Entretanto, não quebre a cabeça para encontrar o significado de cada sonho. O sonho é simplesmente um sonho e é futilidade esperar integração e coerência através dele. Isto acontece somente no caso de adesha (condição divina), de comissão divina, de guiança ou de percepção intuitiva durante o estado de absorção na meditação ou na realização. A verdade não deixa dúvida e a posse dela transforma toda a vida do homem, tornando-o divino. Tal experiência não advém a qualquer pessoa. Depende de longa e austera sadhana (práticas espirituais) e da graça de Deus.

 

48- Alguns recebem o mantra em sonhos; mas em muitos casos não são os prescritos pelos Shastras e, sim, os nascidos da imaginação ou da inclinação da própria pessoa. Se, entretanto, fizer regularmente a prática de japa e meditação desses mantras com firmeza e grande fé, a realização poderá chegar no tempo devido.

 

49- Pratique sua meditação em lugar solitário, com pouca luz ou na escuridão. Use roupas largas e respire pelas narinas, mantendo a boca fechada. Tente dirigir os sentidos para dentro na hora da meditação. Feche os olhos e fixe mentalmente o seu olhar no coração, isto é, profundamente dentro de você mesmo. E pense que o Istha (Ideal Escolhido), em forma brilhante, reside aí.

 

50- Enquanto medita, esqueça-se da identificação com o corpo, ou seja, abandone a idéia de que você é esse corpo. Pense que você pertence à natureza da entidade sutil sobre a qual a consciência do ego (idéia de “eu e meu”) se sobrepõe. E pense no Ideal Escolhido (Ishta) como pertencendo à consciência incondicionada, sempre pura, sempre livre e auto-luminosa, destacada de todas as circunstâncias limitantes. Pense, enquanto medita, que Ele, enquanto Consciência Pura, está penetrando sua consciência limitada pelo ego; e que seu “eu”- consciência do ego - está contido Nele - a Consciência Pura. Na realidade, você é feito da mesma essência Dele, a única diferença está no grau de manifestação. Tudo isso requer prática espiritual para que haja verdadeira compreensão. Não dá para explicar com palavras. A alma individual (jiva) é o Ser com ligadura e SHIVA, o Puro Espírito, é o Ser sem ligaduras.

 

51- Ao sentar para meditar, controle o fluxo de seus pensamentos e ora: “ó Senhor, em última análise sou da mesma essência que Tu. Esta luta interior resulta de eu estar preso por Maya (ilusão) e ser tomado por um sentimento de “eu” e “meu” e de identificar-me com o corpo e ser escravo de pensamentos e desejos incorretos e más tendências. Assim, ó Senhor, afligem-me a doença, a tristeza, a infelicidade, a falsidade, o medo e a inquietude: Tornei-me mesquinho, insignificante e impuro, sujeito à morte e à tirania dos objetos mundanos. Estou sem forças, desprovido de recursos, fraco e sem valor. Sê Tu bondoso para comigo, ó Senhor; por Tua infinita misericórdia destrói todos os meus erros, faltas, necessidades, infelicidade, com raiz e ramos, para que eu possa despertar o poder infinito ainda adormecido e sem vida dentro de mim, para que eu possa realizar a Tua natureza sempre presente, para que eu possa realizar a minha verdadeira natureza - o Ser sempre luminoso, sempre livre, sempre puro e eterno.”

 

52- Para meditar no Ideal Escolhido é essencial que se tenha um pouco de imaginação e de visão. Ser duro como pedra e ater-se a uma atitude materialista prosaica não levarão a nada. Assim, a forma do Ishta deve ser imaginada sob uma forma benigna e visualizada no lótus do coração. Os seis círculos do Sistema de Yoga, os seis lótus ou plexos nervosos, não têm existência material no corpo humano e não podem ser vistos pelo olho físico; eles têm que ser imaginados e visualizados pelos iniciantes como fontes de grande poder adormecido no corpo humano. Hão que ser despertados pela prática de yoga.

Quanto mais profunda e direta a meditação, mais pura e concentrada se tornará a mente e mais cedo este poder adormecido despertará a Iluminação e terá sua culminância no samadhi superconsciente, o mais elevado estado de felicidade.

 

53- O pranayama deve ser praticado com os olhos fechados. Em vez de meditar na forma do Ideal Escolhido, dirija sua atenção aos exercícios de respiração. Mantenha o número escolhido no japa de seu mantra, contando-o nos dedos da mão esquerda, como de hábito. Esses processos devem ser aprendidos com o Guru. Enquanto inala, pense que está puxando para dentro de você; pureza, compaixão, força, coragem e outras virtudes divinas. E ao exalar, pense que está jogando para fora de você todas as imperfeições como os pensamentos maus de impureza, incerteza, inveja e dependência ao erro.

 

54- Se você for incapaz de meditar na forma de seu Ideal Escolhido, como morando dentro do lótus de seu coração, poderá meditar Nele sentado em lótus ou num trono à sua frente. O primeiro método, naturalmente, é o mais recomendável e o melhor, porque capacita a pessoa a aprender a ver Deus no recesso mais íntimo do coração ou do Ser. No outro método, Deus tem que ser imaginado como existindo fora e, gradualmente, por contínuo esforço, tente pensar em Deus e vê-Lo como existindo dentro. Quanto mais O ame, mais deseja você segurá-Lo e mantê-Lo perto no coração do coração. “Ó mente minha, que somente tu e eu possamos vê-Lo e ninguém mais”.

 

55- Se não for capaz de praticar japa e meditação sentado, na postura prescrita, por longo tempo pela manhã e à tardinha, poderá fazê-lo também em outra hora ou, sentando-se numa postura fácil e repousante; se estiver doente poderá praticar na cama nas primeiras horas da manhã, mas sem se sentir cansado ou sonolento. Usualmente a mente é trazida melhor sob controle se japa e meditação forem feitas confortavelmente num assento, de acordo com as instruções usuais. Você poderá também praticar, repetindo mentalmente o mantra, sem manter em conta o número de vezes, enquanto estiver caminhando ou viajando numa condução, ou mesmo, trabalhando, à guisa de lembrança ou recordação de Deus; mas não medite numa situação de perigo, pois se arriscará a um acidente se estiver desligado daquilo que o cerca. O tempo não pára, a vida é curta e incerta. Não perca um só minuto.

 

56- Os méritos e os deméritos se combinam para fazer um homem; todos têm ambos, o que varia é a quantidade, de um ou de outro. Em vez de buscar as falhas e omissões de outrem, olhe para as suas próprias. Esqueça as faltas alheias e exalte-lhes as qualidades boas. Seja como a abelha que é atraída pelas flores, e não como a mosca que só senta na sujeira e se satisfaz da podridão. A indulgência com você mesmo, a crítica ou comentários fúteis em relação a outrem são prejudiciais ao cultivo do Ser.

 

57- Somente uma Encarnação de Deus pode ser livre de faltas e imperfeições e dotada com todas as qualidades abençoadas. A conduta e o relacionamento até de um homem de realização, de um instrutor altamente avançado e reverenciado ou de um Guru totalmente qualificado, pode não ser inteiramente sem defeitos ou imperfeições; erros de julgamento, por falta de entendimento adequado de uma espécie ou de outra. Mas seus méritos excepcionais predominam de tal forma, que até seus defeitos e excentricidades freqüentemente servem como embelezamento de seu caráter e o torna mais amável. Além disso, deixando de lado esses personagens elevados, o sentimento de amor não vê defeito ou culpa nas pessoas amadas ou adoradas.

 

58- Não se pode progredir no mundo espiritual sem devoção sincera e fé no Guru. Jamais duvide das palavras do Guru; saiba que elas são tão sagradas como as palavras dos Vedas ou das Escrituras. Se você deseja a verdade, há que pedir implicitamente instruções a um Guru. Saiba que não há pessoa que mais lhe deseja o bem que o seu Guru, agora e sempre. Se você seguir firmemente o caminho que ele lhe indicou, estará lhe prestando verdadeiro serviço e isto muito lhe agradará.

 

59- Inicialmente japa deve ser praticado vagarosamente, pronunciando distinta e mentalmente o mantra. Isso leva tempo no começo. Poderá não ser possível, de início, repeti-lo duas ou três mil vezes por hora. Porém, com a prática , pode ser dito mais rapidamente. Então, no decorrer do tempo, poder-se-á repetir o mantra até umas oito ou dez mil vezes por hora. Tente durante o japa firmar a mente somente no mantra ou Ideal Escolhido indicado por ele.

 

60- O Guru não pode fazer com que você realize a verdade, a menos que tente por você mesmo. O Guru pode mostrar-lhe o caminho, pode remover-lhe as dúvidas e dificuldades, corrigir-lhe os erros, pode preveni-lo de se extraviar, pode colocá-lo de novo no caminho certo, pode até conduzi-lo pela mão à grande distância, mas a caminhada terá que ser feita por você. Ele não pode carregá-lo nos ombros até a meta. O caminho é longo e difícil, sem dúvida, mas não há que sentar no meio dele, achando-o além de sua capacidade de prosseguir e cair, abandonando-o desalentado. Você não pode permanecer parado, ou irá para a frente ou andará para trás. Se recuar, talvez perca o que alcançou; quanto mais você prosseguir no caminho, mais fácil ele se tornará. Avante! A coragem e a fortaleza chegarão e você percorrerá todo o caminho que o levará à ananda.

 

61- Nenhum auxílio será de qualquer valia se não houver algo de substancial dentro da pessoa. De que serve regar e arar o chão se as sementes foram semeadas em solo pedregoso e estéril? Assim como o solo, por pior que seja, pode ser melhorado por vários métodos a fim de dar boas colheitas, assim também as pessoas de mente mundana poderão atingir o supremo objetivo, se seguirem as instruções do Guru com fé simples, firmeza e perseverança; então, a vida se tornará doce e plena de felicidade.

 

62- Prossiga sem parar! Não olhe para isto ou aquilo. Não dê a mínima atenção aos fenômenos psíquicos tais como ver luzes ou fantasmas, etc. À medida que você for praticando a meditação, várias experiências ocultas surgirão por si mesmas e poderá ver toda espécie de coisas sobrenaturais e usufruir até alguma alegria delas; mas não se lhes apegue, pois neste caso, jamais poderá progredir muito. Mantenha sempre sua atenção fixa no Ideal e deixe que o único desejo e objetivo sejam o de aumentar a devoção e o amor a Deus, o de fundir sua mente Nele e o de ganhar a direta realização Dele nesta vida.

 

63- O apego aos siddhis e bibhutis (poderes ocultos e prazeres do estômago) leva os homens à servidão de Maya (ilusão) através da tentação do gozo que os afastará para longe do Ideal. O desejo por tais poderes não somente é um grande obstáculo à realização de Deus como também rebaixa e arruina gradativamente uma pessoa. Poderes ocultos não fazem seguir o amor a Deus e nem levam à salvação, o mais que fazem é trazer nome, fama e gozo pelos objetos desejados neste mundo; e para satisfazer esses desejos, frequentemente inconvenientes, nem mesmo às vezes se evita arruinar à outrem. Daí resulta que os verdadeiros bhaktas fogem desses poderes como se fossem veneno.

 

64- Nossas orações são freqüentemente pronunciadas de maneira vazia. Não oramos com o coração; eis porque as orações não dão fruto. Elas seguramente se efetivarão se vierem diretamente do coração. Quando você sentir que não está obtendo qualquer resultado da prática de japa e meditação, busque dentro de você mesmo e descubra os defeitos - as rachaduras e os buracos pelos quais toda a água da vasilha está vazando e tente consertá-la. Japa e meditação não podem transformar a personalidade se a pessoa permanece ligada fortemente aos objetos dos sentidos, à preguiça, à luxúria e ao ouro; mas nem por isso abandone a prática regular de japa e meditação. Você, com certeza, obterá os resultados desejados com o tempo. Os prazeres mundanos gradativamente lhe parecerão insubstanciais e insípidos. O amor e a devoção a Deus aumentarão e você encontrará somente alegria Nele.

 

65- Nosso desejo de liberação (mukti) é puro fingimento, não é real e sincero. Se Deus nos aparecesse agora e nos dissesse: “olhem, estou lhes concedendo liberação, tomem-na!”, nós seríamos tomados de medo e confusos gritaríamos: “não, não desejo mukti agora. Que aconteceria aos meus familiares queridos que de mim dependem se eu tivesse liberação agora? Dá-me mukti depois da morte!” Isso me faz recordar uma estória muito antiga de um velho lenhador. Cansado de carregar tanto peso, ele orava a Yama, o Deus da morte: “ó Senhor! Eu não agüento mais! Libera-me !” Quando o Senhor Yama chegou e quis levá-lo, ele disse: “não, não Senhor! Chamei-o para ajudar-me a levar esta carga de madeira que tenho na cabeça. “Assim também é a luta dos seres humanos que estão presos, de pés e mãos atados ao mundo; só desejam escapar de sua infelicidade, não querem verdadeiramente mukti.

 

66- O que você deseja em pensamento, certamente obterá. Se realmente quiser a Deus, sem dúvida O encontrará. Se orar a Ele por gozos materiais, você os terá, mas para ambos, você tem que trabalhar. Nada poderá ser conseguido sem dura luta e trabalho. Que dureza incrível sofrem as pessoas para conseguir objetivos mundanos! Lutam denodadamente, dia e noite, de corpo, mente e alma, passando até fome e insônia por esposa e filhos, posses, nome e fama; não têm descanso nem por um momento, não sabem como fugir; todavia não obtêm tudo o que querem, pois não há fim para suas esperanças e desejos. Se você puder lutar por Deus assim, certamente O realizará. Rejeitando o ouro e as jóias, você se satisfará com pouco e os vários golpes recebidos não envolverão, todavia, seus sentidos; assim é a ilusão de Mahamaya (Mãe da Ilusão Cósmica). A realização de Deus é difícil, mas pode-se torná-la fácil dando-se nova direção à tendência da mente, dirigindo-a totalmente para esse intento. No entanto, só poderá fazê-lo aquele para quem a graça da Mãe Divina desceu.

 

67- É certamente verdadeiro que o objetivo desejado não pode ser conseguido sem árduo trabalho. Somente as crianças o logram sem luta, pois sabem que a mãe lhes atende todas as necessidades; elas não conhecem senão a mãe. A mãe lhes dá tudo de que carecem e no momento preciso, elas não têm que pensar nisso por si mesmas. Devemos tornar-nos exatamente como crianças, na vida espiritual. Quando a criança está faminta, grita e, imediatamente, a mãe deixa de lado os afazeres, vem, segura-la no colo e amamenta-la. Veja você: - até os bebês têm que gritar para tornarem conhecidas as suas necessidades; da mesma forma, o devoto tem também que chamar a Deus, sentir devidamente a sua separação Dele e, com lágrimas, orar sinceramente pelo amor de Deus. O devoto mal olha, nem se prende a qualquer coisa que lhe dêem; nem mesmo os poderes divinos, nem a aventura e o esplendor do céu, a riqueza e o bem estar lhe despertam qualquer atração; somente deseja a Deus.

Cantou Sri Ram Prasad, o poeta e devoto de Bengala: “ó Mãe, de que me serve toda esta riqueza? Quem está querendo Teus bens? Qualquer tesouro que me deres, deixarei sem cuidados em um canto do quarto, mas se me deres os Teus - Pés de Lótus - que me fazem afugentar o medo, eu os guardarei no assento de lótus do meu coração”.

 

68- O essencial é trazer a mente sob controle. Se não pode fazê-lo, nada lhe será útil, conforme diz o ditado: - mesmo obtida a graça dos três - Guru, (o Senhor) e vaishnava (o devoto), mas se falta ao jiva (alma individual) mais uma graça - a graça da mente - tudo se tornará pó e cinzas. Se a mente for conquistada, o mundo poderá ser conquistado. Toda prática espiritual, toda disciplina são somente para a conquista da mente.

Sri Ramakrishna costumava cantar uma canção e um dos versos dizia: “o mantwari (mantra) que conheço te passei: este é o mantra pelo qual salvo a mim e aos outros em perigo.” Agora, mantwari (em bengali) significa a sua mente. Ramakrishna, aqui, joga com as palavras: “se você tem o mantwari (mantra), mantwari o salva; mas, agora, o principal é o mantwari (controle da mente).

 

69- Um Guru dá somente o mantra conforme lhe foi passado pela linhagem dos Santos Gurus e com a sua repetição, os Yogues e Rishis (videntes) atingem a perfeição. Eles não passam ao discípulo nenhum artifício de sua imaginação. Jamais se deve perder a fé no mantra ou tê-lo como coisa trivial. Se a longa e metódica prática de japa (repetição contínua do mantra) não tornar a mente purificada e dirigida para um só ponto, saiba que a culpa não é do mantra, mas a razão está em suas próprias falhas. Se você não tentar corrigir-se, de que servirá o simples murmúrio da prática de japa ou mudar de Guru, tornando-se discípulo de outro? Deve-se fazer japa tanto com a mente como com a língua ao mesmo tempo.

 

70- Saiba que o mantra é fonte de grande poder e a própria essência do Ideal Escolhido. Deve segurar-se o denso para chegar ao sutil e, através do sutil, atingir-se o Super-Sutil que está além do alcance da mente e da fala.

 

71- O grande segredo da meditação é transformar a consciência do ego na Suprema Consciência, que é a verdadeira natureza da alma espiritual. O processo é colocar o Ser Supremo ou Deus Pessoal (BRAHMAN com qualidades) profundamente no coração, o lugar mais íntimo do ser individual e tentar repetidamente libertar a mente de todas as ligaduras aos objetos dos sentidos pelas orações, pela discriminação entre o bem e o mal e pela repetição do mantra; assim, a mente se tornará cada vez mais absorvida. E, quando esta atitude amadurece em seu total desenvolvimento, para que flua como uma corrente ininterrupta de azeite, somente então a mente se fundirá verdadeiramente na forma luminosa e venturosa da idéia do Ideal Escolhido, que é puro amor, pura existência e pura beatitude - o Absoluto BRAHMAN. Esse estado é chamado bhava, o abençoado êxtase espiritual ou samadhi, o estado superconsciente de unidade com a divindade.

 

72- Com o hábito de praticar japa e meditação firmemente todos os dias, desenvolve-se uma espécie de anseio no curso do tempo obtém-se um sentimento de intoxicação, por assim dizer, que dura por mais algum tempo e nos sentimos exaltados. Não devemos participar de conversações mundanas logo depois da meditação. Não há desejo de conversa nesse momento. Podemos nos sentir perturbados e sofrer ao fazê-lo. Tentemos fazer com que esse estado dure o maior tempo possível.

 

73- Assim como os bêbados ou viciados em drogas se sentem intensamente infelizes e deslocados quando não conseguem a bebida ou a droga no tempo devido, assim também procedem os aspirantes (sadhakas) no dia em que, por alguma razão, deixam de praticar o japa e a meditação habituais. E assim acontece aproximadamente com tudo, desde que um hábito particular seja formado, seja ele bom ou mau.

 

74- Haverá alguma esperança de salvação para nós, pessoas mundanas? Por que não? Certamente que há toda a esperança. Deus seria somente para os renunciantes (sannyasins) ?

Todos são seus filhos. Quem poderá viver inteiramente fora do mundo? Até nós, os sannyasins, temos que pensar no bem dos outros. Sentimo-nos preocupados em ouvir seus problemas e desditas; temos que pensar no bem-estar dos sannyasins dos mosteiros de nossa Organização espalhados pelo mundo inteiro; temos que pensar no crescimento e expansão do trabalho do Mestre, na disseminação de suas idéias e ideais; por fim, estamos profundamente afligidos pelos relatos de tristezas de cortar o coração e sofrimentos de nossos doentes, desabrigados, famintos e carentes, vítimas da fome, enchentes e epidemias, fatos que nos levam a pensar nas formas de mitigar tudo isso. Mas há um mundo de diferença entre pensar em si mesmo e pensar nos outros; um pertence a Maya ou avidya (ignorância), o outro é vidya (conhecimento). Não há mal em permanecer no mundo, mas que não sejamos do mundo, que isso não seja tudo em nossa vida; permaneçamos no mundo e executemos deveres e obrigações, mantenhamos sempre a idéia de renúncia, de não ser o agente: - “não sou Aquele que faz” e de desapego sempre presente dentro de nós.

 

75- Saiba que o mundo é um grande sonho. Em qualquer conjuntura, continue cumprindo seu dever, com a consciência de que o mundo é relativamente verdadeiro para propósitos práticos, mas ao mesmo tempo, aferre-se firmemente à convicção de que somente Deus é a única e eterna realidade e que não haverá felicidade e paz eternas e liberação final (mukti) até que Ele seja realizado. Apesar do privilégio de nascimento humano e da oportunidade de atingir o verdadeiro conhecimento, a vida e tudo o mais lhe serão vãos se você não tentar a realização de Deus.

 

76- A renúncia externa  não será de muita conseqüência  enquanto  o mundo lhe encher a mente e existirem o apego e anseio pelos objetos dos sentidos. Onde quer que você vá, enunciando meramente o externo ou indo para a floresta ou para as cavernas nas montanhas, o mundo o seguirá ali também, enganando-o ou tentando-o sob múltiplos aspectos e preparando-lhe novas amarras. Chefe de família ou sannyasin, quem quer que você seja, se não tiver voltado o olhar para o Ishta e se firmado Nele, a queda será inevitável e ninguém poderá salvá-lo.

 

77- Esteja sempre alerta. Jamais creia na sua mente sequer um momento. Por mais elevado o estado espiritual alcançado, não fique confiante demais por ter conquistado os sentidos, pois a queda é ainda possível. De maneira sutil, o mal pode disfarçar-se e tentá-lo, assumindo às vezes a forma de virtude, outras, a de compaixão e mais adiante, a forma de amizade, para trazê-lo sob seu poder. Na longa caminhada poderá verificar que sem perceber, você se perdeu e no momento que souber, talvez lhe seja impossível voltar atrás.

 

78- Em regra,  é preferível casar-se,  ser chefe de família,  pois esse  é um dos quatro ashramas ou estágios preparatórios da vida, um dos caminhos do auto-aperfeiçoamento. Mas se um brahmachary - iniciado que tomou voto de continência - ou um sannyasin ordenado forem escravizados pelo ouro ou pela luxúria, terão cometido grande falta e perderão tanto esse mundo como o próximo. Aqueles que renunciaram ao mundo como também as viúvas devem manter o voto de continência por toda a vida e jamais violá-lo conscientemente. Os que forem incapazes de fazê-lo, não devem hesitar em casar, tanto para o próprio bem como para o bem dos outros, pois isso é permitido pelas Escrituras. “É melhor casar que fornicar”- diz São Paulo na Bíblia.

 

79- É de grande necessidade para toda a gente,  homens e mulheres,  dedicarem-se a vários ramos do conhecimento técnico e profissional que lhes permitam levar uma vida independente. Viver às expensas de outrem é um estado infeliz e torna a vida insuportável. E o que dizer, em tais circunstâncias, de se devotar às artes religiosas ou à vida espiritual, por mais honestamente que se deseje?

 

80- A prática de repetir o mantra dado pelo Guru, feita de todo coração e o esforço ardente para seguir-lhe as instruções em todos os detalhes da vida é a única remuneração do Guru e o melhor meio de obter dele a bênção, o afeto e atingir a perfeição espiritual.

 

81- Assim como o pai deseja ser ultrapassado pelo filho, assim também o Guru deseja ser ultrapassado pelo discípulo. O pai deseja que o filho seja maior do que ele e o Guru deseja o mesmo de seu discípulo.

 

82- Deus mesmo é o Supremo Guru,  o Guru dos Gurus. Ele é o Criador. O homem-Guru é simplesmente Seu instrumento, o veículo pelo qual Seu poder é transmitido ao discípulo.

 

83- O Guru  qualificado  transmite ao discípulo,  através da Iniciação pelo mantra,  a mais profunda verdade secreta que ele próprio realizou por suas práticas espirituais. Não tente avaliá-lo ou julgá-lo pelas regras da razão prática, pois agiria como o mercador de verduras ao apreçar os diamantes por nove medidas de beringelas. Não vê que não são assuntos para disputas ou discussões e sim, verdades sutis e misteriosas, não apreendidas pelo intelecto? Somente poderão ser compreendidas se, com continuidade, fizer as práticas espirituais com fé firme nas instruções do Guru. Então, véu após véu serão levantados e a luz da vitória certamente brilhará em toda sua glória.

 

84- Pratique japa e meditação todos os dias; se falhar, pergunte a si mesmo: Será falta de tempo ou de ânimo? Você consegue encontrar tempo para toda espécie de trabalho, por mais trivial que seja e todavia não tem tempo de praticar japa e meditação pelo menos uma hora. Assim como é necessária a água para mitigar a sede e o alimento para satisfazer a fome, assim como a respiração é necessária à vida, japa, meditação, oração e práticas espirituais são tão necessárias, mais que nunca, para a realização da mais elevada verdade. Deve-se criar um sentimento de anelo por Deus. Ele advirá paulatinamente através das práticas diárias e a força será acumulada por esse processo.

 

85- Há muitos que dizem ao Guru, após a Iniciação: - “não estávamos aptos para praticar, mas agora estamos livres, colocando toda responsabilidade sobre teus ombros”. Isto é apenas uma evasiva para fugir à própria responsabilidade e para não querer fazer algo. Por acaso a espiritualidade é fácil de ser conquistada? Ela custa barato? Assim como é a concepção de uma idéia é a realização da mesma. A realização é medida pela profundidade e pela intensidade do pensamento e da ação. Pode ser deixada ao Guru toda a responsabilidade pelo simples ato de sua transmissão verbal? Devemos nos entregar completamente, sacrificando o ego e isto é conseguido por longa prática. Corremos dia e noite, trabalhando sem cessar, passando sem alimento e sem dormir para ganhar algumas moedas. Mas, quando se trata de obter conhecimento espiritual e devoção, dizemos: - “não podemos fazer nada”. Quão absurdo é isto realmente! A verdade não poderá ser realizada se não nos devotarmos de todo o coração à prática espiritual com a maior habilidade, dia após dia, mês após mês, ano após ano. Não há outro caminho, não há outra maneira para chegar à liberação final (mukti).

 

86- Ninguém pode tomar sobre si a carga dos pecados alheios, nem mesmo o Guru. Grande erro é supor que o Guru tenha tomado sobre si toda a carga do discípulo ao iniciá-lo. Somente as Encarnações Divinas o fazem porque são na verdade um oceano incomensurável de misericórdia. Elas vêm especialmente com o propósito de liberar os que erram e os aflitos. Nenhum pecado toca a Deus; todavia, pelo fato Dele assumir a forma humana, os pecados daqueles que tomam refúgio Nele atacam-No na forma de doenças e Lhe causam sofrimento. Um pecado cometido pode ser expiado somente por um sentimento pungente de arrependimento interior e pela prática de uma vida santificada, após abandonar todas as ações pecaminosas. Somente o fogo do auto-conhecimento pode queimar totalmente as tendências ao pecado.

 

87- Considera-se a religião como algo  cuja prática  não necessita  de nenhum treino  ou esforço, como se fosse uma propriedade encontrada no caminho, não reclamada e facilmente possuída. Todos se adiantam a opinar sobre religião ou a ensiná-la; consideram-se adeptos, sabem tudo sem ter estudado as Escrituras e passado pelas práticas espirituais de qualquer espécie. Para dominar qualquer conhecimento preliminar, deve-se estudar por muitos anos sob a orientação de um instrutor proficiente. A idéia de que o conhecimento espiritual possa ser adquirido e as verdades mais sutis da religião possam ser compreendidas na vida, sem árduo treinamento ou disciplina é simplesmente ridícula.

 

88- Muitos se queixam, logo após a Iniciação: “- por que não se pode meditar adequadamente estando a mente intranqüila? Por favor, faça algo para aquietar minha mente”. Será fácil ter-se a mente calma ou a faculdade de mergulhar profundamente em meditação? A mente tem a tendência de se dirigir para fora, sob a influência dos samskaras (hábitos, tendências e impressões) e do apego aos objetos dos sentidos acumulados nas vidas passadas. Consequentemente, ela sempre busca possuir e conservar coisas. Não há atalho para tornar a mente quieta a não ser por repetidos esforços e pela renúncia. Deve ser praticado japa e meditação com paciência e perseverança, dia após dia, mês após mês, ano após ano, de acordo com o método prescrito pelo Guru e, ao mesmo tempo, desenvolver o desapego aos objetos mundanos. Quanto mais diminui o anseio pelos objetos mundanos, mais cresce a devoção pelo Ideal Escolhido. Quanto mais se realize Deus como o mais próximo e mais querido dos mais próximos e queridos, automaticamente a mente se tornará cada vez mais tranqüila. Então a meditação se aprofundará também e haverá alegria e paz. Em vez de estar ansioso por rápido resultado, você deve permanecer firme nas práticas, como o camponês descrito por Sri Ramakrishna, que continuava arando o solo ainda que lhe tivessem falhado as colheitas durante alguns anos.

 

89- Ao visitar um templo de Deus ou um sannyasin, não vá sem uma oferenda. Leve algumas frutas ou doces ou, no mínimo, algumas flores.

 

90- Não dê lugar a tristeza nem se lamente continuamente, rememorando as atribulações, opressões, relações estremecidas, mal entendidos, querelas e outras tantas inquietações mentais inevitáveis na vida humana. Não vale a pena; ao contrário, quanto mais ponderar sobre elas e discuti-las com outrem, maiores proporções assumirão e aumentarão dez vezes mais, fazendo você perder a paz mental e tornando sua vida insuportável. Há que enfrentar as dificuldades da melhor forma que puder. Palavras dão nascimento a mais palavras. Se lhe disserem algo desagradável ou injusto é melhor ignorar e manter-se quieto. O surdo-mudo não tem inimigos. O Mestre costumava dizer: “- aquele que suporta a adversidade consegue superá-la; mas aquele que não a suporta é destruído por ela”. Palavras gentis, procedimento suave, capacidade de tolerância, serviço e amor, tudo isso com o tempo triunfará sobre as agruras da vida. Até mesmo os animais ferozes se tornam submissos com o tratamento bondoso. Examine-se e faça uma firme resolução em sua mente de consertar seus defeitos, mesmo falhando de vez em quando. Entregue aos pés de Deus os aborrecimentos, chore o ore a Ele do fundo do coração para que lhe tire as faltas; devemos corrigir-nos a nós mesmos. Não tenha nenhum sentimento negativo em relação a ninguém. O mundo é bom para quem é bom. Se não puder fazê-lo, a culpa será somente sua e terá que sofrer as conseqüências.

 

91- Apego ou sentimento de posse com relação aos objetos ou aos indivíduos é a causa-raiz de toda a perdição no mundo. O jnani ou homem de conhecimento não ama ninguém pessoalmente, nem deseja que o amem ou se liguem a ele pessoalmente. Por ser pessoalmente livre, não deseja ninguém em servidão, através de laços pessoais consigo, porque vê seu próprio Ser, Deus, em tudo. Seu prema (amor universal), é o mesmo para todos os seres. Não há toque sensual ou físico em seu prema, nem traços de luxúria, nem atração pela beleza física. O jnani é verdadeiramente o real amante. E o verdadeiro amante de Deus é um jnani.

 

92- Renúncia, amor e pureza são os meios para realizar a Deus; estão interligados como os membros ao corpo. Se um está presente, os outros também estão ali. Deus, cuja natureza é amor e pureza, não pode ser realizado senão pela aversão aos objetos mundanos, com o amor a todos os seres e o sentimento de que eles fazem parte de nós, isto, com pureza externa e interna (de corpo, mente e fala). Se lutarmos constantemente, com diligência, para manter intenso e ininterrupto o fluxo interior de pensamentos puros, todos os de tendência má fugirão. O caráter será de tal maneira transformado que as ações e pensamentos malévolos, sentimentos maliciosos e inveja lhe serão impossíveis. Um homem assim irradia tal poder que fará com que todos os maus se transformem em boas criaturas. A seu toque, o pior se tornará religioso e liberado e mesmo o ateu se converterá num devoto de Deus e os atormentados pelas aflições mundanas encontrarão paz duradoura.

 

93- Assim como o erro e, o veneno no sangue - não podem  ser mantidos velados,  assim também o amor e a pureza - não podem ser mantidos escondidos. Pode o fogo ser coberto por um pano? Para a pessoa que nada tenha de seu e não faça nenhuma distinção entre amigo e inimigo e que não se exponha ao olhar público, o mundo inteiro se torna iluminado pela luz de seu conhecimento e é inundado pela maré alta de seu divino amor. Abençoado é aquele que toma refúgio aos pés de tal conhecedor de BRAHMAN, recebendo-Lhe a graça.

 

94- A juventude  é a melhor época para a prática da espiritualidade.  Se naquela época o jovem puder acumular poder espiritual suficiente através de um extremado esforço, ele poderá passar o resto de sua vida em relativa segurança quanto ao temor de um deslize, além de gozar contentamento e paz. Não importa quais sejam as dificuldades que possam advir, devemos permanecer inabaláveis. A menos que construamos nosso caráter na juventude, jamais será possível fazê-lo depois; não percamos um momento sequer em atividades infrutíferas e não nos deixemos envolver pela preguiça. Pensamentos como: “minha saúde não está boa” ou “não encontro tempo” são evasivas sem sentido. Se as refeições, a recreação, o sono e todas as outras atividades do dia-a-dia são controladas e reguladas, o corpo e a mente se manterão vigorosos, bem dispostos e com isso poderão render muito mais. Além disso, a qualidade do trabalho também será melhor e descobrir-se-á que há tempo suficiente para a prática espiritual ou qualquer outra atividade.

 

95- Comer indiscriminadamente não o fará sentir-se alegre de mente ou forte de corpo. O que quer que se obtenha numa existência inquieta, desordenada, condescendente à luxúria ou as outras paixões, faz desgastar sem razão muita energia do corpo e da mente. E o corpo, por fim, se abaterá e se tornará incapaz até de esforço físico. Após deglutir gulodices de toda espécie, praticamente metade da energia do corpo será gasta em digeri-las, e oito ou dez horas de sono não compensarão. Se a energia for consumida em buscas vãs e conversações inúteis, pouco ou nada, consequentemente, sobrará para a prática da meditação e japa; nem mesmo haverá disposição para fazê-las. Ao sentar-se para as práticas espirituais, começará a bocejar e a cochilar. Se tal acontecer, que trabalho grandioso poderá ser realizado dessa maneira? Deixando de lado as práticas espirituais e as boas ações, torna-se impossível mesmo alguém assim, ter um sentido prático na vida. Que pena se desperdiçar assim uma vida tão rara como a humana! Se até as virtudes que mantêm a promessa da divindade não podem ser alcançadas nesta vida, qual será, então, a diferença entre esta e a de um animal?

 

96- Um iniciante na vida espiritual deve estar sempre alerta para que sua mente  ainda imatura não o leve impensadamente à servidão pelo apego às pessoas e às coisas. E deve ser lembrado de que o estágio de um principiante não significa somente um breve período no qual os exercícios espirituais apenas começaram. Na verdade, dez ou doze anos de japa e meditação não tornam o aspirante possuidor de um grau mais elevado de espiritualidade. O primeiro estágio poderá perdurar por muitos anos ou a vida toda, até que algo seja diretamente realizado; durará de acordo com o maior ou menor anseio e esforço de cada indivíduo. A percepção da verdade é o começo da verdadeira religião ou espiritualidade. Quaisquer rituais religiosos, cerimônias, austeridades e disciplinas executadas antes disso, serão simples preparativos e auxílio para a entrada no reino do Espírito.

 

97- Vemos com os que começaram as práticas espirituais de japa e meditação que,  quanto mais tentam se concentrar no Ishta, mais a mente se rebela veementemente, fugindo após toda espécie de absurdas irreverências. A pessoa então imagina: - “por que eu não tinha tantos problemas antes? Já me estava habituando razoavelmente às ocupações com a mente firme; por que não consigo agora?” A razão é que a mente, anteriormente, costumava estar comprometida com coisas externas, atraída para os objetos dos sentidos por sua própria natureza, portanto, não havia conflito. Mas logo que uma tentativa é feita para controlá-la a fim de afastá-la dos objetos insubstanciais externos e fazê-la olhar para dentro, pela discriminação entre o real e o irreal, ela se rebela. A força de um rio aumenta muitas vezes mais, se uma tentativa for feita para represá-lo. E se esta força poderosa com o tremendo poder que é gerado for voltada para um propósito desejável e útil, um resultado muitas vezes maior será obtido.

 

98- O sucesso em qualquer assunto é conseguido por diligentes esforços. Se falhar, - tente várias vezes. Se não obtiver sucesso, mesmo após repetidos esforços, saiba que não colocou à mostra o necessário esforço. Será fácil atingi-lo se tentar realmente um pouco mais e não desistir. O hábito será formado e se tornará parte de sua própria natureza.

 

99- Deus realmente não nos deixou faltar coisa alguma. A falta está apenas na mente; felicidade e infelicidade estão na mente e não do lado de fora. Tais sejam suas concepções, tais serão suas ações - colhemos o que semeamos.

 

100- Liberdade é a extrema felicidade.  Dependência é a extrema infelicidade. Mas a dependência a Deus é a verdadeira liberdade. O servo de Deus é o senhor da Criação. Ninguém se torna um servo de Deus a menos que abandone as seis paixões: luxúria, cólera, cobiça, vaidade, orgulho e inveja.

 

101- A prisão do homem assim como sua salvação  estão em suas próprias mãos. Todavia, mesmo estando cientes e sendo prevenidos, nos prendemos em amarras criadas por nossas tolices e enganos e sofremos terrivelmente. A luta da alma ligada ao mundo é como a de um homem que, abraçado a um poste, com um punhado de arroz cozido nas mãos, tenta em vão comê-lo. Ele não pode comer o arroz nem soltar as mãos, pois se precipitará ao chão.

 

102- O tantra diz : - “Aquele que considera seu Guru como um mero ser humano, que toma o mantra sagrado de  seu Ideal Escolhido como simples palavras ou considera as imagens dos deuses e deusas como simples pedaços de pedra ou argila vai para o inferno. Isto significa que pela falta de fé e devoção, a pessoa mantém tais noções materialistas pervertidas contrárias às Escrituras e assim, como foi dito acima, ela não somente bloqueia o caminho de seu progresso espiritual, mas também atrai a própria ruína.

 

103- Aqueles que sempre se lembram de Deus e pensam Nele, repetindo Seu nome no trabalho e demais atividades e sabem que Ele é seu único recurso e refúgio, jamais O perdem quando em perigo ou calamidade. Mesmo no último momento, os pensamentos em Deus farão as pessoas se esquecerem das dores da morte, afastar-lhes-ão o apego ao mundo, aos homens e ao dinheiro; suas mentes permanecerão fixas em Deus, gozando de Sua presença. Essa consumação chega somente àqueles que jamais virão a morrer e a renascer neste mundo. As repetidas práticas da recordação de Deus e do sentido de Sua presença se tornarão parte de sua própria natureza.

 

104- Quanto mais fortalecer a convicção de que o nome sagrado pelo qual você chama seu Ishta e a pessoa Dele são uma só coisa, mais Lhe sentirá a presença no coração.

 

105- Diz-se que o mundo é aquele lugar onde nada é de ninguém e onde ninguém jamais pertence a ninguém, tão efêmera é nossa existência mundana!

 

106- Aquele que é amigo de si mesmo  é um amigo do mundo e o mundo inteiro é também seu amigo. O “eu” é seu inimigo e o “Eu” é seu amigo- disse KRISHNA no Guita. Isso quer dizer: “A mente pura é a causa de sua libertação e a mente impura é a causa de sua servidão.”

 

107- Neste mundo  sempre em evanescente mutação,  a união coexiste com a separação; a prosperidade, com a adversidade; a fortuna, com o infortúnio; o gozo, com o sofrimento; a saúde, com a doença; a posse, com a carência. Cada um segue o outro como a própria sombra. Sabendo disso e experimentando-o, por que os homens ainda ficam emaranhados em tal mundo e se sentem atraídos por essa felicidade fugidia? O imediatismo do prazer no gozo dos objetos dos sentidos é o que satisfaz o homem; até uma pequena porção de prazer insignificante faz com que se esqueça as dores das misérias sofridas um milhão de vezes!

 

108- Ninguém pode escapar das garras da infelicidade simplesmente em pensar sobre o resultado final que sua ação pode acarretar. Quem pode remover a infelicidade daquele que deixa de aprender mesmo nas reincidências da experiência? Quem pode despertar aquele que finge dormir? O verdadeiro gozo da vida humana é alcançado quando se dá os passos necessários no sentido de evitar o retorno a esse mundo de eterno sofrimento, tendo que nascer repetidas vezes.

 

109- Nenhum trabalho pode ser feito nem nada pode ser bem sucedido se nos sentarmos preguiçosamente à espera de que o destino ou a boa sorte nos chegue. Além disso, essa atitude não só torna o homem frágil e tamásico como também o degrada. O homem comete muitos erros, paga por suas faltas e culpa inteiramente o destino ou sua má estrela; tropeça ou escorrega por descuido, mas culpa o chão. Toda realização depende usualmente do esforço próprio de cada um. Se o chamado destino for sentido como obstáculo à finalidade da vida, ele deve ser vencido, ativando-se pelo auto-esforço a energia que jaz adormecida dentro de cada um. Somente então você será um homem. Se o fizer, verificará, sim, que o destino também lhe será favorável. Se todo o poder fosse somente do destino não haveria como falar do bem e do mal, da virtude e do vício, ou do poder do Espírito. Os homens não são como o gado ou a pedra, para os quais o destino faz tudo; não seria eu responsável por meus atos e, inadvertidamente não seria levado por eles. Se esta fosse a atitude mental, jamais poderia alguém levantar-se e conseguir a salvação. Lembre-se: “- nada é tão degradante para o homem como se julgar fraco e à mercê de poderes incógnitos”. Isso o empurrará cada vez mais para baixo no lodaçal.

 

110- Somente aquele que teve sucesso  em fundir sua vontade à vontade de Deus tem o direito de dizer: “sou sempre levado a fazer tudo isso irresistivelmente; sou a máquina e Ele é o Operador”. Isso só acontecerá ao devoto da mais elevada categoria, que não saiba senão ver a Deus; nem um só passo dará em falso, nem mesmo sem querer; mal algum poderá jamais ser executado por ele. Com o coração cheio de irreprimível fortaleza e inspiração, jamais será assaltado pela depressão ou desespero, nem será movido pela felicidade ou infelicidade; ele tem sempre o pensamento de “eu não, eu não, mas Tu, só Tu, meu Senhor”. O ganho ou a perda, a vitória ou a derrota, a honra ou a desonra, tudo se tornou a mesma coisa para ele.

 

111- Quando algum trabalho for feito, esteja cheio de disposição, dedique-se a ele de todo o coração e espírito. Não dê a mínima atenção aos obstáculos e dificuldades que apareçam, por mais insuperáveis que se lhe afigurem. Verificará, então, que esses mesmos obstáculos e dificuldades o auxiliarão, na verdade, de uma maneira ou de outra. Será sempre possível uma atmosfera favorável ao coração! A pessoa que pensa em devotar-se à adoração de Deus com a mente descuidada, após ter cumprido satisfatoriamente todos os deveres familiares, não passa de um tolo, tal como aquele que vai banhar-se no mar, mas fica apavorado com as terríveis ondas. Pensa você que ele entrará na água se as ondas diminuírem um pouco e o mar se acalmar? Isso jamais ocorrerá. Mesmo que permaneça sentado na praia até o último dia de vida, haverá sempre ondas no mar. Deve-se ousadamente enfrentá-lo, banhar-se lutando com as ondas e atravessá-las. Da mesma forma, neste mar mundano, deve-se chamar por Deus nas práticas espirituais e adorá-Lo, lutando todo o tempo com as ondas. Mas, a esperança de realização jamais será preenchida se você se sentar abraçado aos joelhos em desespero e ficar esperando o momento adequado e as circunstâncias oportunas para atuar.

 

112- Muitos anseiam ser monges da Ordem Ramakrishna,  com vistas a se livrarem das responsabilidades mundanas, por terem falhado em conseguir emprego, por terem sofrido problemas crônicos, passado por necessidades, por qualquer infortúnio e miséria, ou por terem sido frustrados em seus empreendimentos. Hoje é moda, por assim dizer, tornar-se um sannyasin. Será fácil possuir verdadeiro vairagya (aversão por desejos mundanos e paixões) e tornar-se um verdadeiro sannyasin (homem de renúncia) ?

Devemos esforçar-nos em conseguir capacidade adequada para a vida,  enquanto vivemos no mundo, preparando o terreno com disciplinas espirituais, treinando-nos de alguma forma e não nos atermos ao desejo dos objetos e ao egoísmo; de outra forma, o súbito aparecimento do novo amor logo se apagará como o fogo nas folhas de palmeira. Se os dias forem passados preguiçosamente e a mente gravitar em torno da felicidade pessoal, do conforto, nome e fama nos manteremos de certa forma, por uma hora, para fazer japa e meditação numa espécie de rotina ou trabalho forçado e logo surgirão escusas tais como: “hoje não estou passando bem”, “ontem não encontrei tempo por causa de um trabalho” ou quaisquer outras desta espécie. É freqüente ouvir as pessoas dizerem, após se livrarem de preocupações mundanas e obstáculos e levarem uma vida de renúncia com relativa felicidade e contentamento: “- obtive agora o que desejava; não há razão, pois, para ter pressa. Será bastante chamar a Deus nas horas disponíveis”. Consequentemente, o fervor inicial se desvanecerá e a mente, pouco a pouco, se tornará descrente.

 

113- Há pessoas que, olhando os monges pelo lado de fora do Belur Math, pensam: “como vivem bem os monges neste lugar maravilhoso, às margens do Ganges, com edifícios e templos tão lindos, onde não há preocupação alguma com dinheiro, nem ansiedade e problemas. Em horas regulares, um pouco de trabalho do Mestre, um pouco de estudo, japa e meditação à sua maneira e o que lhes agrada, o resto do tempo. Que vida livre e feliz!” Esses críticos pouco sabem do quanto trabalham dia e noite os monges da Ordem; das regras e regulamentos tremendos a observar, da variedade de árduos serviços constantemente prestados, sem se importar com a saúde, pondo às vezes em risco as próprias vidas e sempre prontos para qualquer emergência. Pouco sabem eles que esses sadhus têm que encarar com frieza a morte e os perigosos compromissos, durante a salvação e liberação dos aflitos e infelizes; tendo, às vezes, que abandonar a vida intensa de sadhanas (práticas espirituais), deixando de lado a própria salvação, na dedicação de suas vidas à serviço da humanidade, tendo o homem por Deus vivo. O membro monástico que não leva adiante as injunções da Ordem ou que tenta afastar-se dela por meio de escusas, ou sai e entrega-se ao que lhe agrada, esse desviado, ao seguir os próprios caprichos, destruirá a estrada de seu progresso, tornar-se-á espiritualmente estéril e, gradualmente, perderá o seu Ideal.

 

114- O chefe de família devoto, dotado de fé e sinceridade, mesmo quando ainda inapto para fazer muita prática espiritual, é mil vezes mais superior ao sannyasin decaído. O primeiro luta o mais que pode, segundo suas possibilidades, para avançar no caminho do progresso espiritual; ora a Deus com o coração anelante de liberação dessa prisão intolerável. A intensidade do anseio de renúncia vai crescendo em seu coração à medida que ele se mantém lutando com os diversos deveres, obrigações e escolhas que constantemente lhe surgem na vida. O coração tem fome e anseio pela visão de Deus e, assim, o desejo de realizá-Lo quebra os laços da servidão e é grandemente intensificado, renunciando o mundo. Este anseio aumenta o poder interior do Espírito, Deus chega-lhe em auxílio, é o seu Guia Interno e sabendo das dificuldades do devoto, remove-as paulatinamente; retira os empecilhos do caminho de sua salvação. A verdade é que, a menos que o desejo de renúncia venha do coração, nem o amor, nem a liberação, nem o conhecimento, - nada - poderá ser obtido.

 

115- Muitos pensam: “- de que vale eu empreender o caminho do trabalho ou serviço à humanidade? É melhor eu tentar primeiramente realizar Deus pelo caminho do yoga e meditação dia e noite!” Isto é possível? Se tentar, por alguns meses ou tanto, chegará a compreender que isto não é praticável. Como é que a mente se purificará a menos que se trabalhe pelo bem dos outros? Pode a mente se tornar calma e pacífica antes de se purificar? E se não for tranqüilizada, será fácil concentrá-la e meditar no Ideal? Em verdade, é no trabalho que se obtém a melhor prova e medida de si mesmo. Descobre-se a limitação das próprias forças e habilidades. Somente pelo trabalho é que se pode saber quantos e quais os defeitos e fraquezas da mente; quão forte é a atração pelos apegos aos objetos mundanos; quanto egoísmo e também, de quanta paciência se carece e se a capacidade de resistir aumenta ou diminui. Somente através do trabalho e do serviço será encontrado o mais certo e fácil remédio para nossos defeitos. Se a ação de discriminação e a auto-introspecção ou auto-análise forem cultivadas, a mente se tornará provavelmente pura e sem desejos. O sentimento de egoísmo será destruído, o coração se encherá do amor divino e, então, não se olhará o trabalho como trabalho. Longe de ser uma imposição, tornar-se-á um meio de liberação, isto é, ele será transformado em adoração. Nenhuma diferença se sentirá entre o trabalho e a adoração de Deus, entre o serviço do homem divino e a adoração a Deus. Em verdade, isso é o verdadeiro bhakti, o amor a Deus e a maneira mais natural de ganhá-lo é seguir o caminho do karma yoga ou ação desinteressada.

 

116- O supremo  amor de  Deus,  também,  não pode ser adquirido sem se atingir o conhecimento, isto é, sem a realização de que o Ideal Escolhido, Deus, está em todos os seres; que o mundo inanimado e animado não têm a existência separada Dele. O sentimento do imanente ou da unicidade do Supremo Ser nos mundos inanimado e animado como, também, no Ser interior, é o mesmo amor supremo e conhecimento supremo. Mas para cada um dos caminhos diferem as práticas espirituais de acordo com as respectivas inclinações da mente e qualificação dos aspirantes. As pessoas qualificadas para trilhar especialmente o “caminho do conhecimento” são raras no mundo. O caminho é também bastante árduo; por esta razão, bakti, extrema comunhão, é preferível.

 

117- No “caminho do conhecimento” (jnana yoga) toda a existência tem que ser negada logo no começo: “Isto não (neti)”, “isto não (neti)”; “eu não sou isto nem aquilo”; “nada do que vejo, ouço ou percebo sou eu”, “não sou o corpo, nem a mente, nem os sentidos”; “não sou eu que experimento alegria, tristeza, felicidade ou infelicidade, calor ou frio”, “o universo manifestado não é existente também, isto é, não tem existência nas três divisões do tempo - passado, presente e futuro, portanto, é irreal”; “eu sou da natureza da Existência - Conhecimento - Felicidade Absoluta, o Supremo BRAHMAN, o Supremo Uno sem segundo”. Por acaso, será possível a qualquer um com as limitações do corpo, ego, etc, praticar essas rigorosas disciplinas? Estando um espinho a picar-lhe a pele e o fogo a queimá-la, não sentiria ele a sensação da dor? Assim deve ser o estado de um homem de perfeita renúncia, despido do mínimo apego aos objetos dos sentidos, que experimentou o nirvikalpa samadhi, o mais alto estado de superconsciência além de todas as modificações da mente - a culminância de toda a prática espiritual e realização. O Mestre costumava dizer que o corpo nesse estado não dura mais que vinte e um dias.

 

118- O “caminho da devoção” (bakti yoga) é fácil de ser trilhado por todos, porque não se requer a morte dos sentidos ou a eliminação dos impulsos e desejos. Necessita-se, apenas, de um novo direcionamento. O encaminhamento das tendências de suas energias deve ser dirigido ao longo de novos canais. Isso pode ser feito pela linha de menor resistência. Há que se retirar a mente com urgência dos objetos dos sentidos e dirigi-la na direção de Deus. A maneira de fazê-lo é libertar-se dos desejos, percebendo, com o auxílio da razão e discriminação, o caráter inteiramente nocivo da luxúria, cólera, cobiça e ilusão, causas de sofrimento e ligaduras sem fim. Enquanto as paixões não forem conquistadas, o homem terá que nascer e morrer muitas e muitas vezes e sua infelicidade não terminará. Continuará indefinidamente, pois o meio, os maus desejos, não somente lhe amortecerão gradualmente a força como também as tendências irreprimíveis a levarão para baixo. No entanto, por um processo de sublimação, essas tendências poderão ser levadas para cima e convertidas em tremenda força benéfica que lhe encherá a vida de inexaurível sentimento de suprema felicidade. Se você deseja prazer, anele a companhia sagrada do Senhor que é todo amor; se é avarento, cobice a posse do imperecível tesouro supremo - Deus; se está enfatuado com a beleza, enamore-se do “Eternamente Belo”; se está colérico, aja assim com Deus, por nunca se Ter revelado e, assim por diante, com referência ao orgulho e à inveja que o mantêm sob as pequenezas da vida.

 

119- No começo,  deve-se seguir o “caminho do trabalho” (karma yoga)  com as práticas espirituais - ambos são necessários. Devem ser feitos um e outro em harmoniosa combinação. Tenha a firme convicção de que o objetivo de ambos é a realização de Deus. Se esse Ideal não for mantido com firmeza, toda a espécie de distrações mentais surgirão e você se perderá nos labirintos do trabalho. Um adequado equilíbrio deverá ser rigorosamente observado, assim também com referência a qualquer ideal na vida. Por essa razão, deve-se estar desperto e alegre, sempre discriminando entre o real e o irreal e cultivando o hábito da oração. Se isso for feito, chegará o tempo em que com a graça de Deus, nenhuma diferença será sentida entre o trabalho e a prática espiritual. Tudo o que se fizer será, então, transformado em prática espiritual. Mas é necessário que o devoto trabalhe; saia de vez em quando em peregrinação, levando adiante as práticas espirituais e austeridades intensamente por certo tempo, digamos um ano ou tanto num lugar isolado, cheio de espírito de inteira renúncia e dependência a Deus. Isso faz com que o corpo e a mente se sintam reforçados e alegres; infunde-nos grande confiança e dependência a Deus, tornando-nos o caráter forte e perfeito.

 

120- Quem quer que tenha sido iniciado pode, sem exceção, executar a adoração a seu Ideal Escolhido. A iniciação purifica o corpo. Faça sua oração (puja) com profunda devoção, sabendo que Deus é o seu mais íntimo e colocando toda sua fé Nele. Ofereça-lhe flores, incenso, guirlandas e doces, conforme pede seu coração. Se a mente ficar absorvida na adoração, facilmente se acalmará; a meditação se tornará mais profunda e se sentirá imensamente alegre. Não há regras e proibições na adoração feita com amor; nenhuma necessidade há de textos sagrados, fórmulas, diagramas, genuflexões ou gestos específicos. Por ocasião da adoração, pense que seu Ideal Escolhido está realmente presente, aceitando amorosamente a oferenda de frutas, flores, doces e outros objetos, por mais insignificantes que sejam. O alimento ungido de amor e devoção é muito doce e querido de Deus. Há uma estória em que Ele participou com extremo prazer da simples e humilde refeição de um devoto de nome Vidur, recusando o convite do rei Duryodhana. O que quer que coma, faça-o após oferecer o alimento mentalmente a Deus. Saiba que o alimento consagrado é a dádiva de Sua misericórdia; destrói espiritualmente qualquer propriedade prejudicial que possa estar ligada ao alimento.

 

121- Seva (serviço) svadhyaya (estudo das Escrituras), sadhanas (práticas espirituais), satya (verdade) e samyama (controle da mente e dos sentidos), são os melhores meios para a realização de Deus. Pratique-os sempre com diligência e com a máxima pontualidade.

 

122- As más tendências (samskaras) desta vida e das passadas serão aniquiladas e as boas tendências serão formadas e fortalecidas pela firme e regular prática dos deveres como: puja, svadhyana, japa e meditação, resultando daí que as práticas espirituais se tornarão gradualmente fáceis e a mente, tornando-se pura e firme, é absorvida no pensamento de Deus, atingindo, finalmente, o conhecimento da realidade.

 

123- A menos que se tenha um incentivo derivado de boas tendências ou trabalho virtuoso em vidas passadas, não se terá fé na religião ou em Deus, nem se sentirá qualquer inclinação por eles. Mesmo que alguma fé ou inclinação, resultantes de trabalho de mérito religioso, estejam presentes, certos obstáculos surgirão e tornarão extremamente difícil o progresso rápido no caminho religioso. Mas nem por isso devemos nos desesperar; quanto mais firmemente nos mantivermos no propósito de ultrapassá-los, mais facilmente sairão de nosso caminho e acontecerá então que tais obstruções deixarão de ser hostis, far-se-ão amigas e auxiliares. Quanto mais medo de encarar os obstáculos e impedimentos que você tiver, mais obstinadamente prosseguirão, amedrontando-o.

 

124- Sem as boas tendências adquiridas em vidas passadas,  não se pode compreender claramente as Escrituras e as instruções do Guru. Pode-se ter atingido grande instrução, intelectualidade, altas posições, nome, fama e honra social; ter sido um excelente chefe administrativo ou um multimilionário; mas no que toca às verdades sutis do Espírito, pode-se ser tão ignorante como uma criança e não ter mesmo fácil entendimento para os mais simples assuntos religiosos. Mas se você for veraz e tiver fé, simplicidade e amorosidade pelos pobres e aflitos, poderá ser abençoado com a graça de Deus, a companhia de pessoas santas, um competente Guru e ganhar-lhe o favor, resultando daí a aquisição da capacidade para compreender as sutis verdades religiosas.

 

125- Mesmo se não houver muito boas impressões passadas, poderão ser criadas impressões favoráveis pelo constante esforço, sinceridade e prática. Há uma tremenda força na prática que se tornará firme e frutífera, se contínua e ininterruptamente for feita com fé e devoção. O que quer que se pratique, tornar-se-á, no curso do tempo, uma segunda natureza. Então, não haverá mais necessidade de relutar para realizar algo desejado, pois isso será automaticamente feito. Se constantemente você praticar a lembrança de Deus, oração, japa e meditação, tudo isso sairá do coração sem a necessidade da ação consciente da vontade ou sem esforço, mesmo quando estiver envolvido noutro trabalho. Mantendo-se a mente em Deus como a agulha de uma bússola, a ligação aos objetos mundanos desaparecerá e os perigos e calamidades não poderão atingi-la; mesmo por ocasião da morte, a mente permanecerá calma e absorvida em Deus. Uma pessoa assim não morrerá, renascerá poucas vezes e se fundirá no supremo estado de beatitude.

 

126- Se for capaz de estabelecer  Deus em seu coração por meio da prática espiritual feita com intensa sinceridade, discriminação, desapego e amor, você O realizará e O verá em todas as partes, no seu interior e fora, em todas as coisas. Nada no universo existirá para ser obtido ou desejado por você, pois com a vida transbordante de ventura, terá Deus por seu único e verdadeiro objetivo, e tudo mais não será senão sombras.

 

127- Pratique japa e austeridades de todo o coração, tanto quanto puder.  Deve ter sempre fixo na mente que Deus somente poderá ser realizado por Sua graça e não pelo resultado de muita prática de japa e austeridades; as práticas espirituais são feitas para você cansar as asas do pensamento, por assim dizer. Um pássaro deseja pousar, logo estejam fatigadas suas asas; depois de voar tanto em alto mar, descobre ele que não há outro lugar para descansar senão no mastro de um navio e ali pousa. A menos que cresça o sentimento de que Deus é o único refúgio, numa convicção inabalável, não se pode tomar abrigo completamente Nele e conhecê-Lo como o Tudo em tudo.

 

128- O verdadeiro devoto jamais tem uma atitude de comercialização com Deus. A idéia de barganhar com Ele a liberação por devoção jamais lhe passa pela mente. Ele sabe que Deus é o oceano de misericórdia não condicionada, que sem dúvida, derramará Sua graça pela natureza de Seu caráter. Tem-se, entretanto, que fazer as práticas espirituais com a melhor habilidade, chegando-se finalmente à conclusão inevitável de que a prática será inconseqüente sem Sua misericórdia. Assim, cantou um devoto: “se for da Tua vontade, ó Mãe, salvar-me por virtude de Tua própria natureza, então volta Teu olhar de misericórdia sobre mim”. De outra forma, toda conversa de encontro com Ele, praticando japa, será como a sanga (casamento) daquele que morreu; é absurdo. Ninguém jamais realizou Deus, ninguém jamais O realizará simplesmente pelo poder das práticas espirituais. O homem de sabedoria sabe que a esperança de atingir a Deus por meio das práticas espirituais é como cruzar o oceano a nado.

 

129- Então, deve-se abandonar as práticas espirituais e esperar que um dia Sua graça desça por Si mesma? Poderá alguém, atormentado de sede e coração anelante por Deus, sentar-se de mãos juntas sobre o peito e prender a alma pacientemente pela eternidade? Na verdade, sua luta é como se expressou um sadhaka ardentemente apaixonado: “minha mente entende; mas o coração não”. É como o caso do anão tentando agarrar a lua. A palavra “impossível” não existe para o aspirante; ele sabe que Deus torna possível o impossível; que Ele pode, se desejar, fazer passar um camelo pelo buraco de uma agulha.

 

130- O espírito de um verdadeiro devoto e verdadeiro sadhaka é:  “eu encontro deleite na prática de japa e meditação e não posso evitar fazê-los. Eu os pratico porque não há outra maneira de apaziguar o coração; pratico japa e meditação porque são o próprio alento de minha vida. Sem eles não me é possível viver. Deus é a verdadeira Vida de minha vida, é o Ser de meu ser. Ele deve ser realizado. Se não encontrá-Lo, ficarei louco ou morrerei e a própria vida terá passado em vão”. Se houver tal ânsia, essa loucura de amor, essa tenacidade inabalável de propósito, Deus, com certeza, derramará Seu favor sobre o devoto, pois Ele é todo misericórdia. Sem falta, mostrar-se-á a quem O chame com absoluta sinceridade e pureza e, renunciando a tudo por causa Dele, tome refúgio somente Nele.

 

131- Mas, esse anelo, esse sentimento de que Deus é o único refúgio, virá tão facilmente? Virá somente no último nascimento daquele que intensamente se tenha devotado às práticas espirituais, em muitas vidas anteriores com esse único objetivo. Tal propósito luziu com um brilho permanente em toda a vida de Nag Mahashaya, o grande discípulo de Sri Ramakrishna e chefe de família. Que estado notável de intoxicação divina tomava-lhe o ser inteiro durante o tempo todo; que absorção total na alma, sem qualquer preocupação com o corpo; que admirável humildade, tendo-se a si mesmo como a mais simples das criaturas de Deus; que intenso anelo pela visão de Deus lhe queimava a alma e lhe consumia o arcabouço físico! Aquele que não o viu, não pode ter a idéia daquela vida ímpar de maravilhoso exemplo.

 

132- Deus não pode ser visto a menos que a mente se torne tranquila, pura e sem manchas. Se a água do lago (mente) não permanecer calma e transparente, não refletirá nada absolutamente ou o fará apenas indistintamente. Se o espelho estiver coberto de poeira, não refletirá uma imagem ou o fará de maneira turva. Por esta razão, a prática repetida e a renúncia são os únicos meios ou normas para a purificação da mente. Mesmo aquilo que é sentido como difícil ou impossível, tornar-se-á fácil de atingir, pela continuidade da prática. O que quer que seja regularmente praticado, gradualmente se vai tornando parte da natureza de cada um. A par disso, o espírito de renúncia deve ser cultivado. Tudo é passageiro e insubstancial; só Deus é real e eterno. Se conseguir aprender isso, poderá se entregar totalmente a Deus; o amor puro se levantará em seu coração. O Senhor é da natureza do amor inefável; quando esse amor, que está alem da palavra e da mente se aprofunda e mora no coração, o amor humano se reflete então na forma do Bem-Amado.

 

133- Qualquer que seja a sua renda, tente economizar; será útil para o futuro, porque a saúde, o serviço, os negócios, a riqueza, os parentes, nada é permanente. Se na juventude ou na meia idade a pessoa for iludida pelos sentidos sob a influência das más companhias e maus hábitos, passará a ser um pesadelo no futuro; ganhe o que ganhar, terá com certeza, tédio sem fim. As doenças e dores, pesares, calamidades e ansiedades estão sempre presentes no mundo. Na idade provecta será a pessoa uma fácil presa de doença e decrepitude e perderá com rapidez a capacidade de trabalhar; mas se houver alguma economia, não sucumbirá às dificuldades financeiras, nem terá que se lamentar e chorar, podendo passar o resto da vida independente e com paz mental, pensando em Deus e no Espírito.

 

134- “Qualquer que seja a situação, ó Mãe, em que Tu me coloques, na verdade, ela será uma bênção para mim; que eu jamais me esqueça de Ti”. Assim cantou um sadhaka. Ele, O Senhor, é todo o Bem para todos; sabe o que é bom para cada um e assim dispensa as coisas de tal maneira que elas possam ser boas para você como boas para os demais, pois Ele tem que olhar pelo universo inteiro. Deve-se saber, certamente, que Deus não pode fazer o bem somente para um, às custas de uma afronta aos demais.

Pensando sempre em “eu e meu”, confinando-nos num círculo estreito, desejamos a felicidade somente para nós e nossos parentes, tentando obtê-la a qualquer custo, sem nos importar se fará mal à outrem. Não há felicidade completa, sem dor, no mundo. Ambas estão entrelaçadas; se você desejar uma, a outra virá por si mesma. Não nos mexemos senão para ver o que desejamos. O Senhor sabe muito bem o que é realmente melhor para nós, porque Ele sabe tudo. A felicidade e a infelicidade não podem perturbar a equanimidade da mente da pessoa que, estando com o que Deus dispôs, toma refúgio  somente Nele, e vive no mundo totalmente confiante Nele.

 

135- Várias obstruções surgem sem aviso àqueles cujas mentes estão ligadas aos objetos mundanos, mesmo que se retirem para a floresta. Mas a pessoa engajada num bom trabalho e que refreia os cinco sentidos, mesmo vivendo em casa, está praticando em si mesma tapasya (austeridade). A casa de um homem sem apegos é, por si mesma, uma tapovana (heremitério). Assim diz o Rig-Upanishad: “aonde quer que você vá ou o que quer que faça com a mente descontrolada, inevitavelmente terá que sofrer, não haverá fuga; além disso, ficará também emaranhado em novas e inimagináveis servidões. Mas aquele que pode trazer a mente controlada pelas práticas espirituais, estará livre de ligadura aos objetos, ainda que viva no mundo; tanto a floresta quanto a casa lhe valem a mesma coisa. Onde quer que viva ou o que quer que faça, será sempre livre e cheio de ventura”.

 

136- A média dos homens não pode permanecer, mesmo um momento, sem falar. Se não houver com quem falar, ele o fará mentalmente consigo próprio. O que é pensar senão falar consigo mesmo? Se é assim, não será preferível tomar o nome de Deus, pensar Nele tanto quanto se possa, do que indiferentemente entabular conversa fútil e tola? Naturalmente é inevitável para a conveniência do trabalho ou dos negócios manter variada conversação com as pessoas; mas, quando sozinho e não tendo nenhum trabalho importante à mão, será certamente desejável habituar-se a lembrar de Deus, tomar-Lhe o nome, em vez de entreter-se com pensamentos de tão pouca valia. Há que praticar japa o tempo todo, para descartar-se de outros pensamentos, pois japa significa a repetição contínua e ininterrupta do nome de Deus.

 

137- Ao fazer japa, deve-se pensar somente em Deus, ver-Lhe o nome e Seu significado como idênticos. O nome é idêntico à pessoa invocada, isto é, logo que se pronuncia o nome, entende-se que significa a pessoa que o possui. Ao se chamar alguém pelo nome, simultaneamente sua imagem flutuará ante a mente e este alguém responderá ao chamado ou se aproximará. Com japa ocorrerá o mesmo, se for feito com a mente fixa somente em Deus. Mas deverá existir tanta fé que o chamado chegue a Deus e Ele responda; assim também será com o coração, se ela for sincera e ardente. Pela repetida prática de japa, o sentimento de certeza e proximidade se estabelecerá firmemente, a mente se tornará absorvida em Deus, sendo a Sua presença seguramente sentida. Dizem as Escrituras que a  “realização vem através de japa”.

 

138- Ensinam os yogues que há sete lótus ou chakras- centros nervosos no corpo humano. O lótus de quatro pétalas (muladhara) na região retal; o de seis pétalas (svadisthana) na região situada quatro dedos abaixo do umbigo; o de dez pétalas (manipura) na região umbilical; o de doze pétalas (anahata) na região cardíaca; o de dezesseis pétalas (vishuddha) na região laríngea; o de duas pétalas (ajna) entre as sobrancelhas e o lótus de mil pétalas, denominado sahasrara, no topo da cabeça. Além disso, há três condutos (nadis): ida, pingala e sushumna, respectivamente à esquerda, à direita e no centro da coluna vertebral.

Subindo pelo sushumna, a corrente nervosa termina no sahasrara - o “assento de BRAHMAN”, após passar pelos seis outros centros, um após o outro. Mas a passagem de sushumna conserva-se fechada até que a kundalini desperte à maneira de serpente. A kundalini é o poder do conhecimento do Ser, a essência da Inteligência, é BRAHMAN mesmo. Esta shakti jaz adormecida em sua inatividade e não percebida, no lótus muladhara de todos os seres humanos. É despertada pela yoga, meditação e outras práticas espirituais.

Quando este poder desperta no muladhara e se une ao Supremo SHIVA ou PARAMATMAN (Ser) no sahasrara, após levantar-se pelo conduto sushumna, penetrando-o e passando sucessivamente pelos seis centros, flui, então, da união dos dois; o néctar da supra-sensória doçura que, sorvido pelo indivíduo, fá-lo entrar em samadhi. Somente então despertará ele para o conhecimento do Ser Supremo e atingirá a perfeição. Além disso, várias experiências espirituais maravilhosas ocorrem, como a percepção da luz auto-luminosa que tudo abrange ou a visão gloriosa do Ishta escolhido. Às vezes esta shakti kundalini desperta por si mesma ou com pequeno esforço pela graça do Guru , ou devido à força de sadhanas, ou pelas boas obras do aspirante em suas vidas passadas. O Mestre costumava dizer que usualmente o corpo não dura mais que vinte e um dias neste estado de nirvikalpa samadhi, o estado de Pura Consciência além das modificações mentais. Quando o indivíduo imerge no Supremo Ser, BRAHMAN, torna-se uno com Ele. Isso é conhecido, em suma, como “shat-chakra-bheda”, ou o ato de atravessar os seis chakras (centros nervosos místicos).

 

139- Os que são instrutores do mundo (Acharyakotis), especialmente bem dotados professores espirituais ou pessoas dotadas de autoridade divina (Iswarakotis),que nasceram em corpo humano pelo bem da humanidade ou para cumprir uma missão divina especial, podem trazer o “poder serpentino” desperto, de retorno ao sahasrara, passando pelo anahata e aí permanecendo no particular estado divino de bhava-mukha, rejeitando até a beatitude de BRAHMAN para si mesmos. Eles habitam alternadamente os estados de consciência absoluta e relativa, ou seja, perdem-se por vezes em samadhi ou consciência de Deus e, por compaixão, trazem-na para baixo, ao plano humano, com o único propósito de liberar milhares de almas da ilusão e amarras da ignorância.

 

140- Dizia Swami Vivekananda que muito raramente  o poder de kundalini pode ser desperto por si mesmo, sem se ter conquistado adequadamente os métodos usuais do yoga prescritos nas Escrituras hindus. É como a súbita descoberta de uma verdade inesperada. Suponhamos que ao caminhar por uma estrada, o homem tropece e encontre, por acaso, algo que brilha debaixo de uma pedra. Levantando-a, vê jarras e jarras cheias de moedas de ouro; assim é. Mas aqueles que repentinamente realizam uma verdade superior desta maneira, podem causar ao mundo mais mal do que bem, pelo fanatismo e estreiteza de visão. Durante as obrigações dos cânticos religiosos muitos choram, lamentam-se e dançam selvagemente até perderem a consciência pela exuberância da emoção subitamente excitada. Uma porção de seu poder kundalínico, sem dúvida, despertou de certa forma um pouco, mas isso se repetindo com freqüência traz uma terrível reação. É realmente sabido que o desejo de condescender com seus hábitos viciosos ou com seus anseios por nome e fama e o de passar por grandes devotos ou adeptos espirituais ante o público, fazem com que cresçam muito e finalmente degenerem em hipócritas e charlatães.

 

141- Assim como o homem vê o sol com o auxílio da luz solar e não acendendo uma luz, assim Deus é visto somente através de Sua própria graça e não pelos poderes limitados dos homens. Mas o sol não poderá ser visto se as nuvens chegam a cobri-lo; da mesma forma acontece com a visão de Deus se avidya (ignorância) ou Maya conseguir obscurecê-la. Os ventos da oração e disciplinas espirituais sopram essas nuvens e Deus se revela por Si mesmo. A oração e as disciplinas espirituais não constituem a causa para o emergir da revelação de Deus, pois Ele é auto-revelado; elas apenas desfazem o véu das obstruções.

 

142- Jnana, bhakti, pureza, renúncia, anelo por Deus são qualidades divinas, características essenciais próprias de Deus. Ele outorga antecipadamente  essas qualidades ao devoto a quem Ele quer favorecer ou  Se revelar. Quando tais virtudes se encontram numa pessoa, sua noite escura de ilusão, na verdade, estará prestes a desvanecer-se e a aurora gloriosa a surgir sem demora. Conheça o seguinte conto do Mestre? Havia um senhorio que era importunado por seu inquilino. Ele não somente concordou em visitar sua casa e participar de sua hospitalidade como também enviou-lhe artigos de necessidade, por saber de sua pobreza e da impossibilidade do mesmo em ter despesas maiores. Deus favorece apenas a quem anseia por Ele de todo coração, tendo renunciado tudo por Sua causa.

 

143- Deus, então, tem preferências e aversões? Favorece a uns e nega a outros? Torna-se insatisfeito com os que vivem no mundo, esquecidos Dele, submersos em problemas com esposa, filhos e propriedades e não os favorece? Como pode acontecer isso? Não é assim. Todos, sejam eles devotos ou arredios, sejam sannyasins ou chefes de família, todos, na verdade, são igualmente Seus filhos. A mãe tem sempre amor e afeição pelos filhos, ainda que entretidos nas brincadeiras e esquecidos dela. Quando um deles grita por ela, deixando à toa os seus brinquedos, a mãe pára todo o trabalho, toma-o no colo e acaricia-o. A mãe pensa: “enquanto ele brinca, está feliz. Por que perturbá-lo? Que continue brincando”. Mas, quando a criança não se interessa mais pelo brinquedo, abandona-o, nada o distrai e somente deseja a mãe, aí ela chega e a toma em seus braços. Em verdade, poderá haver brincadeira que dê à criança em algum momento tanta felicidade quanto a que ela sente ao mamar no seio materno? Isso se chama Maya.

 

144- Por mais que a tempestade  atordoe com o cintilar dos relâmpagos e estrondos dos trovões, desabando em aguaceiro, o pássaro chatak, sem a mínima parcela de medo, vira-se para o céu e mata a sede, bebendo da água da chuva até que o coração esteja satisfeito. Diz a Tradição: “jamais ele bebe da água empoçada, mesmo morrendo de sede”. Da mesma forma, o sincero devoto somente a Deus procura para mitigar a sede ardente; de ninguém espera mais nada, senão de Deus. Sabe que seja o que for que possa acontecer, será uma dádiva da graça divina. Jamais se perturbará com a mais terrível visão da face de Deus que lhe advenha. Não lhe importa se a dor, miséria, infelicidade, calamidades ou outros males do mundo caiam sobre si: verá neles somente a face de seu Bem-Amado. Sabe que Deus é o Bem; o que faça, Ele o faz para seu bem e para o bem de todos. Estar descontente, queixar-se Dele e de Sua dispensação significa encontrar erro em Deus. O verdadeiro devoto não pode fazer  isso, mesmo em se tratando da própria vida.

 

145- Guru é aquele que sob a direção de Deus, ao longo do caminho, proporciona paz ao jiva, queimado pela tríplice miséria na vida; dor corporal, mental e a resultante de causas naturais. O relacionamento entre Guru e discípulo é o de um pai espiritual e seu filho ou filha. O pai mundano gera filhos, o Guru liberta discípulos dos nascimentos e mortes, mostrando-lhes a verdade suprema. O débito paternal pode ser pago pela continuação da linha  familiar e pela realização de shraddha (cerimônias sacramentais feitas pelo filho após a morte do pai, pelo seu bem estar no além); mas o débito para com o Guru não pode ser pago, mesmo com o oferecimento de tudo o que tenha, pois ele liberta o discípulo de avidya (ignorância). Assim como uma ou outra virtude dos ancestrais é transmitida aos filhos e netos em diversos graus, assim a espiritualidade certamente desce aos discípulos, na linhagem dos Gurus.

 

146- A realidade não pode ser atingida se formos impacientes. Somente o Supremo Eu é a única realidade, essência e verdade e o universo manifestado é irreal, não essencial e, portanto, deve ser rejeitado. É necessário grande paciência e perseverança para nos estabelecer no conhecimento desse fato.

 

147- O “você real” existirá verdadeiramente quando o pequeno você, o ego, cessar de existir. A sua verdadeira vida começará quando o seu pequeno eu morrer. As aflições se afastam quando o pequeno eu (ego) morre.

 

148- Pensando que nossa vida e morte dependem deste mundo, nós mesmos criamos toda a espécie de incômodos e perturbações, numa tentativa de salvaguardar os próprios direitos e interesses. Sentimo-nos infelizes e não temos escrúpulos também em causar dano à outrem e até arruiná-lo. Dia e noite nos exaurimos, correndo de um lado para outro, atrás de nossos objetivos na vida e, lutando, caímos na goela dos outros, como se diz: “ó, não tenho tempo nem para morrer!” Tal é a  Maya (qualidade ilusória) de Mahamaya, a Mãe Divina, a “Grande Prestidigitadora da Ilusão Cósmica”. A “Mãe” senta-se , observa o jogo e sorri. Parecemos gatinhos ou cãezinhos a brincar e, de unhas afiadas, de vez em quando, arranhamo-nos, uns aos outros. Atribuímos uma gravidade indevida ao jogo e ficamos enredados nele de tal forma que nos tornamos totalmente inconscientes das conseqüências, e pouco nos importa morrer na luta. A brincadeira, sem dúvida, torna-se muito absorvente, tal como um drama que parece real se atores e atrizes se identificarem inteiramente com seus papéis; mas, fazem-no somente por um certo tempo.

 

149- Esse jogo só chega ao fim quando nos vem a consciência de que a vida neste mundo é meramente um enredo de uma peça de teatro. Num sonho rimos ou choramos; às vezes, sem auxílio e como loucos, somos levados por perigosas vagas e gememos de medo ou gritamos em agonia, parecendo-nos sem fim os nossos horrores; a razão e o julgamento nos fogem e até as coisas mais estranhas nos parecem naturais e verdadeiras; mas ao se desfazerem com o despertar, verificamos, afinal de contas, que não fora senão um sonho e, no estado de vigília, exclamamos: “- ó, que alívio!” Se o sonho for agradável como o de ter ganho dois milhões de rúpias na loteria, ficamos fora de nós de alegria e, ao apagar-se subitamente o sonho, entramos em depressão com o despertar. Nossa vida inteira nada mais é que um sonho de longa metragem; é uma tessitura de bons e maus momentos, de esperança e desespero, de prazer e dor. Tal como aranhas, tecemos a teia. Enquanto dura, tudo nos parece real, e todo aquele mundo se desfaz em nada, tão logo o sonho se apague. Que permanece, então? – A eterna verdade existente por si mesma, que se revela por sua própria natureza.

 

150- Como pode Deus zangar-se com alguém? A cólera é causada quando algo se antepõe a um objetivo profundamente desejado. Haverá algo que Deus deseje ou tenha que obter ou que não possa obter e exista para colocar-lhe obstáculos no caminho? Ele nada espera de nós; não Lhe importa o mínimo se nós O chamamos ou O esquecemos. O ganho ou a perda, o prazer ou a dor, o bem ou o mal pertencem somente a nós.

 

151- Declaram os Upanishads que aquele que diz conhecer BRAHMAN, não O conhece; mas aquele que sabe que BRAHMAN está além do alcance da palavra, da mente, que é da natureza do conhecimento absoluto e, portanto, além do conhecimento limitado da experiência, conhece-O verdadeiramente e, assim, tornar-se-á o próprio BRAHMAN.

Quem poderá conhecer o conhecedor? Conhecido o conhecedor, este se tornará objeto de conhecimento e, portanto, limitado. O que quer que seja limitado dentro do campo de espaço, tempo e causa, está sujeito a nascimento e destruição, méritos e deméritos, logo não poderá trazer mukti e perfeição. Assim, qual seria a conveniência de conhecer, adorar ou atingir um objeto limitado?

 

152- BRAHMAN é de natureza da verdade, conhecimento, beatitude e infinito, que não são seus atributos, porém Sua natureza, Sua essência. Os atributos limitam, não são eternos, porque surgem e desaparecem. BRAHMAN, pois, está além de tudo, acima de todos os atributos e predicados. Dele somente se pode dizer: “- isto não, isto não”. Até isso não pode ser dito, quando a natureza total de BRAHMAN é realizada, porque o sentido de dualidade desaparece também nesse estágio. Portanto, quem pode dizer algo de BRAHMAN? Mas em Seu aspecto com forma, Deus Pessoal, BRAHMAN é possuidor de infinitas e abençoadas qualidades.

 

153- Se BRAHMAN é Uno, sem segundo, de onde veio Maya e por que age sobre Ele? Esta é uma velha pergunta que não leva a nenhum fim, pois nenhuma resposta pode ser dada dentro do alcance de Maya. E, após estar além de Maya, quem haverá para fazer esta pergunta, se nada chamado Maya existe para ele? Nesse estágio, tanto o que vê como a coisa vista desaparecem, e somente a idéia de unidade permanece. Tem-se, então, a intuitiva percepção de que somente BRAHMAN existe, sempre o mesmo, no passado, presente e futuro, brilhando em Sua glória transcendente e Maya jamais O tocou com o ilusório senso de dualidade.

 

154- Discípulo é somente aquele que luta com alma e coração para seguir à risca o espírito das instruções do Guru; com sinceridade e fé e devotar-se ao serviço do Guru somente para comprazê-lo. Não o vê como um simples homem e, sentindo-o como Deus visível, amando-o e adorando-o de todo o coração, fará rápidos progressos no caminho espiritual atingindo o objetivo almejado. O Guru qualificado é quem faz surgir a união do discípulo com o Supremo Guru, o Senhor, o Ishta escolhido, que mora no coração. Somente através do Guru  é transmitida ao discípulo a corrente espiritual. Qualquer coisa desejada poderá ser conseguida pela graça do Guru; mas o discípulo deve ter as condições necessárias para merecê-la. São indispensáveis: pureza de corpo, da mente e da palavra; intenso anelo por jnana, bhakti e mukti; aversão aos objetos mundanos e perseverança indômita. O Guru há que ser versado no verdadeiro conteúdo dos shastras, imaculado e estabelecido em BRAHMAN. Ele deve ser livre de desejo pelos gozos mundanos, inegoísta e devotado ao bem; seu amor e compaixão devem ser os mesmos para com todos os seres.

 

155- Pai e Guru desejam, respectivamente, ser ultrapassados pelos filhos e discípulos. Sinceramente almejam que o filho ou o discípulo os superem em grandeza, sejam mais eminentes e recebam mais honrarias e respeitos do que eles. Mas o pai espera muita coisa de seu filho, enquanto o Guru nada espera do discípulo para si mesmo; sua natureza é dar, e dá sem a idéia de retribuição. Swamiji costumava dizer-nos: “- que eu possa ver cada um de vocês se tornar maior que Vivekananda! Então ficarei muito feliz e satisfeito e a vida me terá valido a pena!”

 

156- Um cadáver trespassado por um sabre nada sente . E se o corpo puder se tornar um cadáver, ou seja, se a identificação com o corpo puder ser destruída, então, por mais severos que possam ser os golpes que lhe atinjam, esses nunca serão sentidos. Somente pessoas dessa natureza não reagirão a tais circunstâncias como mortais comuns, pois estão livres do corpo em que vivem; para elas tanto o lar quanto o lugar da cremação, a vida e a morte são a mesma coisa.

 

157- O apego ao corpo, a identificação com ele  são verdadeiramente as raízes de todos os males. E todos os temores, erros e vícios daí se originam. O homem rouba, trapaceia, arruina à outrem e pratica até o assassinato afim de preservar o corpo e continuar a viver. O sexo e o ouro se tornam a única deidade para adorar e, então, abraça a dor na esperança de prazer e abraça a própria morte na esperança de salvar o abençoado corpo. Ele teme a morte a cada momento. Mas aquele que tem a alma iluminada será capaz de erguer-se acima do sentido do corpo, estando pronto para sacrificar a vida com alegria até mesmo por um animal inferior, pois o corpo é algo totalmente insignificante para ele. Os homens são de duas classes: os homens- brutos e os homens-Deuses; os que se identificam com o corpo e  os que não o fazem. O bruto é o indivíduo subserviente ao corpo, enquanto o desapegado é o homem-Deus.

 

158- Os frutos das ações boas, más ou indiferentes devem ser dedicadas a Deus. Não é correto sentir-se orgulhoso das boas ações, das obras de mérito religioso, de lhes guardar os frutos para o próprio prazer e pensar que somos nós os seus autores. Não é também correto dedicarmos a Deus o fruto de nossos atos maus e errôneos; sabendo que nos causam sofrimento, tentamos transferir-Lhe nossa responsabilidade, achando que as más ações são de Sua vontade e, agindo como nos faz agir, escapamos do terrível julgamento. Estaremos simplesmente nos enganando. Deus dá tudo àquele que se dedica totalmente a Ele, sem nada reter, sem pensar no próprio eu.

 

159- O santo nome OM, o som que liberta a mente de avidya (ignorância) é denominado mantram.

 

160- Avidya foi definida no sistema filosófico de Patanjali da seguinte maneira: “avidya é o sentido de permanência nas coisas impermanentes (o mundo); o sentido de pureza nas coisas impuras (o corpo, etc), o sentido de prazer na dor, isto é, o gozo nos objetos mundanos que, por fim, causam dor; o sentido de ser ao não ser e a identificação de esposa, filhos, etc, consigo mesmo, que, na verdade, não são propriamente a última realidade. Avidya é sem começo, pois seu ponto de partida ou causa não pode ser determinado como também não tem fim, com referência ao processo fenomenal do universo. Mesmo em pralaya (dissolução do universo inteiro), no final de cada kalpa (ciclo), permanece no estado imanifestado, na forma de semente, até que emerge outra vez na época da criação, ou melhor, projeção”.

Enquanto o conhecimento da realidade não for atingido, os homens estarão sujeitos a nascimentos e mortes muitas e muitas vezes, e a sofrer inúmeras infelicidades, tendo que renascer como homens ou pássaros ou como outros animais, de acordo com sua natureza e karma.

 

161- Então, será inútil tentar mukti (liberação)? Certamente que não porque avidya finda, particularmente, para indivíduos que, após sofrimentos sem conta, com discriminação (viveka), serenidade (vairagya), aversão ao gozo dos objetos sensórios e renúncia, tomam refúgio em Deus. Avidya, então, é destruída com raiz e ramos e o conhecimento vem pela graça do Senhor. Deus, infinitamente misericordioso, declara repetidamente no Gita: “- tendo você chegado a este mundo de dor,  adore-Me e tome refúgio em Mim somente. Eu o livrarei de todos os erros e o conduzirei ao âmago da felicidade, através do oceano mundano da existência, caracterizado pelos nascimentos e mortes e tão difícil de ser cruzado”.

 

162- Há um dito bengali: “traga o alimento a minha boca; é muito esforço eu me mover! Abençoados sejam seus pais e seus atos meritórios”. Hoje em dia, a maioria das pessoas pertence a esta categoria. Ninguém quase deseja agir por si mesmo. Quase todos querem atingir seus objetivos, mas gratuitamente ou por artimanhas. Especialmente com as coisas espirituais, buscam evitar qualquer esforço e trabalho, gostam delas e as querem, porém que sejam feitas pelos outros. Após se sentarem de olhos fechados por uma hora ou tanto, durante uns dias ou meses, resmungam e se queixam: “ah, não estou conseguindo nada, não posso concentrar-me, não sinto qualquer progresso!” e assim por diante. Swamiji costumava dizer: “- será Deus um vegetal, um molho de espinafre ou um peixe que se possa comprar com algumas moedas? Por que se impacientar por imediatos resultados? Continue lutando, pois seus esforços trarão frutos por si mesmos, a seu tempo. As pessoas do mundo lhe pagarão o trabalho se você trabalhar para elas e Deus não fará o mesmo, se trabalhar para Ele? Tenha fé, firmeza, amor sincero, paciência e perseverança; tudo isso é necessário. A árvore não brota da semente e, a árvore não dá fruto quando plantada? Há que se empregar muito trabalho e atenção por bastante tempo, antes de se poder colher os frutos na estação certa”.

 

163- Muitas pessoas praticam japa e meditação durante algumas semanas, com grande entusiasmo, após haverem recebido a iniciação,  advindo daí grande alegria e benefício. Passado esse período, o entusiasmo se desvanece repentinamente e não sentem a menor disposição, de sequer sentar-se, para meditar um pouco; sentem os corações vazios e desamparados, sem qualquer apoio a que se firmarem. No entanto, não há razão para se temer nem se desesperar por isso. Tudo quanto existe tem seus altos e baixos, fluxos e refluxos, união e separação. Na vida do aspirante, do mesmo modo, há esperança e desespero, luz e trevas. Se isso acontecer àquele cujo coração arde apaixonadamente por realizar Deus e progredir espiritualmente, este anseio se tornará então mais intensificado, implorando e rogando a divina misericórdia. Pela graça do Senhor, ele novamente se dedicará à meditação com redobrado entusiasmo, progredindo mais rapidamente e encontrando uma alegria muito maior do que a de antes.

 

164- Há uma outra categoria de gente, cujo novo amor ou surgimento da primeira devoção se esfria gradualmente: a mente perde o vigor e ardor primitivos e as práticas espirituais se tornam finalmente uma máscara que lhe encobre a antiga natureza. Ano após ano as práticas são executadas como uma rotina sem sentido, parecida à das enfadonhas ocupações diárias ou como uma espécie de trabalho forçado ou ainda como uma mera observância formal da lei ao pé da letra. As práticas são, então, definitivamente abandonadas com a criação de evasivas enganosas, alegando-se diversos deveres e obrigações mundanas, tais como falta de tempo ou de preparo físico e mil e uma desculpas. Em tais casos é óbvio que essas pessoas tomaram iniciação ou renunciaram ao mundo, num rasgo de momentânea e temporária emoção exuberante; ou num estado espiritual de vairagya (desapego) causado por um golpe severo ou privação ou, então, na esperança de conseguirem determinado objetivo egoísta. Não se espera muita espiritualidade dessa espécie de gente.

 

165- Muitos pensam: “ao me iniciar, o Guru tomou sobre si a responsabilidade de todos os meus erros; não há mais nada para eu fazer ou me preocupar; tudo será alcançado tão somente com sua graça!” Transferir a responsabilidade das faltas a outrem ou tomar o fardo dos erros alheios em seus próprios ombros não é tão fácil como geralmente se acredita. Se assim fosse, o mundo seria um lugar diferente para se viver, pois todos poderiam se purificar sem esforço! Se deseja passar seu fardo de faltas ao Guru ou a Deus, há também que renunciar ao mesmo tempo à parcela de seu punya (atos meritórios). Mas se deseja dar apenas a parte das ações que só lhe podem trazer dor ou sofrimento, enquanto mantém para você a  parte das boas ações, então, nem você dá, nem ele aceitará realmente o erro. Assim, se alguém se torna puro após ter transferido a carga de erros, com certeza não se verá mais envolvido em atividades incorretas. Mas, se as faltas ou as más tendências ainda permanecerem na mente mesmo após a iniciação e não se adquirir uma nova vida, é óbvio que as faltas agirão, após a ocasião da iniciação, exatamente como o fazem as muitas pessoas ao se banharem no Ganges, que limpa todos os pecados. Sri Ramakrishna costumava destacar o seguinte fato, de maneira jocosa: “as faltas pousam nos galhos da árvore mais próxima, às margens do Ganges, enquanto a pessoa se banha, mas, assim que ela sai do rio, os erros se lançam novamente sobre  os seus ombros”.

 

166- Falando seriamente, pense por um momento: por menor que seja o grau de fé, amor ou devoção para com seu Guru, poder-lhe-ia o coração dar guarida ao pensamento de fazê-lo sofrer dores e tormentos colocando todas as suas maldades e erros sobre os ombros dele? É ele, porventura, uma carroça de lixo? Somente os desprovidos de qualquer sentimento de amor, intensamente egoístas e presos aos objetos mundanos, podem ser tão ignóbeis. Esses, em verdade, não devem sequer ser considerados discípulos. Mas os que têm firme fé e amor pelo Guru não podem jamais cometer faltas a fim de não fazê-lo sofrer com isso. Sim, é de tais discípulos que ele tira o fardo das imperfeições. Deus realmente, na forma do Guru, toma esse fardo sobre si mesmo e redime o discípulo do erro.

 

167- Não obstante, é verdade que algumas faltas dos discípulos recaem sobre o Guru. Por isso, vê-se freqüentemente que, quando o mantra-diksha (iniciação) é dado, sem discriminação e escrutínio quanto à preparação e natureza moral do discípulo, alguma doença mortal se apossa do corpo do imaculado Guru, encurtando-lhe a vida. Mas, levado pelo ímpeto de fazer bem aos outros e de conduzí-los a Deus, o inegoísta e eminente Guru, de misericórdia infinita, apesar de conhecer totalmente esse fato, não pensa em seu próprio corpo e diminui sua vida aos poucos pelo bem dos discípulos. As Encarnações de Deus tomam sobre Si os pecados das pessoas, sofrendo por isso de várias enfermidades. Sri Ramakrishna costumava dizer: “esta enfermidade (câncer na garganta) com a qual meu corpo sofre é o resultado de eu ter tomado sobre mim o pecado de Girish” (seu discípulo e grande dramaturgo).

 

168- Quase nada se importando com o corpo que pouco significa, o verdadeiro Guru concede ao discípulo, sem restrição, escrúpulo ou qualquer pensamento de recompensa, o tesouro espiritual acumulado durante a vida através de austeridades e disciplina espiritual. Somente o discípulo puro de espírito e ardente devoto de Deus poderá sentir e realizar totalmente em seu coração a força da corrente espiritual transmitida pelo Guru. Quanto mais o discípulo avança com firme fé e convicção ao longo do caminho da prática espiritual indicada pelo Guru, mais pura se torna a mente e melhor compreenderá ele a grandeza do poder do Guru, bem como sua graça. A realização é atingida pela combinação da graça do Guru com os incansáveis esforços do discípulo.

 

169- Nunca se esqueça de que o objetivo e o fim da vida humana é a realização de Deus. Se desperdiça a vida em comer, dormir e nos prazeres dos sentidos como um animal, em conversas vãs, maledicentes e em atividades infrutíferas, sua vida passará em vão e colherá somente misérias. Dedique-se com todas as suas energias, com todo seu coração e alma à realização de Deus, enquanto houver força e vigor no corpo e na mente. Nunca, por motivo algum, esmoreça em seus esforços. “Essas práticas podem ser feitas mais tarde, isso será possível somente quando Deus assim o quiser ou for propício”. Assim falam os preguiçosos que nada querem fazer, que nunca tencionam fazer algo com sinceridade. Nada de bom será jamais alcançado por eles.

 

170- A melhor época da vida é aquela entre os dezesseis e os trinta anos, quando o corpo retém a maior capacidade para trabalhar, quando são mais intensas as qualidades que nos ajudam a atingir o fim desejado, tais como o entusiasmo, iniciativa, coragem, auto-confiança, força de vontade e firmeza de resolução, já presentes na mente. Tem você, por acaso, a idéia de que se dedicará às sadhanas espirituais em idade avançada, após haver desperdiçado aquele inestimável período da vida? Esperança vã! Isso é meramente uma ilusão. Mesmo que o espírito ou a mente estejam dispostos, verá que o corpo falhará, incapaz de suportar o esforço. O corpo será uma presa constante de toda espécie de doença crônica; será perturbado por enfermidades e dores, sentir-se-á exausto e prostrado pelo mínimo esforço, tornando-se indolente e sonolento. Desamparado pelas elevadas esperanças e ambições frustradas, completamente dependente de outros para o menor serviço ou favor, a vida lhe será insuportável. Mesmo que o corpo continue forte, ainda assim os samskaras (tendências resultantes da vida passada), hábitos e preocupações, excessivo apego à mulher, filhos e netos, etc, manter-lhe-ão tão preso que nem a mente poderá voltar-se facilmente para Deus, nem fazer um esforço sincero para se devotar às práticas espirituais a fim de realizá-Lo. Tampouco será capaz, por mais que o tente, de desviar a mente das cobiças mundanas. Além disso, a vida é incerta e poderá terminar hoje ou amanhã. Quem poderá dizer que viverá muito e encontrará tempo e descanso suficientes? O que você tiver que fazer, faça-o agora, porque se adiar para amanhã, este amanhã poderá não chegar nunca.

 

171- É de suma importância para um sadhaka praticar as seguintes virtudes e regras: 1- Firme fé e confiança em Deus. 2- Observância de brahmacharya ou controle dos sentidos, o que significa renúncia aos desejos da luxúria. Ponderando sobre a natureza insubstancial e má dos objetos sensórios, deve renunciar ao apego e à sede que eles despertam e então  livrar-se de toda paixão. O completo desenvolvimento do corpo, da mente e da inteligência é impossível sem o controle do instinto sexual. Se isto for observado sem interrupção, durante doze anos, um nervo sutil chamado medha, o nervo da intuição e da faculdade retentiva se desenvolverá. Isto é o que caracteriza um sábio ou uma personalidade magnética. Daí lhe surgirá a capacidade de penetrar e reter verdades sutis. Então, a pessoa desfrutará de saúde perfeita; o corpo e a face brilharão com divina refulgência e um vigor irreprimível virá à mente. Capacidade de trabalho e agudeza intelectual manifestar-se-ão plenamente. 3- Moderação e regularidade na alimentação e na recreação. O alimento deve ser não-excitante, nutritivo e facilmente digerível. A glutonice deve ser evitada. O propósito de comer não é o de agradar o paladar, mas sim o de manter o corpo saudável e apto ao trabalho. O respirar ar puro e alguns exercícios leves são benéficos. Trabalho de espécie alguma - para não mencionar um grande trabalho - poderá ser feito por pessoas doentes, inválidas, fracas, sonolentas, preguiçosas ou libertinas. 4- Deve-se evitar: más companhias, conversas malévolas, críticas maledicentes sobre terceiros e perda de tempo em atividades tolas. Convém buscar-se a companhia dos santos, estudar as Escrituras, cultivar bons pensamentos e discriminar entre o real e o irreal. 5- Mantenha sempre a visão voltada para o objetivo e o ideal da vida e se dedique de corpo, mente e alma à realização desse ideal, prosseguindo com paciência e perseverança infinitas nas suas práticas espirituais. Nunca permita que a  lassidão e o desespero lhe assaltem a mente, pois adorando a Deus com todo o coração, reconhecendo ser Ele o único Bem-Amado e o seu “Tudo em tudo” sem dar importância à felicidade e conforto pessoais e sem buscar o fruto do seu karma, gozará da suprema paz e bem-aventurança.

 

172- A vida inteira de um aspirante da verdade é de contínuo esforço espiritual, não bastando praticar japa e meditação por uma ou duas horas determinadas para depois permanecer o resto do tempo absorvido em interesses mundanos e sórdidos, pois assim jamais construirá uma vida espiritual. Somente quando a espiritualidade floresce em cada pensamento, ação e circunstâncias da vida, tornando-se parte da própria criatura é que esta poderá ser considerada como verdadeiramente espiritual. Trabalhe com suas mãos, fale sobre trabalhos e negócios, porém mantenha a mente fixa em Deus, sabendo que só o viver em Deus é a única finalidade para a qual se vem ao mundo, o único objetivo que torna a vida digna de ser vivida. Humildade, desapego, inegoismo e conhecimento de que Deus é a única realidade ou verdade são os meios de se atingir esse estado. É difícil, sem dúvida, mas isso virá com repetida e longa prática. Sri Ramakrishna costumava ilustrar esse fato com a sua parábola da camponesa que debulhava arroz e amamentava o filho enquanto calculava as dívidas atrasadas, acertava contas ou estipulava preços para os fregueses, embora todo o tempo estivesse com a mente atenta ao pilão para que ele não lhe machucasse as mãos.

 

173- Inicialmente, japa e meditação devem ser praticados dentro de uma rotina. A mente é por natureza avessa a todo esforço e trabalho e, com freqüência, procura motivos para ludibriá-lo e evita-los, desviando-se noutras direções, em vez de executar a tarefa para a qual é designada; se não for mantida ocupada, ela o levará a todo tipo de pensamentos tolos e perniciosos. Por isso é acertadamente dito que “a mente vadia é a oficina do diabo”. A fim de mantê-la sob controle, é preciso submetê-la a uma série de regras severas e rígidas. Após deliberação apropriada, determine uma rotina diária tal que a possa observar e praticar, resolvendo firmemente que, seja qual for a situação em que se encontrar ou o trabalho que o chamar, jamais deixará de segui-la. Tal determinação e firmeza são essenciais ao progresso espiritual: meditação e práticas espirituais, estudo, trabalho, exercício, refeição, recreação, sono e mesmo o esporte, entretenimento e diversão- todo tipo de atividade salutar deve ter um tempo determinado. Se você passar os dias de maneira desordenada, a vida lhe será vã. Após estabelecer rotina, deverá advertir a mente com severidade: “- escuta, senhora, quer gostes ou não, terás que observar essas regras!” Por algum tempo ela se mostrará teimosa e obstinada, resistirá às tentativas de induzi-la ao trabalho, correndo em diferentes direções, porém você nunca deverá desistir do esforço de trazê-la de volta, fazendo-a trabalhar, levando-a com suavidade, ao mesmo tempo em que procura conquistá-la. Além disso, mantenha-se vigilante, observando se o trabalho está sendo feito de modo correto. Domar a mente é como domar um animal selvagem: requer paciência, força de vontade e perseverança infinitas. Mas, quando ela enfim descobrir que não há jeito de escapar, cessará com as brincadeiras e, estando sob seu controle, obedecer-lhe-á passivamente. Isso se chama abhyasa yoga, a senda da prática repetida. Saiba que não há outra maneira, além desta,  de trazer a mente sob controle.

 

174- Se puder seguir continuamente este yoga de prática por três ou quatro anos, tal como se estivesse tomando remédio por mais duro, seco, insípido e desagradável que seja, verá que esta prática de meditação e disciplina espiritual se tornará doce e revigorante  como néctar, transbordante da mais pura bem-aventurança. Que fadiga terrível os estudantes suportam ao se manterem despertos a noite toda, sacrificando impensadamente o corpo e arruinando a saúde, para passar nos exames escolares! Pairando sobre tudo isso, há preocupação, ansiedade e medo constantes: é como atravessar uma crise, como se a vida e a morte estivessem em jogo, no sucesso dos exames. E qual a finalidade disso tudo? Não é uma perspectiva incerta de assegurar um bom emprego, ganhar dinheiro, conseguir nome, fama e outras coisas do mesmo estilo, objetivando viver feliz e confortavelmente? A luta pela realização de Deus é certamente mais fácil do que tudo isso, pois, pelo menos não é necessário estar angustiado e temeroso quanto ao resultado final que já está totalmente assegurado. Se nos esforçarmos assídua e tenazmente para realizar Deus, renunciando a qualquer outro trabalho, fazendo o voto inexorável: “ou a realização do objetivo ou a destruição do corpo”, então o Senhor, indubitavelmente revelar-se-á e concederá ao devoto tesouros tão inestimáveis que todas as fortunas, riquezas e prazeres do mundo tornar-se-ão insignificantes em comparação. Atravessada a barreira da morte, você permanecerá herdeiro da imortalidade.

 

175- Maharaj (Swami Brahmananda) costumava dizer: “quando um discípulo meu, pouco tempo após a iniciação, vem a mim e diz: - Senhor, tenho praticado japa e meditação todos os dias, mas até agora nada consegui; não posso controlar minha mente e não alcanço paz nem alegria”, eu não respondo nessa ocasião, como se suas palavras não tivessem chegado aos meus ouvidos. Dois ou três anos mais tarde, ele mesmo diz: - após tanto tempo, parece agora que estou conseguindo algum progresso. Sinto algo como alegria e paz. Então, eu lhe digo: - continue praticando firmemente as orações e disciplinas espirituais de todo o coração, continue assim durante dois ou três anos e aí experimentará a felicidade. Você quer ser um homem realizado pelo simples pedir, como se isso fosse uma brincadeira, sem nada fazer por você mesmo! Isso não é uma loucura?”

 

176- Até mesmo Sri Sarada Devi (a Santa Mãe) era demasiado perturbada pelas insensatas reclamações de seus discípulos. Ela dizia: “ - quão maravilhosos eram os discípulos no tempo de Sri Ramakrishna! Os que vêm agora, dizem somente: - Mãe, mostra-nos o Senhor! Mostra-nos o Mestre! Por que não temos Sua visão? Tu podes fazer isso por nós, se assim o quiseres!” Quantos de nossos veneráveis Yogues e Rishis da antigüidade falharam em encontrá-Lo, mesmo após praticarem austeridades severas, durante muitíssimo tempo! Entretanto, estes querem realizar tudo num só momento, sem ao menos praticar austeridade, auto-controle e disciplina espiritual! E ainda dizem: “- mostre-nos o Senhor agora mesmo!” Quem sabe quais obras maléficas cometeram em vidas passadas! Como podem esperar por algo mais elevado, antes de terem gradualmente extirpado as más tendências? Se a realização não for possível nesta vida, poderá ser conseguida na próxima ou até mesmo na outra. Mas ela virá, se houver trabalho e esforço para isso. É tão fácil a realização de Deus? Somente agora, com o advento de Thakur (Sri Ramakrishna), a senda mostrada por Ele tornou-se mais fácil. Isso é tudo. Todos vivem uma vida mundana, geram filhos a cada ano que passa e, mesmo assim vêm e dizem: “- por que não tenho a visão do Divino Mestre?” As mulheres costumavam ir a Thakur e perguntar: “- por que nossa mente não se dirige a Deus? Por que ela não se firma?” e assim por diante. O Mestre lhes respondia: “- ah! Como poderia isso acontecer agora? Ainda há o cheiro de recém-nascido ao redor de vocês. Antes de tudo é necessário que isso desapareça; virá com o passar do tempo. Nesta vida é suficiente terem chegado a mim. Desse modo, na próxima, a senda espiritual será de fácil acesso para vocês”.

Pode-se ter uma visão Dele em sonhos, talvez. Mas vê-Lo realmente ou mostrar-se Ele a um devoto em forma corpórea, a quantos isso acontece? Deveras, é uma felicidade muito rara.

 

177- Sri Ramakrishna costumava dizer: “Eu fiz dezesseis annas *; será suficiente se vocês fizerem somente uma”. Realmente, está além dos poderes de um simples mortal executar a centésima parte das rigorosas austeridades sobre-humanas que levam à realização de Deus tais quais Sri Ramakrishna efetuou. No entanto é necessário fazer pelo menos uma anna como ele recomenda, mas unicamente quando se tenta executar por completo as dezesseis partes é que se pode, provavelmente, obter sucesso na execução duma só parte. Se você adiantar um passo em direção a Deus, Ele se aproximará dez, em sua direção. O resto, Ele faz com que o devoto consiga com o Seu auxílio. Essa é a graça, Sua misericórdia.

 

* Uma rúpia, comparada com a completa execução da sadhana; uma anna vale a décima parte da rúpia.

 

178- Não há dúvida de que ahimsa (não-violência) seja a suprema virtude. Porém, professá-la meramente da boca para fora é mais que inútil. Por exemplo: deixar de matar os animais, apenas se abstendo de comer carne ou peixe não é ahimsa. A verdadeira “não-violência” só pode ser praticada quando Deus é visto em todos os seres ou seja, quando o Ser é realizado. A própria natureza da existência envolve sempre, consciente ou inconscientemente, a destruição ou danificação de inumeráveis seres, visíveis e invisíveis. Os yogues praticam austeridades, vivendo apenas de leite, por ele ser um alimento puramente sátvico. Mas, para a obtenção desse leite foi necessário privar o bezerro de uma parte de seu alimento natural. Não é isso um ato de violência ou crueldade? Pois quanto mais se puder viver sem ferir ou prejudicar terceiros, melhor será. Entretanto, pela prática constante da verdadeira não-violência, pode-se despertar o amor por todos os seres. O pequeno ego ou egoísmo desaparece, extinguindo-se a distinção entre amigo e inimigo; em conseqüência, o coração se purificará e, no coração puro, Deus se refletirá totalmente.

 

179- Dizia Sri Ramakrishna: “- vocês podem meditar num canto, na floresta ou na mente”. Isso ajuda a mente a se concentrar facilmente. Num canto, significa num lugar recluso e privado, pois as práticas espirituais devem ser feitas na privacidade, se efetuadas em público ou com o conhecimento de muitas pessoas, surgirão muitos obstáculos e perturbações. Os sentimentos mais íntimos e a prática espiritual devem ser mantidos em segredo, a demonstração pública de tais sentimentos os destroem antes mesmo deles se enraizarem. Quanto mais secretamente mantiver seus sentimentos espirituais e sua devoção, mais eles crescerão e se intensificarão. Por isso, o sadhaka sátvico pratica japa e meditação sozinho na escuridão ou na calada da noite, na cama dentro do mosquiteiro, a fim de que ninguém possa tomar conhecimento disso.

 

180- “Na floresta” significa num local solitário, longe dos ruídos dos homens e das cidades, como por exemplo nos Himalaias, à margem dos rios sagrados como o Ganges ou na atmosfera pura em meio às belezas naturais. Os yogues escolhem esses tipos de lugar, favoráveis às práticas espirituais, onde não corre o menor risco de tentações como “sexo e ouro”. Mas, se no retiro da floresta, a mente continua repleta de assuntos mundanos, a floresta deixará de ser uma floresta; seria o mesmo que levar o mundo todo consigo. Mas se a mente puder ser pacificada e orientada numa só direção, nada do exterior lhe poderá perturbar o equilíbrio e então, este mercado do mundo se tornará uma floresta para o yogue, que sentirá a quietude da mesma, estando imerso no ruído do mercado.

 

181- Meditação na mente é o essencial. Onde quer que medite, coloque o Ideal Escolhido no recesso mais íntimo do seu coração e, reprimindo os sentidos, aplique toda a energia em concentrar a mente ou a consciência do ego em Deus. Esta prática ininterrupta desperta um tremendo poder anímico interno, através do qual a real natureza de Deus pode ser realizada. Quanto mais a mente se disperse em diferentes direções, tanto mais perderá o seu poder potencial, tornando-se fraca e impotente, a ponto de não mais conseguir efetuar nenhum trabalho de vulto.

 

182- Medite na escuridão com os olhos fechados. Mantenha as janelas abertas para que o recinto não fique abafado. Vista uma roupa folgada. O Mestre instruiu alguns de seus discípulos sannyasins a meditarem desnudos, a fim de desenvolverem uma natureza infantil e um completo sentimento de liberdade.

 

183- Na hora da meditação, pode-se conceber o coração como o local onde o Ideal Escolhido está, em quaisquer das formas que melhor lhe agradarem: como o assento do coração, o lótus do coração, a caverna do coração, o templo do coração, o céu ou éter do coração, o vácuo do coração, o cofre ou estojo do coração, o centro do coração, a morada do coração, a cabana do coração, o caramanchão do coração ou o trono do coração. Ou seja, em tantas formas quanto a imaginação poética do aspirante possa conceber. O coração é o núcleo mais íntimo da consciência onde, em linguagem comum, o intenso sentimento de doçura do amante se faz sentir ao abraçar o Bem-Amado apaixonadamente. Quem não puder meditar, mantendo o Ideal Escolhido dentro do coração, pode, nos estágios preliminares, fazê-lo fixando a vista numa fotografia ou imagem à sua frente; mas isso é exterior.

 

184- As horas mais favoráveis à meditação são: l- A união do dia com a noite, isto é, durante a aurora e o crepúsculo; 2- O “momento de BRAHMAN” que corresponde à última parte da noite, uma hora antes do nascer do sol; 3- No silêncio da noite. Nestes momentos, a natureza está calma, pacífica e solene e, também nestas horas, o sushumna (nervo no interior da coluna vertebral) torna-se geralmente ativo e, em conseqüência disso, a respiração se efetua através de ambas as narinas. Em outras horas, um ou outro dos dois nervos- ida ou pingala - situados simultaneamente do lado esquerdo e direito ao longo do sushumna, estão em atividade e a respiração é feita através da narina direita ou da esquerda. Isso torna a mente inquieta. Por esse motivo, muitos yogues mantêm-se vigilantes à atividade do sushumna e, tão logo isso aconteça, sentam-se para meditar, deixando de lado todo o trabalho.

 

185- Há ocasiões em que o aspirante nota que a mente se torna fria e monótona, nenhuma idéia ou sentimento lhe dá ânimo, não há inclinação à prática de japa ou meditação ou, então, a mente mergulha em tendências e pensamentos inferiores, parecendo impossível detê-la, por maior que seja o esforço. Se ela continuar assim, o melhor remédio será a companhia dos santos, pois pelo contato com pessoas santas, vendo-as e tocando-as através do serviço pessoal a elas, seu espírito e seu estado divino são transmitidos ao coração do devoto, despertando inspiração e anelo espirituais, e assim a sujeira da mente é lavada, prosseguindo o devoto com novo entusiasmo. Se não houver oportunidade para o encontro da companhia de pessoas santas, o recurso será o estudo das Escrituras Sagradas, a conversação sobre assuntos elevados e sacros e a oração a Deus com o coração anelante. Uma firme resolução deve ser tomada, também, no sentido de exercitar a força de vontade e repetir Seu nome ou o mantra, quer se goste ou não; descobrir-se-á então que o demônio fugiu às pressas e a noite escura de tamas se desvaneceu.

 

186- Mantenha sempre a mente ocupada em alguma espécie de trabalho, nunca permitindo que ela fique na indolência; pois tão logo for deixada livre e indolente, ela o atormentará e o prejudicará. Em qualquer ocasião em que encontre a mente inquieta ou carregada de maus pensamentos ou descobrir que é incapaz de resistir a alguma tentação ou vencer a agitação mental a despeito do esforço que fizer, deixe o local onde estiver e fuja dessa atmosfera adversa que poderá degradá-lo. Também se sair e caminhar com vivacidade três ou quatro milhas ao ar livre do campo, a tendência inferior será dominada, pelo menos nesses momentos. Existem somente duas maneiras de se salvar da tentação - lutar ou fugir. Mas, não há modo de se fugir e se distanciar da mente: ou a mantemos sob controle ou nos curvamos às suas exigências.

 

187- Assim como o atrito faz surgir o fogo que se esconde na madeira, o movimento da colher faz aparecer a manteiga no leite, o moer do gergelim produz o óleo, a escavação faz brotar a água do subsolo, assim também o Ser Supremo, que se oculta na caverna do coração, manifesta-se ao jiva em Sua real natureza, como essência, pelas austeridades e concentração da mente, executadas com devoção de alma e coração.

 

188- No primeiro estágio da prática espiritual, a meditação e o japa devem ser aumentados lenta e gradualmente. Se, por exemplo, você dedica meia hora ou três quartos de hora hoje, faça uma hora, após alguns dias. Depois prossiga aumentando para uma hora e meia, duas horas, etc, em pequenos graus, de acordo com as possibilidades. Se, devido a um arroubo da mente para conseguir resultados rápidos, prosseguir a prática à força e, esforçar-se mais do que é capaz física e mentalmente, terá que sofrer depois as terríveis conseqüências da precipitação. A reação é tão terrível que é extremamente difícil suportá-la. Consequentemente, a debilidade nervosa ou a exaustão se acentuarão tanto que até a capacidade e a vontade de praticar japa e meditação desaparecerão e a cabeça ou o cérebro se sentirão vazios e não mais responderão aos estímulos. Tornar-se-á, então, necessário muito tempo e cuidado, exigindo muito esforço para reconquistar o estado anterior. Pois existe até a possibilidade do cérebro se descontrolar. Não é possível atingir o teto num só pulo; resultaria numa queda com fratura dos membros. Para se atingi-lo deve-se subir a escada degrau por degrau.

 

189- Aqueles que praticam japa, meditação e yoga com intensidade, desenvolvem um novo corpo sátvico, um sistema nervoso mais refinado e também centros nervosos sutis, capazes de suportar a força das idéias e emoções profundas e supra-sensórias.

 

190- Receber provisões ou tomar uma refeição completa num satra (casa de alimentação para mendigos) é proibido aos sannyasins. Os chefes de família que acumulam riquezas, geralmente pelo comércio, doam grandes somas de dinheiro aos satras, nas épocas das cerimônias de sharaddha, visando o bem-estar de seus ancestrais mortos, objetivando se redimirem das próprias faltas, acumularem punya (méritos religiosos) ou, também, com o desejo de ganharem objetos mundanos. Daí se origina a contaminação psíquica da comida dos satras, tornando a mente impura e degradada. Madhukari-bhikaha, isto é, mendigar comida nas casas de família, tal como as abelhas sugam o pólen de variadas flores, é o melhor para os sannyasins, pois a comida que se obtém dessa maneira é pura.

 

191- Os sannyasins que não praticam regularmente os devidos exercícios espirituais não têm o direito de aceitar dádivas dos chefes de família; isto seria enganá-los, além de se tornarem indignos dos votos sagrados de sannyasin. Os chefes de família servem os sannyasins para que os mesmos possam dedicar todo seu tempo às práticas espirituais sem se preocuparem com alimento, roupa e outras coisas necessárias à vida. Em virtude da ação meritória, naturalmente virão ter uma parcela dos frutos das práticas e méritos espirituais dos sannyasins. Por essa razão os sannyasins devem ter méritos suficientes para si, mesmo após a dedução da parte devida aos seus doadores e benfeitores. Caso contrário, se eles se degradarem, sofrerão muito moral e espiritualmente. Nem nesta vida nem na outra haverá fim à miséria daqueles que se degradam; permanecerão uns necessitados crônicos. Aí está porque os sannyasins com o espírito da verdadeira renúncia, bem como os brahmins ortodoxos e piedosos jamais aceitam presentes. Assim também fazia o pai de Sri Ramakrishna, jamais os aceitando. Além disso, a aceitação de presentes ou dádivas gera um sentimento de obrigação, cortando desta forma a liberdade.

 

192- Uma pessoa se faz bramachari ou sannyasin com o único propósito de realizar Deus nesta vida, após abandonar os deveres e responsabilidades para com seus pais e familiares. Isso faz com que a família do sannyasin participe dos méritos de suas práticas espirituais e, igualmente por isso se diz: “Santificado seja o ancestral e abençoada seja a mãe” de um homem de verdadeira renúncia. Esse fato por si só paga a dívida do filho para com os pais. Mas, se um sannyasin, após fazer seus pais chorarem por motivo de seu afastamento do convívio familiar, vier passar seus dias indolentemente ou em atividades inúteis e maus caminhos, perderá o Ideal e todos os seus atos meritórios serão lavados pelas lágrimas derramadas. A única expiação para esta queda é voltar à vida de chefe de família, cumprindo com retidão os seus deveres.

 

193- Somente a realização de Deus torna o reservatório da espiritualidade inesgotável, como o pote de leite do menino Gopal. O pote não se esvazia nem o leite nele diminui, por mais que o entornem. Conhece a história? Gopal, filho de uma pobre viúva brahmin, tinha que atravessar uma floresta sozinho para ir diariamente à escola da aldeia e isso o deixava muito nervoso. Quando ele contou o fato à mãe, ela disse: “-    ora, meu filho, por que sentes medo? Teu Madhusudan Dada (irmão mais velho, KRISHNA) vive na floresta; Ele virá tão logo O chames.” O garoto, simples como era, prontamente acreditou e, sempre que estava com medo, chamava: “- onde estás, Madhusudan Dada?” Imediatamente, uma criança de aparência encantadora, saía da floresta e dizia: “- aqui estou, meu irmão; de que tens medo?” e acompanhava Gopal pela floresta, falando e brincando com ele. Alguns dias se passaram desta maneira e o garoto estava muito feliz. Então, chegou a época da cerimônia de shraddha em memória da mãe do professor da escola que morrera e, nessa ocasião, foi solicitado aos alunos que trouxessem objetos como presentes. Assim, todos os estudantes de recurso levaram presentes em profusão ao professor; mas a mãe de Gopal não tinha o que mandar. Madhusudan Dada, percebendo que nesse dia Gopal ia à escola com fisionomia triste, perguntou-lhe a razão e, consolando-o, deu-lhe uma pequena vasilha de leite, dizendo: “- leva isto para o professor”. Mal tinha o menino dado a vasilha ao professor, este se enfurece, repreendendo o garoto severamente pela insignificância da dádiva. Mas todos ficaram maravilhados ao ver que, tão logo a vasilha se esvaziava, tornava a se encher. Então, o professor, ouvindo tudo de Gopal, foi com ele à floresta e lhe pediu que chamasse Madhusudan Dada a fim de poder vê-lo. Logo que Gopal O chamou, uma voz do céu foi ouvida: “- tu me vês porque tens uma fé simples, mas teu professor não está em condições de ver-Me porque sua mente ainda não é pura”.

 

194- Aquele que chama por Deus do íntimo de seu coração, com fé simples e que nada mais quer além Dele, encontrá-Lo-á e, encontrando-O, nada lhe resta para querer ou conseguir. Aquele que chama a Deus para lhe pedir felicidade aqui e no além ou que solicita a Ele objetos mundanos pode consegui-los, se Deus assim o desejar, mas não encontrará o próprio Deus.

 

195- A razão da queda dos bramacharis e sannyasins com relação ao seu Ideal chama-se “sexo e ouro”. Tão assustadora é a ilusão causada pela luxúria e pela riqueza que produz a queda até mesmo de grandes yogues e jnanis. Assim como uma árvore tenra é cercada para sua proteção, assim também prescrevem as Escrituras muitas regras rigorosas para a proteção dos bramacharis e sannyasins. Dizia Tulsidas: “- onde há luxúria não há RAMA” e,  Kabir afirmou que o yogue que tem relações sexuais com mulheres é um hipócrita e falso. Sri Ramakrishna costumava proibir seus jovens discípulos de se associarem com mulheres, até mesmo com as devotas. Ele costumava dizer: “- não se ligue a uma devota, mesmo que ela derrame um rio de lágrimas ante o nome do Senhor, pois sua mente pode ser pura, mas mesmo assim, pensamentos impuros podem surgir em sua mente”. Realmente, verificou-se que alguns jovens promissores escorregaram e caíram por não terem observado o conselho do Mestre, mesmo após terem alcançado anteriormente altos estados espirituais.

 

196- As observações da Santa Mãe sobre o assunto são ainda mais severas e surpreendentes. Ela disse a uma jovem viúva iniciada por Ela: “- minha filha, jamais confie no sexo oposto. Para não falar de outros, não confie sequer em seu pai ou irmão, nem mesmo no próprio Deus se Ele lhe surgir em forma de homem.” A idéia é que, enquanto houver o sentimento de identificação com o corpo, haverá também luxúria e, consequentemente, haverá perigo. Enquanto a mente for imatura, haverá sempre a possibilidade de ser levada pela tentação. Deve-se portanto, fazer todo o esforço possível a fim de se manter afastado da mesma; caso contrário, o perigo será inevitável.

 

197- Para o aspirante, não há inimigo tão terrível e difícil de se conquistar quanto a luxúria. Não se escapa de suas garras sem se esforçar incessantemente até a morte. É como dizia Ravana: “- que inimigo é esse RAMA! Não morre nem mesmo após ser seguidamente morto!” Nossos Puranas contêm muitas histórias sobre grandes Yogues e Rishis que, após praticarem severas austeridades durante centenas de anos, caíram da brahmacharya, sucumbindo aos encantos das mulheres. Assim, as Escrituras ordenam aos sannyasins e bramacharis que não tenham relações íntimas com mulheres; que não olhem sequer suas faces, lhes falem de modo incontrolado ou brinquem com elas em segredo. São instruídos até mesmo a não olhar para os quadros de mulheres que possam despertar maus impulsos à mente imatura, criando más tendências que atuam de maneira sutil. Regras estritas como essas não são, porém, para uma pessoa comum, mas somente para os sannyasins e bramacharis que, renunciando a tudo, buscam realizar a Deus nesta mesma vida pela prática do yoga e de austeridades severas; eles pertencem a uma categoria diferente.

 

198- Por esta razão, o aspirante religioso deve evitar a mistura livre e promíscua com o sexo oposto, como se isto fosse veneno. Todas as organizações e instituições religiosas, antigas ou modernas, onde esta regra foi violada, se degradaram e decaíram. Exemplos disso são encontrados nas seitas budistas, tântricas e vaishnavas na Índia e nas Ordens Católicas Apostólicas Romanas do Ocidente, na Idade Média. Quando um mosteiro para bhikshunis (monjas) foi fundado no templo de Buddha, ressaltou Ele: “- a semente da destruição do budismo foi plantada agora!” O grande Mestre do Divino Amor, Sri Chaitanya, a despeito de sua misericórdia ilimitada, abandonou seu bem-amado discípulo monástico, o jovem Haridas, pela simples razão dele ter aceitado esmolas das mãos de uma eminente senhora devota de Seu Mestre. Que severa lição para instrução da humanidade!

 

199- A única maneira de se extinguir a luxúria da mente é o homem olhar para a mulher como se fosse sua mãe e a mulher ver o homem como se fosse seu filho. Se esta atitude mental não for cultivada, existirá sempre a possibilidade de uma queda. A não ser que a luxúria seja controlada e o bramacharya estritamente observado, a mente jamais se tornará serena: não se alcançarão a firmeza e a meditação perfeita numa única direção e o raganuga-bhakti (supremo amor a Deus), diferente da devoção formal, não será adquirido.

 

200- A mente imatura é muito enganadora. É muito difícil compreender quando e como, num momento inesperado, ela possa inconscientemente desviar o aspirante do caminho e prendê-lo às teias de Maya. A natureza da mente imatura é buscar os prazeres do corpo e dos sentidos, estar presa  por Maya ou apego à esposa, filhos e família, pensando que são seus e considerar a prole, a riqueza, a fama, a posição social e o poder como os únicos objetivos desejáveis na vida. A mente não se tornará lúcida, mesmo após sofrer repetidamente na busca do prazer e receber golpes e desilusões a cada passo. O homem imaturo, mesmo vendo, dia após dia, que se morre em todas as partes, não raciocina que ele próprio terá que partir a qualquer momento, deixando tudo que tem para trás; quer assegurar os fins a que se propôs, com engenhosidade, por quaisquer meios, sem se importar se suas ações - possam causar sofrimentos ou perdas a outrem. Sua própria e única felicidade é tudo que busca e com que se importa, pois todo o seu interesse está centralizado neste mundo.

 

201- A mente imatura é como o minério bruto, cheio de escória e impurezas de toda espécie. Se o material bruto original for lavado e submetido a processos químicos adequados, pode converter-se em ouro puro ou em outras coisas muito mais valiosas que o ouro, que ajudarão e servirão ao homem de muitas maneiras. Similarmente, a mente imatura pode se purificar,  se for lavada com a água de viveka, isto é, com a discriminação entre o real e o irreal; se os desejos pelos objetos mundanos forem queimados pelo fogo da renúncia e do amor a Deus e se a mente for purificada pelas práticas da disciplina espiritual ensinadas pelo Guru para a realização da mais alta verdade. Então, a mente imatura tornar-se-á madura e o Senhor Supremo, eternamente Existência-Pura, Consciência-Pura e Bem-Aventurança-Pura, nela se manifestará.

 

202- A mente é como uma fruta. Uma fruta verde tem sabor azedo, adstringente ou insípido e fará mal se for comida; mas, quando madura, quão doce e benéfica é; pode, então, ser oferecida a Deus em adoração. O mesmo acontece com a mente.

 

203- a mente impura pode ser sátvica, rajásica ou tamásica. Aqueles de mente sátvica são religiosos por natureza. Têm  desejo aguçado de realizar a Deus, de seguir o caminho da virtude e fazer bem aos outros. Eles também se esforçam para adquirir essas qualidades, mas por várias razões, como infelicidade, incapacidade física,  pensamento de fraqueza ou incompetência, não avançam muito e facilmente perdem o ânimo. Aqueles de mente rajásica vivem assoberbados com o mundo e com as aspirações mundanas, não se preocupam muito com a religião ou fingem ser religiosos ou, quando muito, tentam conciliar o máximo esses dois mundos. Aqueles que possuem tamas são na maioria de má índole, tendo como seu único pensamento e objetivo ferir, prejudicar e arruinar os outros. São pecadores ambiciosos e ligados à luxúria.

 

204- Pessoas de mente imatura que se dedicam a fazer o bem ao seu país ou ao mundo, que fundam instituições para propósitos afins, no final das contas fazem mais mal do que bem ao mundo, a despeito dos seus altos objetivos, pois, não conseguindo permanecer por muito tempo fiéis aos seus elevados ideais, em meio aos vários golpes e contra-golpes do mundo, sucumbem às tentações, apesar das árduas lutas. Os desejos de nome, posição, fama e poder crescerão intensamente neles, enquanto que a estreiteza mental, o egoísmo, o ciúme e o ódio os prenderão de tal forma que todo seu trabalho redundará em nada. E não é só isso, pois infectando a sociedade com o próprio veneno, corrompem até mesmo às pessoas bem intencionadas, levantando a desconfiança e a suspeita na mente das pessoas em relação a todos os trabalhos filantrópicos, instituições e corporações religiosas, até mesmo contra a própria religião.

 

205- No princípio, havia BRAHMAN sem segundo, a Existência-Pura imersa em Sua própria glória. Ele estava só, nada mais existia. Tudo estava bem. Então, num momento inesperado, Ele desejou: “- eu serei muitos” e daí surgiu toda a criação com suas miríades de mundos! E até mesmo Ele teve de praticar austeridades e meditação para que Seu plano se cumprisse. Tendo criado o universo com todos os objetos móveis e imóveis, animados e inanimados, Ele próprio submergiu-Se neles, concedendo somente ao homem a faculdade de raciocínio. E continua a narração: “- e nessa condição, BRAHMAN chora, preso nas malhas dos cinco elementos”.

Agora, muitos dos pseudo-sábios se consideram pessoalmente livres de todas as obrigações, transferindo a responsabilidade de suas faltas e erros, dificuldades, maus hábitos, fraquezas, estupidez e tudo mais para os ombros de BRAHMAN ! Se não são bem sucedidos em qualquer trabalho pelos próprios enganos ou falta de esforço, dizem: “- não era de Sua Vontade!” E se falham em executar algo a que tinham inclinação, simplesmente dizem: “- aconteceu assim por Sua Vontade!” Como se soubessem tudo quanto o Senhor quer e não quer! Se assim fosse, eles não deveriam ser pessoas comuns, pois conhecem até mesmo a mente do Ser Onisciente! Declaram também, com mostras de autoridade: “- é da vontade de Deus que cada um case e viva uma vida mundana, pois se todos se dedicassem às ordens sagradas, como poderia a criação ser preservada? Como se eles estivessem passando noites inteiras sem dormir, temendo a terrível catástrofe da dissolução do mundo! Como se todas as pessoas do mundo estivessem morrendo de vontade de se tornarem monges!

 

206- Na conversação normal usamos freqüentemente expressões como: “é a vontade de Deus” ou invocamos a Deus para nos ajudar, prestar testemunho ou juramos pelo nome de Deus ou pelo dharma. Essas são palavras vãs sem nenhum significado. É como o “palavra de honra!” das crianças ou como as expressões inglesas: “por Júpiter!”, “graças a Deus!”, “meu Deus!”, “só Deus sabe!” Somente quem se entregou completamente a Deus, que realizou a verdade: “- eu sou a máquina, Ele é o Mecânico”, que não faz distinção entre bem e mal, que não tem desejo nem aversão por qualquer coisa que seja e que permanece o mesmo diante, do elogio e do vitupério, ganhando ou perdendo, no prazer ou na dor, somente esse  sente realmente a vontade divina e está capacitado a falar desse modo.

 

207- De acordo com os Vedas, BRAHMAN que é o Todo, é o Todo para sempre; Ele não aumenta nem diminui, não Se eleva nem decai. Se o Todo fosse subtraído do Todo, ainda permaneceria o próprio Todo; mesmo que o Todo fosse adicionado ao Todo, a soma seria o Todo. E isso é dito somente de BRAHMAN, que é o Todo, o Infinito Ser Supremo. A plenitude é conseguida somente na troca de si mesmo pelo próprio Todo. Para realizar o Supremo Senhor, o Todo por natureza, o Absoluto, deve-se dedicar à tarefa com total capacidade de corpo, coração, mente e alma e se esforçar para se perder Nele. Somente assim o objetivo almejado será atingido.

 

208- Nem todos têm a mesma força e habilidade. Para um jovem determinado e talentoso que rompeu todos os laços com o mundo e pratica exercícios de yoga dia e noite, em solidão, com o intuito de controlar a mente e deter as modificações mentais, que passa com uma única refeição diária, mendigando-a ou vive somente de raízes e frutas, a realização de Deus ou o samadhi podem ser facilmente obtidos. Mas existem aqueles que a despeito de todo o seu intenso anelo pela realização encontram-se sempre em situações extremamente desfavoráveis. Permanecem presos ao mundo, servindo pais idosos e desamparados ou ocupados em trabalhos pesados para manter mulher e filhos; há ainda os devotos confinados ao leito com doenças incuráveis, com os corpos e mentes em estado de completa exaustão, incapazes de executar exercícios espirituais de maneira apropriada. Não haverá esperança de salvação para eles? Continuarão a ser levados de roldão por toda a eternidade, no tumultuado mar de causa e efeito, como um pequeno barco apanhado pela tormenta? Não terão esperança de libertação? Serão impiedosamente esmagados como vermes e insetos, pelos resultados de seus karmas passados, sob a roda inexorável de causa e efeito? Não, isto não acontecerá nunca no reino de um Deus misericordioso. Seus gritos que cortam o coração certamente Lhe alcançarão os ouvidos e seguramente ouvirão dentro de seus corações a serena voz da esperança e do consolo.

 

209- Tudo resulta do trabalho da mente, tudo depende apenas da mente. A liberdade ou a escravidão nela se encontram. Conforme a tendência da mente, assim será o seu movimento para agir. Se o yogue em questão for atraído com o passar do tempo pelos prazeres mundanos, nome e fama, sob a influência de desejos ocultos do subconsciente, então, a despeito da prática de severas austeridades e das circunstâncias favoráveis, todas as suas disciplinas espirituais serão infrutíferas, tal como derramar manteiga derretida sobre as cinzas. Mas se um indivíduo atormentado pela tríplice miséria (material, mental e providencial) realizar no íntimo do seu ser que o mundo é irreal e consequentemente evitar as paixões e apegos, entregando-se a Deus de corpo e alma, nesse caso Ele o libertará do ciclo de nascimentos e mortes, - causa de toda a miséria.

 

210- Seja você um sannyasin ou um chefe de família, dedique o máximo de seus esforços na linha em que se encontra, construa toda sua vida em harmonia com seu caminho espiritual, pois engana-se aquele que pratica falsidades. Fazendo um balanço, parece que Deus se mostra um tanto mais favorável aos devotos chefes de família que aos sannyasins; os últimos renunciaram a tudo com o único propósito de realizar Deus; realmente será um grande pecado se falharem nessa tarefa. Mas os devotos chefes de família, firmes e piedosos, sempre O recordam e oram, rogando Sua graça, mesmo suportando penosos fardos ao longo da áspera estrada do mundo. Além do mais, eles respeitam, honram e servem aos sannyasins e devotos de Deus, praticando atos meritórios, tais como dar esmolas, fundar pousadas para peregrinos e instituições de caridade.

 

211- A realização de Deus nesta vida não é para todos. Aqueles que vêm praticando austeridades e disciplinas espirituais vida após vida para realizar a Deus e que têm apenas um pequeno karma para ser trabalhado nascem dotados de boas tendências e aspirações através de méritos adquiridos em vidas anteriores. Assim, quando na presente existência encontram circunstâncias favoráveis ao esforço, terminam facilmente o restante, submergindo-se no supremo estado, além dos nascimentos e mortes.

 

212- Não há nenhum tipo de trabalho que não produza resultado, seja desperdiçado ou mesmo perdido. O trabalho inevitavelmente dará seus frutos, cedo ou tarde, e por este motivo, tudo que é bom deve ser praticado por todos os meios possíveis; tal ação converter-se-á num capital do qual o débito das más ações e do grande número de pecados serão resgatados.

 

213- O fruto das boas obras é inextinguível, pois quanto mais se acumulam, mais auxiliam a pessoa nesta vida e na próxima, nas privações, dores e perigos, nas lutas e tentações, no medo, desespero e nas trevas. As outras posses são temporárias. Sua aquisição, preservação e perda causam sofrimentos, não se podendo levá-las consigo após a morte. E não somente isso, pois os desejos insatisfeitos e reprimidos seguem a pessoa na próxima vida sob forma de samskaras, dando origem a misérias infindas, atando-a fortemente a novos trabalhos e seus frutos, aumentando cada vez mais as cadeias que a prendem.

 

214- Sri Ramakrishna costumava dizer que a alma individual aprisionada ao mundo é como o betel verde ou mesmo o côco verde cuja semente cresce tão depressa dentro da dura casca que parece estar unida a ela sem poder se separar, mas quando amadurece e seca, separa-se dela facilmente. Do mesmo modo, enquanto houver identificação com o corpo, enquanto a pessoa se sentir feliz ou infeliz devido à felicidade ou dor do corpo, tanto mais permanecerá presa à Maya, sofrendo incessantemente sua tríplice miséria. O jiva só se liberta quando, pela graça de Deus, compreende que o Ser está separado do corpo, dos sentidos e dos órgãos internos. É pela prática do yoga, do conhecimento, da devoção e do trabalho que o Ser se realiza como Eternamente-Puro, Eternamente-Iluminado e Eternamente-Livre por natureza, sendo a Realidade-Absoluta.

 

215- A mente pode ser purificada e o auto-conhecimento pode ser atingido através do karma yoga. Todos nós trabalhamos, mas não praticamos karma yoga. Esse é o motivo de estarmos presos ao trabalho e sofrermos. A respeito do karma yoga, o Divino Senhor KRISHNA diz no Gita que temos direito ao trabalho, mas não a seus frutos. Diz também : “- infelizes daqueles que trabalham em busca de resultados”, demostrando que aqueles cujo incentivo ao trabalho é conseguir certos objetivos pessoais são criaturas de mente estreita, que pertencem a uma classe inferior. Trabalhe, mas o que fizer, faça sem apego, sem egoísmo; trabalhe pelo próprio trabalho, sem esperar recompensa. Assim, você será liberado de todo encadeamento, terá cumprido todo seu dever e alcançado a finalidade da vida, sendo abençoado com a realização da Suprema Bem-Aventurança que está além da felicidade e do sofrimento.

 

216- Muitos acham incompreensível sentir inclinação para o trabalho sem desejo de recompensa. Como é possível nos devotarmos ao trabalho, dedicando-lhe toda nossa mente e energia e para que trabalhar, se isso não nos traz nenhum proveito? É um grande engano pensar assim. De fato, os homens trabalham para alcançar a felicidade; mas quanta felicidade ou de que espécie conseguimos, procedendo desse modo? Nove décimos são de sofrimento e um décimo ou talvez menos, seja de felicidade; e mesmo esse pouco se adultera e desvanece com o sofrimento. Além disso, por motivos egoístas priva-se a terceiros do que lhes pertence, causando-lhes danos e sofrimentos. Por outro lado, toda felicidade permanente neste mundo só é conseguida pelos que trabalham sem apego e sem egoísmo, por aqueles que não se sentem como autores da ação. Quantos karma yogues verdadeiramente inegoístas e incansáveis como o Senhor KRISHNA, Buddha, Jesus Cristo, Sri Chaitanya e nos tempos modernos, Sri Ramakrishna e Swami Vivekananda podem ser encontrados nos anais da história? Verdadeiramente muito poucos! Unicamente eles são os Homens ideais que, desde tempos remotos, possibilitaram a inúmeros homens e mulheres levarem nos ombros o insuportável fardo da vida e que instilaram paz e esperança nos corações de milhares de almas enlameadas de pecado e envoltas na escuridão da ignorância, afligidas pela tríplice miséria. Inspiradas por seus ideais e preceitos, milhões de pessoas desprezaram a vida, renunciando a ela pelo bem dos demais e  como recompensa receberam a vida eterna.

 

217- O desapego aos objetos mundanos, a serenidade de espírito e o amor para todos os seres são os grandes fundamentos, os princípios básicos de toda a religião. Quem possui estas virtudes não está escravizado ao corpo e aos sentidos, não tem desejo de nome, fama ou amor ao poder, não tem a idéia egoísta de “eu e meu” e nenhum sentimento de distinção entre os próprios parentes e as demais pessoas; vê todos os seres viventes: ricos ou pobres, brahmins ou párias, virtuosos ou viciados, amigos ou inimigos, animais, pássaros e insetos - num mesmo plano. Permanece impassível, sem mostrar orgulho ou depressão perante o louvor ou a infâmia, ganho ou perda, vitória ou derrota, prazer ou dor. Mesmo atuando, ele não atua; mesmo sem atuar, ele atua. Este é na verdade o karma yogue ideal.

 

218- O objetivo de pranayama é controlar o prana ou força vital que funciona em nosso corpo, manifestando-se através da respiração (inalação e exalação). Se essa respiração puder fluir ritmicamente, a inquietude natural da mente se abrandará e ela permanecerá tranqüila, pois habitualmente está dirigida a vários objetos, dispersando seus poderes. Se todas essas forças separadas pudessem ser concentradas num único objeto, ela adquiriria um poder infinito. De acordo com as Escrituras de Yoga, nada há no universo que nossa mente não possa alcançar e realizar. Se no reino espiritual esse poder concentrado for dirigido pela meditação à real natureza do Ser Supremo, o jiva submergir-se-á no Supremo BRAHMAN em nirvikalpa samadhi, o mais elevado estado superconsciente. E se a mente se absorver por completo na contemplação do Deus com forma no lótus do coração, será abençoada com a visão direta do Ideal Escolhido, isto é, realizará Deus. Além disso, se for aplicada aos fenômenos naturais ou sobrenaturais, verdades maravilhosas e sutis concernentes a esses fenômenos serão descobertas e os oito siddhis - faculdades sobre-humanas ou poderes ocultos – serão adquiridos.

 

219- Os oito siddhis são: 1- animâ: poder de se tornar tão pequeno quanto um átomo; 2- laghimâ: poder de adquirir a leveza que se desejar; 3- vyâpti: poder de tudo abarcar; 4- prâkâmya: vontade irresistível; 5- mahimâ: poder de aumentar de tamanho; 6- ishttva: soberania; 7- vashitva: poder de subjugar outrem à própria vontade; 8- kamâvasâyitâ: capacidade de agir ou de conseguir os objetos que se desejar.

 

220- Estes poderes ocultos, os oito siddhis, são terríveis tentações e tremendos obstáculos na trilha da realização de nirvikalpa ou savikalpa samadhi, os mais elevados estados atingíveis pela prática de yoga. Se o sadakha ou aspirante sucumbir à tentação de adquirir estes poderes não só se desviará da senda do yoga, arrastado pelos desejos, como também se degradará pelo seu mau uso, caindo nos prazeres carnais e, pior que tudo, arruinará muitas almas inocentes a fim de conseguir seus próprios e egoístas objetivos. Consequentemente, atrairá para si a própria queda e esses poderes por si mesmos se anularão.

 

221- A prática exclusiva de yoga é extremamente difícil, não servindo para a pessoa comum. É quase totalmente impraticável nos tempos modernos observar com rigor as regras necessárias, isto é: comida sátvica e leve, tal como raízes, frutas e leite; exercícios e repouso moderados; local solitário, para se viver com bastante ar puro; vida isenta de preocupações, regularidade em tudo e principalmente a mais estrita e rigorosa continência e domínio dos sentidos; viver em companhia do Guru, que deve ser um adepto de yoga. É extremamente difícil ser bem sucedido se quaisquer dessas condições forem violadas. Além disso, se houver alguma falha ou erro na observância do processo prescrito pelo Guru ou se a yoga for praticada de acordo com as próprias idéias ou pela leitura de livros, ocorrerá a possibilidade de se contrair algum distúrbio do coração, alguma doença nervosa incurável e até mesmo há o perigo de desequilíbrio mental ou loucura.

 

222- Quando e por que a respiração - inalação e exalação- se torna desigual, ou seja, muito lenta ou muito rápida? Sempre que estejamos sobrecarregados de paixões tais como a ira, luxúria, etc; quando ficamos atordoados por correr atrás de distrações e divertimentos na esperança de obter prazeres fáceis; quando perdemos o auto-controle e ficamos irados, se alguém nos impede de atingir o objetivo desejado ou mergulhamos no desespero se falhamos em determinado empreendimento; quando nos enchemos de orgulho pelo nosso sucesso, quando perdemos todo o bom censo devido às paixões ou ficamos invejosos dos bens alheios; quando o coração nos amedronta ante o perigo iminente ou é preso de angústia ante a aproximação de alguma calamidade; quando desanimamos, preocupados com a privação e a manutenção e segurança da mulher e filhos ou nos tornamos inquietos e torturados pela doença; quando vemos trevas em toda a parte, devido à tristeza causada pela perda de nossos entes queridos ou enlouquecidos ante a perda das propriedades e bens materiais. É nesse momento que a mente involuntariamente entra num terrível estado de agitação, modificando o ritmo respiratório, fazendo  o coração bater em descompasso ou diminuindo sua pulsação como se fosse parar. Esta agitação terrível da mente atua também no prana (força vital), perturbando a circulação sangüínea. Se a causa disso tudo não for removida com a prática do desapego e cultivo da serenidade ante os objetos mundanos, será totalmente impossível comungar com o Ser, praticar japa e meditação com a mente fixa numa só direção, ainda que se reze muita a Deus ou se pratique pranayama.

 

223- Há muitos que pensam: “não tenho muito apego ao corpo; não tenho muita paixão por minha mulher ou carinho em demasia por meus filhos, nem muita atração por dinheiro; não estou preso a nada e poderia facilmente me livrar disso tudo se o quisesse”. Mas, ao sofrerem golpes e contragolpes externa e internamente ou ao serem colocados ante uma prova terrível em virtude de mudanças da sorte, despertam da ilusão e se dão conta da desesperada condição em que se encontram - a de estarem atados de pés e mãos pelos terríveis grilhões de Maya. Aqueles dotados de boas tendências, herdadas de nascimentos anteriores, consideram esses grilhões simplesmente intoleráveis e se esforçam de coração e alma para se livrarem deles, por quaisquer meios ao seu alcance: esses são os mumukshus, isto é, pessoas desejosas de alcançar mukti (liberação), estado em que se é livre dos nascimentos e mortes sucessivos.

 

224- Há outra classe de jivas que levam uma vida escravizada por sujeições, geração após geração. Esta condição se torna tão natural que eles temem até mesmo ouvir o nome “liberdade”; pensam: “estamos muito bem do jeito que estamos, pois se tivermos que caminhar na estrada que leva à liberdade, incerta e desconhecida, renunciando a tudo que temos, é preferível não tomar conhecimento dessa liberdade”; assemelhando-se ao verme que vive na sujeira e que, colocado num ramalhete de flores, morre, suspirando saudoso pela sujeira em que vivia. Estes são os jivas presos que permanecem eternamente amarrados à vida do mundo.

 

225- Se o mundo fosse somente felicidade interminável e se não houvesse medo ou ansiedade, privações, tristezas, doenças, perigos e calamidades, quem sentiria vontade de chamar por Deus? Tudo isso nos foi dado pelo Senhor para nossa instrução, para nos testar de modo que  não O esqueçamos  e tomemos refúgio a Seus pés, percebendo nossa própria fraqueza. Assim sendo, nós nos elevamos até Ele por todos os meios, em todas as condições, tanto na felicidade quanto na tristeza. Possamos amá-Lo com todo o coração e senti-Lo como o único propósito, único sustentáculo e fonte única de tudo, nosso Tudo em tudo. Veremos então que o sentimento de privação, o mal e a dor serão incapazes de nos perturbar a mente e nosso coração ficará transbordando de felicidade.

 

226- Seja um mendigo faminto, faminto de amor divino. Chore ansiosamente pela visão de Sua forma de amor. Enlouqueça por Ele como se sem Ele a vida lhe fosse insuportável. Quem sente o desespero do devoto além Dele? Quem a não ser Ele é o ente mais querido do devoto? Quem mais busca o coração do devoto a não ser Ele, a quem se pode entregar totalmente de coração e alma? Se você se arrepende, Ele o perdoa e o enlaça num abraço amoroso, mesmo tendo cometido centenas de transgressões. O amor de Deus ultrapassa toda compreensão; está além de toda limitação. Ele é o oceano de felicidade infinita, Ele é o oceano de néctar da imortalidade: salta para dentro desse oceano e alcançará a imortalidade, nadará em bem-aventurança como o rasagollâ, um doce esponjoso que flutua no xarope. Não haverá sentido no fato do amante de Deus não desejar mukti nirvana (aniquilação), renunciando ao gozo da felicidade na adoração do Deus Pessoal?

 

227- Os embriagados de Deus são de duas classes: os que gritam “Mãe, Mãe, entoando canções devocionais de Shyama, a Mãe Divina de cor negra, com lágrimas nos olhos e os outros que bebem tanto até ficarem inconscientes, não se saciando enquanto não atingem aquela condição. Os primeiros pertencem à classe de bhakta e os outros são jnanis.  Ambos ficam totalmente absortos em estados espirituais de acordo com suas atitudes respectivas. Mas o devoto bhakta retém a atitude de “eu sou Teu” e o jnani submerge seu ego Nele com o pensamente de “eu sou Ele, eu mesmo sou o Incondicionado-Absoluto BRAHMAN”. Poderíamos dizer qual seja o mais feliz dos dois? Os estágios finais de jnana e bhakti são um e o mesmo. É um sentimento de unidade com o Ser onde os dois se entrelaçam e um não pode ser distinguido do outro.

 

228- O BRAHMAN sem forma não é como a vastidão de akasha (céu ou espaço elementar). É de natureza da Consciência-Indivisa, Consciência esta toda penetrante, tudo penetrando. A existência de todos os objetos no universo é devida ao Seu Ser, à Sua Própria Existência; todo o conhecimento do mundo deriva da luz de Sua Consciência, de Sua Inteligência-Pura; toda felicidade existente na criação flui de Sua Bem-Aventurança. BRAHMAN é Virat, incomensuravelmente vasto neste sentido. O espaço ou céu infinito é meramente um símbolo para conveniência da meditação.

 

229- “O processo de oferecer oblações no fogo é BRAHMAN, o próprio BRAHMAN oferece oblações no fogo de BRAHMAN. Aquele que se absorve na ação vendo nela BRAHMAN, alcança o próprio BRAHMAN” (Gita, IV.24). O significado deste verso do Gita é que, seja o que for que se faça, deve ser feito considerando tudo como BRAHMAN, quer dizer, identificando-se a si mesmo com BRAHMAN ou Deus. Toda sua vida torna-se um ato de yajna ou adoração sacrificial na qual o processo de oblação, a oferenda, o fogo, o trabalho e o objetivo, todos são BRAHMAN. Considere todo trabalho como yajna, como sua única adoração: quando estiver comendo, pense que Ele próprio é a comida, que o processo de comer também é Ele, que Ele é também o instrumento de comer, isto é, os órgãos com os quais comemos, e que de fato Ele é quem come ou goza a ação. Coma com a idéia ou sentimento de que ingere a comida como uma oblação no fogo gástrico que é BRAHMAN. Por que só no ato de comer? Você tem que usar a idéia de BRAHMAN ou Deus em todo o pensamento, em todo ato, em tudo do mundo. Somente assim se desvanecerá o karma de uma pessoa envolvida no trabalho desde que seu karma não produza outro resultado que a realização de BRAHMAN. Que possamos colocar Deus em todas as nossas ações, em todos os nossos propósitos; que possamos sentir sempre Seu toque benéfico, Sua vontade benigna em todas as coisas; que possamos oferecer-Lhe todos os frutos de nossas ações, boas e más, renunciando ao sentimento egoísta “sou eu quem faz”. É o que o Senhor KRISHNA nos ensina neste verso que é recitado em coro antes das refeições em quase todas as ramificações de nosso Belur Math (monastérios).

 

230- Há uma linda canção de Sri Ram Prasad que ilustra a mesma idéia:

 

“Ó mente, digo-te, adora KALI  com o rito que mais te agrada,

enquanto repetes dia e noite o divino e poderoso mantra dado pelo Guru.

Quando te curvares, pensa que te prostras a Mãe;

enquanto dormes, pensa que estás meditando Nela;

enquanto andas na cidade, pensa que caminhas em torno da Mãe Shyama.

Seja o que for que chegue aos teus ouvidos,

é em realidade o mantra da Mãe.

O nome de Kali é feito de todas as cinqüenta letras do alfabeto;

cada letra é um nome Dela”.

 

231- Este corpo é transitório. Ele se transformará em vermes e cinzas após a morte; seus elementos são impuros, sujos e repugnantes, tais como fezes, urina, catarro, sangue, gordura, carne, medula, etc., e mesmo assim, quão estupidamente o jiva é iludido e preso nesta jaula de carne e ossos! Terrivelmente apegado a este corpo, identifica-se com ele, sofrendo dor infinda a cada momento. Mesmo assim não toma consciência disso. Tal é a Maya de Mahamaya, a Grande Mãe da Ilusão Universal. Que mágico encantamento Ela lançou sobre todos! Aqueles que aspiram por moksha ou liberação devem partir em pedaços essa arruinadora armadilha de ilusão e lutar para se refugiar no Eterno, sabendo que o corpo e todos os objetos dos sentidos são insubstanciais e impermanentes.

 

232- Cantou um poeta Sadhaka Bengali:

 

Tal é a Maya de Mahamaya:

que encantamento mágico lançou Ela sobre todos!

Mesmo os imortais - os deuses BRAHMAN e VISHNU

Ficam prostrados, inconscientes, cativados, incapazes de sondá-La.

Que dizer, então, do homem mortal.

A armadilha é colocada num pântano,

ou onde a água flui de um tanque.

Perece na prisão de sua própria criação

e o pequeno cardume cai na armadilha.

A abertura de escape está sempre aberta,

mas mesmo assim eles não podem escapar.

O bicho da seda tece seu casulo.

Dele é possível sair, se o desejar,

mas, preso sob o encantamento de Mahamaya,

morre em sua própria larva.

 

233- Upasana significa aproximação de Deus pela adoração, orações e serviço; literalmente quer dizer “estar sentado em Sua proximidade”. Pensamentos e atos vãos, longe de nos beneficiar, somente nos causam mal. Consentindo-os, perdemo-nos, pois eles nos desviam de Deus, conduzindo-nos a um monturo de lixo alhures. Quanto mais pudermos nos manter distantes de pensamentos e ações indignas e dos impermanentes objetos mundanos, devotando-nos à lembrança e contemplação de Deus, à meditação, à adoração e à repetição de Seu Santo Nome e a atividades tais como fazer bem a outros e servir à humanidade, mais próximos estaremos de Deus e mais nos transfiguraremos em Sua semelhança, transbordando nossos corações de felicidade. Não há outra maneira de conquistar o mundo e ser salvo da miséria e da inquietude mental.

 

234- No Monastério de Baranagore* ouvi do reverendo Swami Premananda duas parábolas de Sri Ramakrishna que nunca vira publicadas. A primeira é: “as pessoas que pertencem à classe dos Acharyas ou instrutores, com autoridade e missão divina especiais, são como jogadores experimentados que, numa partida de damas retardam propositalmente os lances para chegar ao objetivo final. Eles sabem que com seus golpes de Mestre podem ajudar a quantos quiserem - dois, quatro, seis, oito ou dez, mas reunem-se a outros jogadores imaturos para levá-los consigo ao objetivo. Tente emparelhar-se, pois ninguém pode destruir o par num jogo de dados. Assim também desaparecerá o medo quando se encontra um Guru como esse”.

 

* Primeiro monastério,  estabelecido num local alugado, próximo à casa-jardim de Cossipore, após o passamento de Sri Ramakrisna em 1886.

 

235- Eis a segunda parábola: “uma feiticeira tinha nos braços um par de braceletes de ouro que fizera com muito sacrifício, mas ninguém os elogiava. Finalmente, muito desapontada, pôs fogo na própria cabana, reunindo uma multidão ao seu redor com seus gritos e soluços. Com os olhos lacrimejantes, começou a se lamentar, apontando com as mãos: ó!, vejam todos, minha cabana pegou fogo! Infeliz de mim, tudo o que tenho foi reduzido a cinzas; somente me restou esse par de braceletes. Assim também, as pessoas de natureza mesquinha ficam ansiosas por demonstrar o pouco que têm e a pequena habilidade que possuem, mesmo que para isso tenham que causar dano a si próprias”.

 

236- Toda a vida de um homem é um emaranhado de tentações. As seis paixões estão sempre despertas, sempre à espreita, procurando qualquer pessoa para envolver e devorar. Deve-se, portanto, estar permanentemente desperto e alerta, discriminando entre o certo e o errado, orando a Deus. Se um ladrão encontra a luz acesa numa casa e percebe alguém acordado lá dentro, ele não entra, procurando outro local. No momento em que afrouxamos nos enfraquecemos, então os inimigos acharão uma entrada, tornar-se-ão violentos e tentarão destruir-nos de todas as maneiras e, mesmo sendo derrotados muitas vezes, nunca desistirão. Mas, de modo algum, perca o ânimo e o entusiasmo. Mesmo caindo muitas vezes, deve erguer-se sempre com novo vigor, lutando com todo o esforço e poder. Verá então que, mesmo a derrota, se houver, será tão boa quanto a vitória, pois o ajudará cada vez mais no caminho. Deus assiste àqueles que sinceramente desejam levar uma vida mais elevada. Ele dá força e inspiração e lhes torna a senda mais suave, removendo toda a espécie de dificuldades, obstruções e perigos. E, quando exaustos pela luta incessante contra as paixões, tomam refúgio Nele com o coração anelante, Ele também os toma em Seu regaço, pois Seu nome é “Compaixão dos devotos”.

 

237- O devoto serve a Deus ou é Deus que o serve? Chega a época em que o devoto sente que qualquer serviço que possa fazer a Deus é quase nada, que é Deus mesmo quem realmente o serve. A adoração do devoto é como a adoração da Mãe Ganga com a água do Ganges, isto é, oferece-lhe coisas que são Dele. O verdadeiro bhakta não pensa em si mesmo; é Deus quem tem que pensar nele. A quem chamamos bhakta? Àquele que tem amor puro, sem desejo e incondicionado a Deus e que está louco de amor por Ele. Deus carrega o fardo e cuida daquele devoto cujo coração e alma estão sempre fixos Nele. “A estes, Eu dou o que lhes falta e àqueles Eu preservo o que já têm”, diz o Gita.

Tais devotos são extremamente raros. Lemos sobre eles em nossos Puranas e histórias, como Narada, Prahlada, Shukadeva, Vidura, Sri Radha e as gopis, pastoras de Vrindavan, Udhava, Mahavira e outros da antiguidade épica; e mais: ChaitanyaDeva, Mirabai, Ramanuja, Tukaram, Ram Prasad, do período histórico; Ramakrishna, Vivekananda, Pavhari Baba, Nag Mhasaya e outros dos tempos modernos. Entre estes, Sri Radha, Sri Chaitanya e Sri Ramakrishna são adorados como Avatares ou Encarnações de Deus.

 

238- Somente pela pura devoção e amor é que Deus se submete ao devoto. Ele se entrega obrigado pelo seu amor, reconhecendo a derrota em vista do verdadeiro amor do devoto. Deus vive constantemente no coração dele, preso pelo cordão do amor. Verdadeiramente, nada há que Deus não lhe possa conceder.

 

239 – Assim como o devoto não pode viver sem Deus, Deus não pode viver sem o devoto, como um jovem e uma jovem apaixonados. Mas o amor entre um jovem e sua amada, nasce da luxúria e do interesse pela beleza, talento etc, e além disso é maculado pelo desejo carnal. Tem fugaz odor de felicidade e interesse pessoal. Não consegue se conservar, se houver variação dessas  condições ou incompatibilidade de temperamentos; e deixa um sabor amargo na boca.

O amor de Deus, ao contrário, transcende a sensualidade, é sem desejo, celestial e eterno. Quanto mais se sorve o néctar desse amor, mais a sede aumenta: - não há saciedade. Aqui o Amor, Deus de Amor, o Bem-Amado e o amante se fundem num só Ser, sem distinção, daí resultando a felicidade absoluta.

 

240- Qualquer que seja o modo de vida ou a situação em que a Mãe o coloque, saiba que é para seu próprio bem, quer compreenda ou não. A alegria ou a dor são tão somente o toque benigno de Sua mão de lótus. Quem pode compreender Sua lila? Se Ela o mantém alegre ou pesaroso, próspero ou desafortunado, aceite humildemente tudo como Sua benção.

 

“Mesmo as palmadas e golpes da Mãe Divina são doces;

deixe-os cair nas costas tantos quantos forem!

Aquele que os encara dessa maneira, bravo!

É realmente um digno filho da Mãe Divina.

O filho não morre com o castigo da Mãe.

Ele não teme Seu olhar sisudo.

Está contente, pois a Mãe Divina o protege.

Na verdade, ele não conhece senão a Mãe”.

 

241- Que pode você entender de Deus ao discutir as Escrituras ou os temas de lógica, ao debater e raciocinar com seu mesquinho intelecto? Pelo contrário, se tenta compreendê-lo por estes métodos, há uma grande probabilidade de se confundir e atingir um estado em que se sentirá até mesmo duvidoso de Sua própria existência. Já que tem o raro privilégio da vida humana, perderá os dias contando as folhas da mangueira e fazendo pesquisas maravilhosas com elas ou se satisfará chupando as mangas? Deixa isso para aqueles que apreciam tais coisas, mas meu querido Podo, você deve se fartar com as mangas.

 

242- Certamente que a busca de conhecimento, a análise, o raciocínio, a pesquisa e o estudo de outras ciências refinam o intelecto e trazem à luz muitos princípios sutis, levando à descoberta de muitas verdades novas que fazem grande bem ao mundo. Mas esse mesmo aprendizado e conhecimento nas mãos de nações e pessoas egoístas e materialistas que pensam ser este mundo o seu “tudo em tudo”, torna-se a causa de miséria interminável e destruição da vida humana, transformando os homens em animais selvagens e o mundo num verdadeiro inferno.

 

243- A oração é o meio de se levar ao conhecimento do Senhor o Supremo Espírito que reside em todos os seres, regulando seus sentimentos internos - por meio da fala ou profundo pensamento, da aspiração de nosso coração ou de sua intensa angústia, suplicando-Lhe misericórdia para removê-las. A oração cheia de desejos egoístas diz: “- ó Senhor, eu não posso suportar a privação, a pobreza, a doença e o tormento desta vida! Torna-me saudável, alegre, feliz e livra-me de toda preocupação e privação!” A prece inegoísta diz: “ó Senhor, que me coloques nos ombros o fardo que desejares, que me mantenhas na miséria, que me lances ao perigo; isso não tem a mínima importância. Mas dá-me, ó Senhor, tanta fortaleza que eu por nada venha a ser perturbado. Que não possa eu Te esquecer, que eu possa ter sempre pura devoção por Teus pés de lótus que dissipam todo medo”.

 

244- O principal propósito da vida humana é a realização de Deus ou alcançar mukti. Só o homem tem a prerrogativa de atingir este objetivo mais elevado da vida, ninguém mais; nem os animais nem mesmo os deuses ou seres celestiais podem ter esse privilégio. É negado aos animais porque eles são destituídos de faculdade discriminatória entre o real e o irreal. É impossível às divindades atingir a liberação porque elas estão muito ocupadas com o gozo contínuo do intenso prazer e esplendores do céu. Que tempo lhes resta para a prática da discriminação e da renúncia? Por essa mesma razão, também é difícil para as pessoas que têm muitas riquezas e propriedades atingir mukti. O mesmo ocorre com os que são extremamente pobres e  estão sempre perplexos e atormentados, oprimidos pela fome e carentes de tudo. Eles têm dificuldade de  conseguir espiritualidade.

A realização de Deus é muito mais fácil para homens de condições moderadas, justamente porque eles estão situados entre os dois extremos. Vê-se na história do mundo que quase todas as grandes personalidades que deixaram uma impressão indelével na sociedade, religião, política e em outros campos da atividade humana pelo poder de seu gênio, nasceram de pais de classe média, de posses moderadas - nem ricos nem pobres.

 

245- Se hoje desperdiçarmos nossas energias e discutirmos o que o amanhã nos trará, perderemos o que poderia ser ganho tanto hoje como amanhã.

 

246- A erudição, o intelecto, o conhecimento das Escrituras, a lógica, os argumentos, a reflexão, as riquezas, a caridade, os trabalhos meritórios, os rituais e os sacrifícios, até mesmo o yoga e as austeridades, por nenhum desses meios nem por todos juntos pode Deus ser realizado. Nem por um nem por todos permite Ele ser capturado. A única forma irresistível para conhecê-Lo ou torná-Lo cativo é o amor puro, a devoção de alma e de coração. Sua natureza é de amor inefável. Se conseguir tocar essa corda, Sua natureza se revelará. Ele não poderá mais se esconder. É como a vaca leiteira, que dá leite em abundância assim que o bezerro lhe toca o úbere com a cabeça.

 

247- Os Vedas declaram que o Supremo Deus está além de todos os Gunas ou atributos, sem as limitações de nome e forma, tempo, espaço e causa, além do alcance de linhagem, da mente e do intelecto; todo penetrante sem princípio, sem fim e inconcebível por natureza. Mas o coração do devoto jamais se permite ser detido ou desviado pela aceitação de tudo isso. Ele diz: “- se Deus for somente isso, então que diferença faz se Ele existe ou não? Qual o valor Dele para mim, se nem sequer posso vê-Lo e torná-Lo o ídolo mais íntimo? Então todas as práticas e ritos espirituais de nada valem, para nada sirvo e para nada serve a vida humana! Qual a finalidade de se viver? Por todos os meios devo realizá-Lo nessa mesma vida!” O pranto e a lamentação amarga do coração do devoto alcançam o trono de Deus; Ele não pode ficar imóvel por mais tempo e morar em Sua própria majestade. Ele é, de fato, Todo Conhecimento, o Ser de todos os seres, o Guia Interno de todos, o Oceano de Misericórdia-Espontânea- Incondicionada e, sobretudo, Ele é carinhoso e amoroso para com o devoto. Ocultando assim Sua real essência para satisfazer o desejo do devoto, Ele Se mostra na forma adorada por ele no templo do seu coração e realiza o objetivo aspirado pelo devoto na vida. Além disso, de tempos em tempos Ele vem à terra em forma humana para que o homem possa com facilidade compreender-Lhe a real natureza. Quando o Senhor vive entre os homens como Avatar ou Encarnação, até o pecador e o aflito encontram a liberdade pela Sua graça, sem práticas espirituais nem rigorosas austeridades.

 

248- Deus toma forma por compaixão ao aspirante  a fim de tornar a adoração mais fácil. Não é possível concebê-Lo sem Seu aspecto transcendente, além de todos os atributos limitadores, nem é possível compreendê-Lo na totalidade de Suas qualidades abstratas e divinas. Quando principiamos a modelar uma imagem de SHIVA, com freqüência terminamos modelando um macaco! Enquanto formos seres humanos, enquanto tivermos sentido de corpo ou de dualidade, não teremos outra alternativa senão de pensar em Deus como uma pessoa ideal, dotada de infinitos atributos divinos.

 

249- Se tentarmos imaginar Deus sem forma, o melhor que podemos fazer é pensar Nele como o vasto céu ou o oceano ilimitado. Se tentarmos meditar em Deus no Seu aspecto sem forma, nos estágios iniciais, nada mais podemos fazer que meditar no vácuo. Nada pode ser sobreposto a isto. É como atirar pedras na escuridão. A meditação no Divino Pai, sem forma ou na Divina Mãe, sem forma é um processo trabalhoso da imaginação estéril, uma simples frase vazia e desprovida de significado. Não podemos progredir muito no caminho espiritual, praticando a meditação sem forma, porque é tão seca como o pó e sem nenhuma base de sustentação. O Paramahansa liberado, que está livre do sentido de identificação com o corpo e que vê Deus em todos os seres, é o único qualificado para meditar em BRAHMAN, sem forma além de todas as limitações.

 

250- O Senhor KRISHNA diz no Gita: “Eu Me encarno em corpo humano a cada época para a liberação dos bons, para aniquilação dos perversos e para o ressurgimento da religião, quando esta declina”. Mas, diz o bhakta, isto é só superficial, externo; temos de prosseguir mais fundo e mais longe. Isso não é tudo, deve haver mais ainda. Deus é, em realidade, Todo-Poderoso. Ele poderia ter realizado tudo isso por Sua simples vontade, sem sofrer tormentos intermináveis por Se encarnar como um Avatar. Portanto, isso não deve ser considerado como uma prova super-excelente da Encarnação de Deus. KRISHNA não pode ser considerado um Avatar meramente pelo fato de ter matado os perversos tiranos Kamsa e Shishupala, os quais insultavam a religião. Na história do mundo há muitos casos de tais incidentes, nos quais tiranos desse tipo foram assassinados, ficando seus súditos livres da opressão. Muitos acontecimentos milagrosos também são vistos nas vidas de vários Mahapurushas (grandes almas) que eram Mestres no Yoga. Eles podem fazer maravilhas, pois nada é impossível para eles; a Encarnação de Sri KRISHNA não é provada somente por Suas ações como Rei de Mathura ou Dwaraka, ou mesmo como guia e auxiliar dos Pandavas, no campo de batalha de Kurukshetra. Freqüentemente, Ele tinha de recorrer a uma estratégia duvidosa para ajudá-los a atingir seu objetivo. Aquelas maravilhosas ações por Ele praticadas certamente desperta respeito e espanto profundos e mostram claramente Seu maravilhoso gênio versátil. Mas essas ações, contudo, são simples assuntos de significado temporário, que não exercem nenhuma influência permanente nem envolvente na vida da humanidade.

 

251- A melhor prova da Encarnação de Sri KRISHNA é realmente manifestada por Sua lila em Vrindavan, porque somente nessa parte Ele revelou a essência real de Seu indescritível amor. Por meio de sua lila em Vrindavan, pode-se melhor compreender como a devoção pura e o amor podem submeter Deus ao devoto e como Ele pode tornar o devoto muito Seu. Em Sua lila, Ele revelou ao mundo o sumo amor que está além do alcance do nosso conhecimento e inteligência. Atraídas por aquele sublime amor, as jovens gopis ou pastoras de Vraja costumavam correr como loucas para as margens do rio Yamuna ao ouvirem o chamado de Sua flauta, na esperança de vê-Lo e estarem perto Dele. Olvidando totalmente o senso de posição social, reputação de família, vergonha e medo, elas costumavam perder, em Sua companhia, o sentido de corpo e individualidade e ficavam submersas Nele! Tal amor inegoísta nunca poderia ser evocado por um homem qualquer, somente por Deus. A influência doce e espiritual daquele maravilhoso, eterno e transbordante “Esporte Divino” arrastou e continua arrastando os corações de inúmeros homens e mulheres para seu Bem-Amado. Sim, tem derramado paz e bem-aventurança em suas vidas, preparando-os para a liberação, pela adoração Dele como seu Ideal Escolhido. Séculos depois, o Grande Mestre Sri Chhaitanya Deva veio como Encarnação para revivificar a idéia daquele mesmo amor; e, perdendo-se em mahabhava, o mais elevado estado de felicidade do samadhi, pela contemplação do doce “brinquedo” do Senhor KRISHNA e Radha, o Senhor das gopis, imaculado e limpo, livre do mínimo traço de luxúria, disseminou o divino-amor e devoção-pura a todos no mundo. E, em nossos dias, Sri Ramakrishna, cantando ou falando da mesma lila de Radha-KRISHNA, costumava ficar arrebatado de tal maneira que mergulhava em mahabhava, expressando em Sua pessoa todos os oito sinais exteriores daqueles raros sentimentos divinos que foram manifestados somente nas vidas de Sri Radha e Sri Chaitanya Deva.

 

252- Pode-se renunciar somente àquilo que se possui. Como é possível renunciar ao que não se tem? Se existe o desejo de abandonar alguma coisa é necessário primeiramente que se adquira tal coisa. Não será suficiente evitar a responsabilidade ou transtorno que essa coisa traz. Não terá valor “oferecer a Govinda o arroz que foi levado pelo vento”. Govinda é um dos nomes do Senhor Krishna. A alusão é feita a um negociante que, vendo seu arroz ser levado por uma rajada de vento e, considerando que ia perdê-lo, ofereceu-o a Govinda com a intenção de ganhar punya ou mérito religioso nesta vida ou numa futura. Os Shastras, Escrituras Hindus, não proíbem o prazer; dizem: “- goza o mundo pela renúncia, isto é, goza o mundo renunciando a todo o sentimento de “eu e meu” e aos apegos que disto derivam. Tudo neste universo está impregnado de Deus. Ele está em todos os objetos, tudo quanto existe é Seu. Portanto, mantendo firme esse conhecimento, faça todo o trabalho, desfrute de tudo, renunciando à idéia de “eu e meu”, pois se não for assim, o gozo tornar-se-á um sofrimento”. Se desfrutar do mundo com esta idéia, o yoga virá por si mesmo; você o terá praticado automaticamente, isto é, sem utilizar os meios prescritos.

 

253- Pensar e se lembrar do Ishta ou Ideal Escolhido significa estabelecer o contato ou união da mente com Ele. Quanto mais profundo e mais ininterruptamente o fluxo desse pensamento vá em direção a Ele, mais os pensamentos que distraem o substrato mental (antahkarana)* se acalmarão e mais ainda essa corrente será ininterrupta, como o fluxo de óleo derramado numa vasilha. Somente então é que esse estado é chamado dhyana ou meditação. Quando essa meditação se aprofunda ainda mais, a mente se torna una com o objeto da meditação, dissolvendo-se naquela forma ou substância. Esse estado é chamado samadhi ou estado superconsciente, quando só então a verdadeira natureza do Ser é totalmente experimentada e o Ideal Escolhido ou Deus é realizado. Dizem os Upanishads que para aquele que realizou BRAHMAN, os nós do coração são cortados, isto é, todos os desejos são destruídos; todas as dúvidas são resolvidas definitivamente; todos os frutos da ação são esgotados, terminando verdadeiramente toda a infelicidade. Diante disso, o primeiro passo para a realização de Deus é o pensamento e a lembrança constante Dele; o estado calmo e sereno das modificações mentais é o segundo passo; dhyana é o terceiro; samadhi é o último degrau da escada. Não é possível alcançar o degrau mais alto pulando os anteriores. Assim, o estágio final do pensamento e a lembrança constante de Deus são a Sua própria realização.

 

* Antahkarana é analisado pela filosofia Samkhya como manas - mente ou faculdade receptiva,  buddhi -  intelecto ou faculdade determinativa, chita ou faculdade cogitativa e ahamkara ou sentido do ego.

 

254- Japa do mantra ou repetição do nome sagrado de Deus, meditação e adoração foram prescritos para que, pela repetição constante e pelo hábito da prática continuada, esse pensamento e lembrança de Deus possam tornar-se firmemente enraizados na mente. Somente por essa razão é necessário repetir mentalmente o sagrado mantra do Ideal Escolhido ininterrupta e diariamente durante muito tempo. As coisas com as quais estamos continuamente ocupados ou em que pensamos constantemente deixam sua impressão gravada na mente. Embora dando a impressão de desaparecer da mesma, permanecem num estado sutil, na forma de samskaras ou tendências do passado e, tão logo encontrem atmosfera favorável instigam imperceptivelmente os homens ao pensamento e ação maléficos ou benéficos, dependendo se as tendências são más ou boas. Vê-se portanto que os maus gradualmente se envolvem cada vez mais em ações más e aqueles que diligentemente lutam pelo progresso espiritual avançam rapidamente nessa direção.

 

255- A soma total de toda energia que há no universo é sempre a mesma: não aumenta, não declina nem é aniquilada. No entanto essa energia tem modificações e é transformada de várias maneiras. Tudo o que pensamos ou fazemos de bom ou mau não se perde; continua a ser ativo numa maneira sutil ou então fica armazenado e se torna ativo tão logo apareça o momento oportuno. Assim, nós mesmos temos de colher os frutos bons ou maus de nosso karma. E não é só isso: esses pensamentos e ações armazenados também influenciam a outros, causando-lhes felicidade ou sofrimento.

 

256- Swami Vivekananda disse que todas as diferentes espécies de forças de pensamento e ação que nós inconscientemente transmitimos no mundo continuam a vagar em forma de ondas no espaço do universo e atuam sobre qualquer pessoa que tenha as mesmas vibrações com as quais elas venham a ter contato. Inspiram-na com a mesma idéia, infundindo força e as próprias forças ganham ímpeto novo duma pessoa da mesma natureza. Além disso, após completar o círculo, essa mesma força retorna à sua fonte de origem com mais energia. É por essa razão que, se fazemos mal a alguém ou fazemos alguém sofrer, temos também que sofrer conseqüências similares neste ou no próximo nascimento. Esta é a lei da natureza da qual ninguém escapa.

 

257- Devido à nossa ignorância dessa lei inexorável da natureza e, não podendo achar uma causa direta ou visível de nossos sofrimentos, somos incapazes de percebê-los com nossa inteligência comum. Assim, culpamos o destino ou algum poder invisível ou Deus e O consideramos parcial e cruel. Estamos tão envolvidos na ilusão que nunca refletimos por um momento sequer que temos que sofrer as conseqüências de nossas próprias ações e, além disso, com juros! Portanto, ao refletir sobre essas conseqüências, controle todos os seus pensamentos e atos e guie-os pelo caminho certo. Nunca seja a causa do sofrimento ou miséria de outrem em troca de algum prazer temporário. Se você persistir no caminho da espiritualidade herdará o Daivi Sampads* ou atributos divinos mencionados no Gita ( XVI.1-3). A mente será purificada e perceberá a ação da força divina dentro do coração. Então, você não será capaz de agir mal, mesmo se sentir como se o estivesse fazendo. O Mestre Sri Ramakrishna costumava dizer o que se verificava de fato em sua vida: “vocês jamais podem dar um passo em falso. Somente isso assinala a pessoa sumamente espiritual”.

 

* Intrepidez, pureza de coração, constância no conhecimento e no yoga, caridade, controle dos sentidos, yajna, leitura das Escrituras, austeridades, retidão, não-violência, veracidade, ausência de ira, renúncia, tranqüilidade, ausência de calúnia, compaixão, capacidade de perdoar, fortaleza, limpeza, ausência de volubilidade, audácia, capacidade de perdoar, fortaleza, limpeza, ausência de ódio e de orgulho. Essas qualidades pertencem àqueles nascidos para manifestar um divino estado.

 

258- Muitos têm a impressão de que o samadhi não pode ser atingido sem a prática do yoga ou sem trilhar o caminho de jnana ou conhecimento. A filosofia Yoga de Patanjali diz assim: “- a união com o Ideal Escolhido é atingida, isto é, Deus é visto, pelo mantra-japa ou repetição do Santo Nome”. Em seguida declara: “- o samadhi é alcançado pela entrega total a Deus”; em outra parte diz: “- ou meditando em Deus”. Então, o samadhi pode ser alcançado pela concentração da mente em Deus ou dedicando todas as ações e seus frutos a Ele. Além disso, o comentarista VyasaDeva escreve nesse texto: “- ao se agradar a Deus meditando Nele com amor e devoção especiais, o devoto é favorecido por Ele pelo Seu simples desejo. Os yogues também alcançam o samadhi e seu rápido resultado unicamente por Seu desejo, ou seja, incondicionalmente.

Verifica-se, pois, que o estado de samadhi pode ser logrado mesmo sem se praticar os oito passos do yoga. A realização da absorção de Deus com forma e o samadhi no BRAHMAN sem forma são uma e a mesma coisa; somente a atitude e os meios variam a realização da Realidade e seus efeitos são os mesmos em ambos os casos. Realmente, aquele que é BRAHMAN sem atributos é o próprio BRAHMAN com atributos; apenas a adoração de BRAHMAN com atributos é mais fácil para os jivas ou indivíduos que estão ainda sob a sensação da identificação com o corpo.

 

259- A adoração de Deus com o desejo de algum resultado é a adoração de si mesmo e não de Deus. Invocar a Deus para se livrar de ansiedade, medo, privações, transtornos, perigos, doença, misérias e coisas semelhantes é um propósito egoísta para o próprio engrandecimento, pois visa somente conforto e vantagens pessoais. O objetivo de todos os códigos e observâncias que são executados pelo desejo como, por exemplo: o banho ritual, a caridade, a adoração externa, as cerimônias e festivais religiosos, os votos e jejuns, as cerimônias sacrificiais e expiatórias, a execução de ritos para assegurar o bem-estar e evitar possíveis males, as peregrinações, o serviço aos pés dos santos e a recitação do Chandi ou Gita e assim por diante; - tem por finalidade libertar-se dos erros do passado e acumular mérito religioso. Livrar-se dos erros do passado significa querer escapar por algum meio fácil da tortura do inferno ou da dor e sofrimento que são a conseqüência inevitável das obras errôneas cometidas anteriormente - e não o desejo de esgotar a tendência de praticar erros. O propósito de “acumular mérito religioso” é viver feliz e confortavelmente nesta vida com os parentes, família e filhos e gozar duma felicidade infinita no paraíso após a morte. Ambos desejos são ilusões da mente, esperanças vãs. Não há felicidade pura neste mundo nem felicidade eterna no paraíso. São simplesmente panegíricos ou palavras de consolo e estímulo registradas nas Escrituras - Vedas, Puranas, etc. Simples mitos, feitos para atrair aqueles que não são inclinados à execução dos deveres religiosos e aos atos virtuosos, dizendo-lhes: “- pratica isto e somente isto e terás um resultado milhões de vezes maior”. É exatamente como faz a mãe com o bebê para que tome o leite, distraindo-o com estórias de fadas ou fazendo-o dormir com cantigas. O objetivo é bom, não há dúvida e o propósito se cumpre.

 

260- Devemos desistir de todas essas formas de cerimônias e adorações rituais, por serem instigadas pelo desejo? Estou, por ventura, proibindo-o de fazê-las? Certamente que não. Faça-as de todas as maneiras, enquanto seu coração sentir-se inclinado a isso. Estas observâncias animam e expandem a mente, trazendo o sentimento sátvico ou disposição sagrada por meio de bons pensamentos e execução de boas obras, despertando a fé e a atração por deveres religiosos mais elevados e pelo trabalho inegoísta. Mas lembre-se ao mesmo tempo que, embora sejam certamente ordens Védicas, pertencem à Karma Kanda, a seção dos Vedas que se refere aos atos cerimoniais e ritos de sacrifício. Não são, em realidade, bhakti ou devoção. No amor a Deus não há compra e venda, negócios ou trocas, cálculo de lucro ou perdas, nem desejo pelos frutos da ação. Há somente a total dedicação de corpo, mente, alma e tudo o mais ao Deus do coração; há mais completa satisfação em amá-Lo, porque ao ser Ele amado, nenhum outro objeto de desejo é digno de ser buscado. É amor pelo Amor. A própria natureza de tal devoto é amar; sua atitude é: “eu não posso suportar o viver e respirar sem amá-Lo”. Este é o estágio final, o auge de bhakti ou prema, a devoção suprema ou amor puro a Deus, totalmente sem desejos. Mas tal bhakti é muito rara; no princípio não vem por si mesma. Esta é a razão pela qual a observância de Karma Kanda e da devoção formal foi prescrita por nossas Escrituras. Se esses ritos forem observados com reverência e fé, a mente se purificará gradualmente pela graça de Deus; sua escória se dissipará, o desejo de resultados mesquinhos tornar-se-á desprezível e sentir-se-á aversão pelos objetos transitórios do mundo. Então o coração buscará ansiosamente conquistar o imperecível, o mais elevado estado, o chamado supremo bhakti ou supremo jnana.

 

261- Pela prática ininterrupta de brahmacharya ou continência e da veracidade por doze anos (perfeição na fala = vak-siddhi) o poder divino é alcançado. As palavras de uma pessoa desse tipo jamais são falsas; o que disser a quem quer que seja, torna-se verdade,  seja uma bênção ou uma maldição. A quem ela desejar o bem-estar, isso sucede. Será cumprida qualquer resolução que surja em sua mente pura .

 

262- Aqueles que desejam realizar Deus não devem faltar à verdade em nenhuma circunstância; para eles é melhor sofrer misérias e aflições do que sacrificar a verdade. Se alguém tiver preparo para assim proceder e tudo enfrentar  com alegria, só então poderá realizar Deus, que é a Verdade em Si. Perder a verdade é perder Deus mesmo. O poder da vontade é infalível: RAMA foi para a floresta cumprir o voto de verdade de seu pai; os cinco Pandavas, filhos do Rei Pandu, aceitaram o exílio junto com Draupadi pelo bem da verdade e, pela mesma razão o Rei Harishchandra perdeu tudo e se tornou um mendigo. Os Puranas contêm centenas de exemplos de inabalável devoção à verdade, mesmo com o sacrifício da própria vida. Nosso Mestre Sri Ramakrishna, após a realização do Mais Elevado, ofereceu tudo à divina Mãe KALI - conhecimento e ignorância, santidade e profanação, bem e mal, virtude e iniquidade, pedindo-lhe para levar os pares de opostos e lhe dar amor puro. Mas ele não pôde dizer: “- Mãe, aqui está Tua verdade e aqui está Tua falsidade!” pois se dissesse isso, o que conservaria renunciando à verdade?

 

263- O tempo é fugaz como o vento. A vida se esvai a cada momento que passa. A vida é somente outro nome da morte; não se sabe quando este corpo cairá. Assim, deve-se estar sempre alerta para o chamado da morte. Não desperdice seu tempo em vão, não adie nenhum dever indispensável. Desde esse exato momento, deve-se procurar acumular algo para a vida futura, pois riquezas e propriedades são recursos que servem somente para este mundo. Não o acompanharão após a morte. As orações e práticas espirituais são os recursos para a vida futura, sendo realmente a única propriedade que devemos levar conosco. Por pequena que seja essa provisão, não será feita em vão. Com sua ajuda, muito se terá avançado ao longo da senda.

 

264- Você iniciará a próxima vida com o que adquiriu na prática de disciplinas espirituais nesta vida, ou seja, na próxima encarnação começará exatamente onde deteve as práticas espirituais dessa existência e avançará em direção à meta com passos rápidos. É por essa razão que algumas pessoas são devotadas a Deus por natureza e, com um pouco mais de prática espiritual adquirem agudeza ou firmeza mentais e experiências intuitivas das verdades sutis, necessitando somente de um pequeno impulso para despertar seu fogo interno. Diksha ou iniciação dada pelo Guru é esse impulso. Sri Ramakrishna costumava dar o nome de “combustível seco” a estas almas que, a um simples sopro, inflamavam-se totalmente. Aos outros, ele chamava de “madeira verde ou molhada” que não queima fácil, com as quais o Guru tem que sofrer muitos transtornos. O Guru pode soprar muitas vezes. Mesmo assim, dificilmente mostram algum sinal de estarem inflamados ou de se colocarem em ação. Tais pessoas, mesmo se esforçando,  têm que trabalhar muito e duramente. Muitas vidas talvez se passem antes que elas possam atingir a realização do Mais Elevado.

 

265- Todos têm que sofrer as conseqüências de suas ações passadas; não pode haver liberação antes que os frutos das ações tenham sido colhidos, isto é, antes que se tenham esgotado suas experiências de prazer e dor e a lição tenha sido aprendida. Mas, tomando refúgio numa encarnação de Deus ou em alguma alma perfeita com mandato especial de Deus, então, pela graça de tal Ser, as tendências em potencial que levariam muitas vidas para se esgotarem são esgotadas numa única vida.

 

266- Vê-se constantemente no mundo que aqueles que trilham a senda da virtude sofrem sempre misérias e infortúnios e que muitos dos que levam uma vida de iniquidade e recorrem ao vício aparentam passar suas vidas cheios de conforto e felicidade. Como o desejo de gozo dos prazeres sensórios é muito forte nessas pessoas, este se torna a razão e finalidade de suas existências. Se conseguem assegurar os objetos de seu gozo por todos os meios possíveis, consideram-se muito sagazes e se julgam muito felizes. O verme que vive na sujeira só encontra felicidade na mesma e também se alimenta dela. Mas tais pessoas são tão estúpidas e iludidas que nunca refletem que terão de suportar na próxima vida, dor e angústia terríveis devido ao fardo de ações más que acumulam nesta. Sabe-se lá se, pela sua natureza bestial, não terão elas até que transmigrar para um corpo de animal inferior! Não levando isso em consideração, aqueles que estão afundados em tal ignorância, os que não sentem a picada do escorpião da consciência, são somente animais em forma humana.

 

267- Não se suponha, nem sequer por um momento, que os que estão cegos pelo interesse próprio, escravos de seus sentidos ou loucos com o vinho das riquezas mal adquiridas tenham felicidade e paz reais em seus corações, por mais elegantes e alegres que pareçam exteriormente. O gozo dos objetos mundanos aparenta ser doce enquanto permanece, mas chega o momento em que se torna a fonte de dores e perturbações que corroem o coração. A vida da criatura indulgente consigo mesma torna-se carregada de ansiedade, medo e inquietação constantes e, por último, de frustração total, podendo atingir o extremo de desejar a morte, cometendo suicídio. São realmente dignos de piedade!

 

268- A mente torna-se purificada pelos pensamentos nobres e puros, pela companhia dos santos e pela prática de boas obras. Somente então ela se torna calma e estável no japa e na meditação. Assim como um espelho embaçado não reflete com nitidez, também a mente, sendo impura, não é capaz de perceber pensamentos e idéias divinos e, por esta razão, as práticas espirituais e as orações são essencialmente necessárias. No princípio é preciso esforço para fazer as práticas e as orações, mesmo que a mente não esteja inclinada a isso. Insistindo e perseverando, o gosto por elas será desenvolvido. É o mesmo quando o paciente não quer tomar um remédio e deve ser persuadido ou forçado a tomá-lo. Mas há certos pacientes que cospem o remédio mesmo quando posto em sua boca. Como é possível, então, curar-lhe a doença?

 

269- Quanto mais fizer suas práticas espirituais e austeridades, mais sentirá a graça de Deus sobre si e Sua presença em seu coração. Verá que Ele o auxilia de várias maneiras; é como  se, dos bastidores, Ele lhe provesse de tudo que é necessário para que você O realize. Poderá a mente dirigir-se para Ele se não for atraída? Ele instila tamanho anseio no coração daquele que por Ele aspira, cuja alma anela realizá-Lo que tudo é renunciado por Ele, não encontrando motivo de satisfação em nada mais além Dele. Esse descontentamento divino é chamado de “estado de loucura de amor”. A intensa ânsia por Deus é, em essência, viver Nele. A aspiração é a chave do portal interno da mansão do Senhor.

 

270- Após praticar japa e  meditação durante algum tempo não pense assim: “ora, pratiquei tanto nestes dias e, mesmo assim, nada consegui!” Se não obteve resultado algum, mesmo após praticar por longo tempo, saiba que haverá em si algum defeito, devendo haver alguma brecha pela qual todos seus atos de adoração se perdem como a água que sai da jarra. Encontre essa brecha, buscando dentro de si mesmo e feche-a. Somente então, sua jarra gradualmente se encherá e seu coração transbordará de força e bem-aventurança espirituais. É sinal de egoísmo e ilusão pensar que se está trabalhando muito, que se está fazendo muitos exercícios religiosos. Ao invés disso, pense: “por mais que eu possa tentar e trabalhar, não é insignificante tudo isso para que eu Te realize, Senhor? Que capacidade e merecimento possuo para poder encontrar-Te? Se Tu me fores favorável, por Tua própria misericórdia, tão somente então poderei encontrar-Te. Não tenho outra saída: tomei refúgio em Ti, unicamente em Ti. Sê compassivo para comigo por Tua infinita misericórdia. Salva-me, Senhor, e liberta-me dos limites da existência!”

 

271- A meditação e o japa podem ser praticados em qualquer momento, lugar ou condição. As pessoas que se aperfeiçoaram na meditação, ao voltar suas mentes para dentro de si mesmas, podem sentir tal solidão em meio do barulho e tumulto do mercado que nada é capaz de interromper sua estabilidade mental. Essas pessoas são inabaláveis tanto na felicidade como no sofrimento, na prosperidade como na adversidade, no louvor e na infâmia. O Gita as denomina “sthitadhi” ou pessoas de sabedoria firme e conhecedoras de BRAHMAN.

 

272- Do mesmo modo, japa é praticado espontaneamente em cada alento (inalação e exalação) por aqueles que alcançaram a perfeição nisso; eles não precisam esforçar-se nessa prática, à qual é dado o nome de ajapa-japa ou repetição espontânea do mantra. Estas pessoas alcançam tal estado porque suas mentes estão fixas no japa devido a sua prática constante e repetida. Mesmo que estejam ocupadas externamente em conversas ou trabalho, o mantra ou fórmula mística do Ideal Escolhido continua a soar constantemente dentro delas. Se quiserem usam também um rosário para o japa quando estão tratando de negócios ou conversando, para servir de ensinamento aos homens. Mas isso não significa que passam as contas de seus rosários de forma ostensiva, para demonstrar sua religiosidade, como os embusteiros e pseudo vaishnavas fazem enquanto negociam com vegetais e outros artigos. O grau alcançado por uma grande alma, seja através de dhyana ou de japa é o mesmo: ambos são o resultado final da prática intensa, do controle da mente, do esforço espiritual e das orações efetuados durante longo tempo. “Mukti é propriedade daquele que é perfeito em dhyana”.

 

273- Pranayama é o ato de respirar uniforme e suavemente, seguindo um processo especial, controlando o prana ou alento vital. Se o pranayama for praticado metodicamente e de maneira correta por longo período, a mente se acalma, ficando concentrada no objeto ao qual for dirigida e o conhecimento perfeito daquele objeto é adquirido. Este é o resultado proeminentemente espiritual do pranayama. O seu efeito no corpo e na mente também é maravilhoso: torna o corpo saudável, forte e radiante. Quanto à mente, torna-se igualmente alegre, calma, paciente, viril e resoluta, sendo que uma força de vontade irresistível se manifesta aliada ao magnetismo pessoal. Com isso, realiza-se qualquer tarefa a que se dedique. Como resultado do pranayama, os yogues têm vida longa e adquirem muitos poderes sobrenaturais, se bem que tais poderes se constituam num grande empecilho à realização do  supremo fim.

 

274- Vê-se no mundo que quanto mais lentamente os animais respiram, mais longas são suas vidas e que têm vida curta os que respiram rapidamente. Em tempos idos, o período comum da vida humana era de cem anos porque os homens viviam em harmonia com a natureza. De acordo com os Vedas, “o período da vida humana é de cem anos”. De acordo com o Svarodaya Yoga Shastra, eis alguns tempo de vida de algumas espécies:

 

Espécies                                  Respirações por minuto                  Tempo de Vida

                                                               (nº de vezes)                                      (anos)

 

Homem (no passado)*                        12 a 13                                                              100

Elefante                                                11 a 12                                                              100

Serpente                                                  7 a 8                                                    120

Tartaruga                                                 4 a 5                                               150 a 155

Macaco                                                 31 a 32                                                           20 a   21

Égua                                                      38 a 39                                                                8

 

* Atualmente no homem a respiração por minuto é em média 15 a 16 vezes , daí a razão dele viver menos.

 

275- É proibido exalar com força. Deve-se exalar conforme os yoga Shastras, com suavidade suficiente para não deixar voar com o sopro o chhatu (farinha de cevada, frita e moída bem fina) colocado na palma da mão.

 

276- Aqueles que procurarem esvaziar a mente de todo o seu conteúdo ou pensamento desde o  início de sua sadhana sem as devidas instruções shástricas, treinamentos e práticas espirituais e que pensam estar praticando para atingir o elevado estado de nirvikalpa samadhi (total absorção na Consciência Pura), tornando a mente vazia de qualquer coisa, somente trazem para si um estado tamásico, quer dizer, tornam-se inertes e imbecis por si mesmos. Seus cérebros ficam vazios e por isso são incapazes de entender e compreender as verdades sutis.

 

277- De acordo com o SHIVA Samhita, a primeira condição para o sucesso no yoga é a crença: “seguramente serei bem sucedido”. A segunda é a prática espiritual com fé e devoção; a terceira, reverência ao Guru; a quarta, equanimidade; a quinta, controle dos sentidos; a sexta, alimentação moderada. Não há sétima condição. Portanto, se estas seis condições forem preenchidas devidamente, nada mais é necessário, pois o sucesso é inevitável. Isto se aplica, e sem exceção alguma, a todos os aspirantes que buscam a liberação.

 

278-  Não há tarefa mais difícil no mundo do que controlar a mente. Sri Ramachandra disse a Hanuman: “- Pode-se cruzar os sete mares nadando; engolir todo o ar existente e lutar com a montanha; mas, muito mais difícil que tudo isso é controlar uma mente inquieta”. Portanto, não há razão para temer ou ficar deprimido, mesmo que isso aconteça. O aspirante heróico pode realizar o impossível pela graça de Deus se lutar e efetuar práticas espirituais de coração e alma, com perseverança infinita e resolução firme, sempre confiando e tendo fé em Deus.

 

279-  Swami Vivekananda compôs um poema em sânscrito na América e enviou-o por carta  aos irmãos discípulos do Math. Eis sua transcrição:

 

“Nós mastigaremos as estrelas e extirparemos os três mundos pela força.

Tu não nos conheces? Somos os servos de Sri Ramakrishna!”

 

Mesmo o impossível torna-se possível com tão grande auto-confiança e devoção ao Guru. Com essa confiança, Swamiji conquistou o mundo. Jesus também disse: “- se  tiveres fé como um grão de mostarda, dirás a esta montanha: - mova-se! e ela se moverá e nada te será impossível”. Após suas diversas experiências e visões espirituais de Deus, nosso Grande Mestre Sri Ramakrishna disse à Mãe, para confirmação: “- Mãe, se todas as minhas experiências divinas são reais, esta grande pedra deverá saltar três vezes”. Isso aconteceu, foi-nos contado, tão logo ele disse isso. São estas coisas, porventura, simples palavras vazias?

 

280-  Quando perguntaram a Swamiji se os seis lótus existem realmente no corpo, ele respondeu: “- nosso Mestre costumava dizer que os lótus descritos pelos Yogues não existem realmente no corpo humano em forma material, mas vêm à existência e são percebidos por eles através do poder do Yoga.

 

281-  O trabalho é de três categorias, de acordo com a diferença entre os três gunas: sattva, rajas e tamas. O trabalho bom ou benéfico é sátvico; o mau ou injurioso é tamásico e a mistura desses dois é rajásico. A marca ou impressão deixada na substância mental ou no corpo sutil pelas ações se chama samskara. A isso é que denominamos karma adrishta - o invisível (destino, sorte), dharma e adharma        (mérito e demérito), papa-punya (vício e virtude), etc. Não pode existir efeito sem causa. Nossos gostos e tendências boas ou más, quaisquer que sejam, são todos estímulos dos samskaras acumulados no passado. Somente se manifestam e se tornam ativos aqueles que encontram circunstâncias favoráveis dentre todos os samskaras. Os outros permanecem armazenados, aguardando a ocasião propícia e produzem resultados bons ou maus no momento oportuno. O que quer que façamos é uma mistura de bem e mal; daí colhermos frutos nos quais a felicidade e a miséria se misturam. Consideramos as coisas boas ou más de acordo com as qualidades predominantes.

 

282-  Todo trabalho causa dependência. Tanto a felicidade quanto a miséria são dependências e não pode haver mukti até que se transcenda as duas. O trabalho jamais é causa de escravidão para aqueles que trabalham visando o bem dos outros, sem a idéia de “eu”, porque eles não desejam resultados, não trabalham para fins egoístas ou para ganhar nome e fama. O amor vibra em seus corações, eles vêem Deus em todos os seres, trabalham com o espírito de serviço dedicado a Deus. Consequentemente, seu trabalho consome os resultados potenciais de todas as ações acumuladas e não produz sementes futuras de qualquer ação em forma de novos samskaras na mente. Assim, libertados da causa de nascimento e morte repetidos, tornam-se aptos para a realização de moksha ou liberação após a dissolução do corpo.

 

283-  Não há felicidade no gozo dos sentidos; somente na renúncia está a verdadeira felicidade. Só aquele que aprende sua lição pela discriminação entre o real e o irreal, pelas constantes experiências amargas, que renuncia a tudo por sua própria vontade, que perde todo o desejo pelo gozo dos objetos mundanos sabendo serem estes insubstanciais e causadores de dor, somente esse é completamente feliz e herda a imortalidade. Swamiji mostrou em seu livro “Bhakti Yoga” que a renúncia é a própria vida e alma dos quatro tipos de yoga.

 

284-  O karma yogue dedica o fruto de seu trabalho a Deus, sem se ligar a ele, pois sabe que só Deus age, não sendo sua a execução da ação. O raja yogue sabe que prakriti, Natureza, é para Purusha, o Ser e não Purusha para prakriti. Purusha é o ATMAN, o Ser; prakriti é a matéria; assim Ele, o ATMAN, é totalmente diferente da prakriti. Ele é o Senhor e prakriti, a serva. Prakriti existe somente para a realização de Seu propósito: sua função é levá-Lo através das várias experiências e daí fazê-Lo realizar Sua própria e real natureza. Assim sendo, o raja yogue não se identifica com prakriti e, por isso, renuncia a todo apego ilusório a ela.

 

285-  A renúncia do jnana yogue é a mais difícil, porque ele tem que pressupor desde o princípio que todo o universo e sua relação com ele é irreal, é Maya, e toda a vida é como um sonho. Sua senda é: “neti, neti (isto não, isto não), não sou isso nem aquilo - nada que eu veja ou possua; não sou nem o corpo, nem a mente, nem os sentidos; não tenho prazer nem dor, nem nascimento nem morte; não tenho laços nem liberação; sou o Absoluto BRAHMAN, o Supremo Ser; sou a natureza da Consciência, Sempre Pura, Sempre Iluminada, Sempre Livre”. Em meditação, ele tem que mergulhar conscientemente em sua própria essência real, o Ser, rejeitando todos os objetos externos.

 

286-  A renúncia do bhakti yogue é a mais fácil de todas - vem naturalmente. Não há dificuldade ou austeridade nessa renúncia, nem esforço vão para subjugar a mente pela força; só uma coisa - as tendências da mente têm que seguir uma nova direção; a direção de seu fluxo tem que ser orientada para um novo canal. Quando, após experimentar tristeza, sofrimento e desespero constantes resultantes dos laços às várias espécies de objetos mundanos, compreendermos a natureza insubstancial desses objetos e desviarmo-nos dos desejos e dos apegos a eles, então desaparece tudo automaticamente.

 

287-  Aquele cuja vida manifesta uma perfeita harmonia de karma, yoga, jnana e bhakti é o Mahapurusha ideal, o maior de todos os santos, o Mestre do mundo. O Divino Mestre Sri Ramakrishna deu este novo ideal da religião universal ao mundo após ele mesmo havê-la praticado. É a yuga-dharma, a religião desta era.

 

288-  Assim como qualquer dos quatro Yogas é impossível de se praticar sem que haja tyaga ou renúncia, também é impossível, sem a renúncia, o verdadeiro bhoga ou gozo dos objetos mundanos. O gozo sem a renúncia é a causa de todo o sofrimento e sua única conseqüência é a miséria. Os homens fogem amedrontados tão logo ouvem a palavra renúncia porque não podem conceber quanta felicidade existe nela. Se uma pessoa é chamada a renunciar, por que deve isso significar necessariamente que ela deva tornar-se monge, renunciando à sua mulher e a seus filhos, a seus queridos, a seu lar, às riquezas e às propriedades? Por que não praticar uma pequena renúncia de coisas ínfimas na vida diária, de acordo com sua capacidade? Então compreenderia quanta felicidade e alegria há na renúncia, o quanto ela expande o coração e alegra a mente. A renúncia que não traz alegria é tudo menos renúncia.

 

289-  A renúncia é realmente a vida de nossas vidas. Estamos de fato renunciando a todo momento sem estarmos conscientes disso. Renunciamos à respiração, quer dizer, inalamos para exalar a fim de nos mantermos vivos. Da mesma forma que o sangue se junta no coração através da alimentação, o mesmo sangue flui pelas artérias e veias para revigorá-las. De outro modo, a morte seria inevitável. O que quer que recebamos de outros ou da natureza e o que quer que ganhemos, seja aprendizado, conhecimento de ciências, verdades sobre o universo, riquezas e espiritualidade, tudo é para o bem de outrem, para aliviar a necessidade de outrem. Se damos de má vontade ou distribuímos  sem restrição, não importa: o que temos se perderá com o decorrer do tempo e não será de valor algum para quem quer que seja. Mas, lembrem-se! Estamos falando de distribuição, não de troca! Uma dádiva ou um ato de renúncia deve ser livre, espontâneo e isento de qualquer motivo ulterior. Somente então produz um bem imperecível. Swamiji disse: “- dá, dá tudo, não busques recompensa. Aquele que busca recompensa vê seu oceano se reduzir a uma simples gota!”

 

290- A certeza da renuncia é vista em todas as partes da natureza externa. O sol, a lua, as estrelas dão luz e calor; as árvores produzem frutos, dando sombra e fazendo brotar flores, mel e fragrâncias; os rios saciam a sede e a terra produz alimento e materiais para o gozo de todos os seres vivos. Todos se dão a si mesmos livre e silenciosamente, de acordo com suas próprias naturezas, para o bem de outros seres. É somente o homem que se faz a si próprio perverso e ridículo, gritando mesmo ao morrer:  “meu! meu!”

 

291- Os yogues e homens de renúncia não aceitam presentes  de ninguém para seu próprio gozo, porque isso enfraquece sua liberdade e pureza mental. Aceitar presentes gera um senso de obrigação e o pecado do doador mancha o corpo e a mente de quem recebe. – “deixa-me ter isso ou aquilo! Deixa que isso ou aquilo aconteça! Quero isso, quero aquilo!”  Estar sujeito a desejos como esses e aceitar doações para seu cumprimento chama-se parigraha. Aparigraha ou a não aceitação de presentes é a atitude de renúncia desinteressada. Mas a aceitação de algo somente para a manutenção do corpo não é parigraha. Assim, os jnanis não ficam ligados nem mesmo a esse pequeno conforto e necessidade vitais do corpo. Eles bem sabem que há felicidade em bhoga ou gozo em qualquer forma e eles tampouco aspiram à felicidade. Mas, se os jnanis se empenham em alguma atividade humanitária e aceitam doações para executar esse trabalho, não há mal nenhum nisso.

 

292- O nome e objeto designado pelo nome são idênticos: Deus e Seu nome são o mesmo. Em virtude de Suas formas, atributos e concepções serem inumeráveis, também Seus nomes são infinitos. O poder de Seu nome é irresistível e infinito. Qualquer que seja o nome que lhe agrade mais, repita-O continuamente. Ele lhe responderá. Todos os fins desejados podem ser realizados e Ele pode ser realizado com somente a repetição de Seu nome. “Com a prática de japa, a realização é alcançada”.

 

293- A mais alta realização não pode ser atingida sem que se submeta às instruções espirituais transmitidas em sucessão pela linha de Gurus: isso é chamado Guru-parampara. Um poder flui ao longo da linha de mestres espirituais de Guru a discípulo e, quando um discípulo se torna um Guru com o passar do tempo, em troca ele transmite esse poder aos seus discípulos. Assim, devido às rigorosas práticas espirituais dos Gurus desde tempos imemoriais, os místicos poderes dos nomes sagrados das divindades adoradas foram concentrados na forma de “mantra- semente” especial. Este mantra é a esperança e base do aspirante e o símbolo vivo do seu Ideal Escolhido. Se ele for  praticado com firmeza e constância através de japa, seu grande poder será percebido como uma realidade. Mas deve-se receber diksha ou iniciação de uma pessoa espiritualmente qualificada, de mente pura, que tenha recebido o Santo Nome da linha tradicional de Gurus. Então, seguindo-se as disciplinas espirituais de acordo com as instruções do Guru, com fé e reverência, a realização vem rapidamente.

 

294- Do mesmo modo que uma pessoa dormindo num quarto com as portas fechadas acorda para responder se alguém bate à porta chamando-o pelo nome, assim também o Senhor que habita em todos os seres desperta e abre a porta do templo do coração do devoto, bastando para isso que ele repita o Seu nome e faça as práticas espirituais com fé e devoção. Para atender ao seu anseio, o Senhor  revelar-se-á na forma da divindade escolhida.

 

295-    A glória e o poder infinitos do nome de Deus são de tal magnitude que só o pronunciá-Lo faz com que o aflito, o pecador e mesmo o infame encontrem salvação; e o que não é devoto vem a descobrir uma doçura nesse nome que fará nascer nele a aversão pelos objetos mundanos. Se você não é capaz de fazer qualquer outra prática espiritual, pelo menos repita o nome de Deus e reze a Ele com o coração anelante: - terá então força, paz mental e, com o correr do tempo -  verá despertado o amor e a devoção a Ele através de Sua  graça.

 

296-    Tapasya ou ascetismo é de três espécies: de corpo, palavra e mente. A prática de austeridades físicas tais como votos e penitências, serviço aos doentes e necessitados e outros atos desse tipo é ascetismo corporal; veracidade é ascetismo da palavra; domínio dos sentidos e prática da concentração no objeto da meditação é ascetismo mental. Aquele que busca atingir a mais elevada realização deve praticar esta tríplice tapasya.

 

297-    A religião em sua essência é o desejo por Deus e o sentimento de Sua falta. Sentimos agudamente a necessidade de coisas sem as quais é impossível viver, como por exemplo, ar, alimento, roupa e abrigo. Porventura queremos realmente a Deus da mesma forma? De fato, queremos tudo  mais, exceto a Ele, porque todas as necessidades comuns que normalmente se exigem para nosso viver são satisfeitas pelo próprio mundo externo. É somente quando sentimos a necessidade premente de algo que não pode ser suprido pelo mundo objetivo que verificamos não ter o mundo poder para saciar a sede e satisfazer a fome do coração; somente então dirigimos nossos olhos para dentro e procuramos ajuda internamente. Quando, após termos experimentado sofrimentos repetidos  aprendemos a lição de que tudo que temos feito é brincadeira de criança, que o mundo é irreal como um sonho, que toda e qualquer coisa que tentamos agarrar como se fosse propriedade nossa - escapa de nossas mãos, então o coração anseia por algo duradouro e eterno, cuja obtenção aniquilará pela raiz todas as necessidades e misérias. Esse algo é somente Deus. Tal tendência mental é o primeiro passo para a religião, especialmente a aversão pelos objetos mundanos e o sentimento de necessidade real de Deus.

 

298-    O Srimad Bhagavata dá a seguinte linhagem do adharma ou irreligiosidade como a causa da perdição: a esposa da Irreligiosidade é a Falsidade. Nasceu-lhes um filho a quem deram o nome de Orgulho e uma filha chamada Maya (Ilusão). Eles se casaram e tiveram um filho chamado Avareza e uma filha denominada Fraude. Da união desses dois nasceram Ira e Inveja. KALI (a Idade de Ferro) é seu filho e a Fala Maligna é sua filha. Kali faz surgir da Fala Maligna uma filha chamada Medo e um filho chamado Morte. O Tormento e o Inferno são o resultado desses dois e de ninguém mais.

 

299-    A família de dharma ou religião, causa da realização dos quatro valores supremos da vida humana consiste de treze irmãs a saber: Fé, Amizade, Paz, Compaixão, Alimento, Contentamento, Atividade, Progresso, Força, Inteligência, Clemência, Modéstia e Murti (forma). Estas são as treze esposas da Religião. Dentre elas, a Fé deu nascimento a um filho chamado Verdade; Amizade à Serenidade; Compaixão à Intrepidez; Paz ao Auto-Controle; Contentamento ao Gozo; Nutrição à Dignidade; Atividade ao Yoga; Progresso ao Auto-Respeito; Inteligência à Riqueza; Força à Memória; Clemência ao Bem-Estar; Modéstia à Humildade e Murti, a mais jovem esposa da Religião, a fonte de todas as virtudes deu à luz os Rishis, semelhantes a Deus: - Nara e NARAYANA, o Homem-Deus e o Deus-Homem.

 

300-    No momento de um conflito entre a cabeça e o coração, dê sempre ouvidos à voz do coração. A cabeça é o centro principal das faculdades intelectuais, dos órgãos do conhecimento ou percepção: o ouvido, da audição; o olho, da visão; o nariz, do olfato; a língua, do paladar; a pele, do tato. Da cabeça conseguimos todo o poder mental necessário para ter o conhecimento de qualquer objeto. O coração é o assento de todos os sentimentos, impulsos e experiências que tocam o âmago da personalidade. Os homens intelectuais adquirem capacidade nas várias Escrituras e ramos de conhecimentos e ciências: são mestres proeminentemente cultos, de inteligência aguda, hábeis e peritos em vários ramos do saber. Os homens de coração são ricamente dotados de nobres qualidades como a compaixão, amplitude mental, simpatia para com o sofrimento dos outros, amor por todos os seres, etc. Só o coração inspira o homem com os mais elevados sentimentos e o conduz ao reino da realização do Ser, proibido ao intelecto e à razão. Um homem de sabedoria livresca pode ser egoísta, vil e cruel, mas uma pessoa de grande coração jamais será dessa natureza, mesmo que isso lhe custe a vida.

 

301-    Cultive o coração de todo modo que puder. O coração é o gomukhi, a fonte primária do Ganges do amor. É só através do coração que a voz de Deus é ouvida; é no mais íntimo do coração que Ele Se revela. Não há necessidade de se estudar as Escrituras ou adquirir conhecimento para encontrá-Lo e realizar jnana, bhakti e moksha. Nem o caráter nem a personalidade são desenvolvidos e formados pela leitura. Os livros somente transformam as pessoas em eruditos presunçosos. “Não grantha (livro), mas granthi (nó, ligadura ), costumava dizer.

 

302-    O método moderno de aprendizagem é particularmente uma verdadeira Babel de incompatibilidades; produz indigestão mental de várias maneiras. Não é passar num exame, mas passar uma pash (corda) ao redor do pescoço. Que tristeza verificar que esse desejo de “passar num exame” tomou conta de nós, indianos! Devotamos a isso toda nossa energia física e mental na juventude, o melhor tempo da vida. A despeito da pobreza, juntamos dinheiro para tal propósito com grande dificuldade, suportamos tanta dor física e nos preocupamos. E que recompensa conseguimos no final de tudo? Perda de saúde e trevas por todos os lados por causa da derrota na luta pela existência! E para coroar de glória tudo isso, há que se manter mulher e filhos como resultado de um casamento prematuro. Em que confusão a pessoa se enreda! Tem um fundo de verdade o fato de nossas universidades terem sido denominadas “barracas de escravos” ou fábricas de escravos. A educação nas escolas e faculdades, do modo em que se desenvolve, não serve como ganha-pão nem tem muita utilidade na vida prática; ao invés disso, ela é nociva e faz perder a alma. É Especialmente entre os chamados “educados” que se encontra uma grande proporção de gente sem moral, sem fé na religião, desnacionalizados e mortos-vivos. Só os dotados de samskaras bons e incomuns conseguem sobreviver.

 

303-    Havendo nascido nesta rara vida humana, esforce-se por encontrar Deus, pois, encontrando-O, tudo se obtém e nada resta para se obter. Lute para conhecê-Lo, pois, conhecendo-O, tudo se torna conhecido e nada resta para se conhecer. Ame-O, pois, amando-O, todos os outros objetos do amor, todo o apego à “luxúria e posse” assemelha-se a cinzas e pó. Construa sua vida de maneira a torná-la imortal.

 

304-    É de necessidade extrema que se tenha aquela espécie de anseio e devoção ao mais elevado Ideal. A prática espiritual há de ser rigorosa e sincera. Um grama de prática pesa mais que uma tonelada de profissão. Uma gota de prema (divino amor) sacia a sede muito mais que o conhecimento das Escrituras que é vasto como o oceano. Prema é como  leite condensado, creme ou manteiga; e todo o conhecimento, tanto dos Vedas como o de outras Escrituras Sagradas é como se fosse leite desnatado. Discutir sobre doutrinas, aprendizado intelectual dos Shastras ou Escrituras Sagradas, leituras e coisas do mesmo estilo é para homens de nível inferior. Que eles possam se alegrar com essas coisas. Se assim desejarem, que bebam o leite desnatado; mas você deve beber o leite condensado, creme ou manteiga para contentamento de seu coração.

 

305-    A pureza é como o Monte Kailas encoberto pelas neves eternas, a morada da verdade, do bem e do belo. O Senhor Se reflete somente no coração puro: as grandes verdades espirituais só se revelam numa alma pura. Há muito, em eras passadas, nossos Yogues e Rishis descobriram verdades prodigiosas sobre o átomo; os cinco elementos sutis e primordiais, as funções internas do corpo, isto é, as atividades que se processam dentro do corpo em seu triplo agregado do corpo denso, orgânico ou sutil e elemental e as doenças que lhe ocorrem, se suas atividades se desviarem das funções normais, sobre o curso e influência dos astros  (astrologia), etc, fatos esses corroborados pela ciência moderna. Como foi isso possível? Eles jamais tiveram instrumentos científicos tais como telescópios ou microscópios nem laboratórios dotados de equipamentos modernos. As verdades abstrusas que descobriram ou lhes foram reveladas simplesmente surgiram pelo enfoque da visão interior de suas mentes puras sobre os problemas em questão e são um estarrecedor ponto de interrogação para os sábios do mundo civilizado de hoje.

 

306-    Se você aspira ao supremo amor de Deus, jnana e moksha, deve tornar-se puro interior e exteriormente, pois ambos, o corpo e a mente devem ser limpos e puros. O meio de o conseguir, dizia o Mestre, é pela “renúncia à mulher e ao ouro”, isto é, à luxúria e às posses. Tal renúncia é extremamente difícil, mas não impossível! Lute com toda sua força e verá que a prática contínua de esforço pessoal e disciplina espiritual intensos torna tudo possível. Mas não há possibilidade desse auto-esforço sem contar com a graça de Deus. Na verdade “só um ou dois em um milhão são liberados” como as pipas que têm seus barbantes cortados. Mas quem pode dizer se você não será um deles? Assim, prossiga com fé em si mesmo.

 

307-    Somos pecadores conscientes. Não nos abstemos de cometer pecados, mesmo sabendo o que estamos fazendo e também isso nos acarreta sofrimento; contudo, derramamos lágrimas de crocodilo por esse motivo, fingindo-nos de ignorantes, estúpidos ou idiotas. Os que pecam deliberadamente são realmente ateus. Pecadores assim, ainda têm uma chance de salvação, mas não há liberação para os que persistem obstinadamente no pecado, pois quem despertaria aquele que finge dormir? Religião não é brincadeira de criança! Nada que seja digno de se possuir será conseguido enquanto a “mente e a boca”, isto é, ações e palavras não estiverem harmonizadas, a não ser que a pessoa seja intensamente sincera.

 

308-    Nenhuma grande obra se realiza pela astúcia ou falsidade. Você pode se impor às pessoas através de demonstrações externas ou frases grandiloqüentes; mas a hipocrisia não tem valor algum em relação a Deus. Você enganará unicamente a si próprio. Todas as suas práticas e orações espirituais serão um trabalho tão infrutífero quanto derramar água numa jarra furada. Só pelo trabalho infatigável e pelo completo auto-sacrifício você formará seu caráter e executará a grande obra.

 

309-    “Não farei nada”, “eu não posso fazer nada”, “isso só será realizado se o fizeres para mim”- os néscios falam assim. “Ponha a comida em minha boca; só assim poderei comer!” É melhor que morram, tanto a sociedade como a pessoa que toma tal atitude, pois pela lei natural elas morrem perdendo a força e a vitalidade lenta e duramente. Viver em constante expectativa da ajuda de algum agente externo, visível ou invisível é tão bom quanto a morte, pois depender de alguém é um inferno e a liberdade é o paraíso.

 

310-    Por que havemos de ser fatalistas se aceitamos a doutrina do karma? A lei do karma proclama eternamente a mensagem da liberdade. Se me escravizei e me degradei devido ao meu mau karma, salta à razão que seguramente serei capaz de me reerguer pela influência de meu bom karma. Se posso me prender, então certamente, também poderei me libertar. A diferença está somente entre a vontade e a ação. Por que não seremos capazes de nos libertar, cortando os laços do mau karma com ação correta, boas obras e vida virtuosa? A humanidade enlouqueceria se não houvesse possibilidade de liberação. Se assim fosse, por que deveríamos fazer o bem ou nos esforçar para ser espirituais, sacrificando-nos quando se pode ganhar e lucrar mais, praticando ações egoístas? Desse modo, todo sentimento de fraternidade, bondade, compaixão, amor e espiritualidade teriam desaparecido do mundo e os homens teriam se transformado em verdadeiros animais.

 

311-    Como pode Deus que é Infinito encarnar na pequena e limitada forma física humana? A esta pergunta, Swamiji respondeu: “- sim, é verdade que Deus é infinito, mas não do modo como O concebem. Vocês entendem o termo “infinito” de acordo com suas idéias grosseiras: um vasto objeto material que preenche todo o universo. Por isso vocês se admiram de Deus, uma entidade tão grande e vasta, poder se contrair para entrar nesse diminuto corpo humano. Em realidade, o “infinito de Deus” significa Sua ilimitada essência espiritual e, por isso, não é condicionado por Se encarnar num corpo humano.

 

312-    Aquele que é BRAMAN - sem atributos - é também BRAHMAN com atributos. Não há diferença entre um Avatar e um jiva ou alma individual. O homem é compelido a nascer muitas e muitas vezes pela influência de suas próprias ações. Mas uma Encarnação assume forma humana em cada época puramente por Sua livre e espontânea vontade, para a preservação do mundo, para a destruição da irreligiosidade, para o ressurgimento da religião e também para conceder Sua graça aos devotos e homens santos. Além do mais, os jivas nascem sujeitos a prakriti ou natureza, constituída dos três princípios: sattva, rajas e tamas. Mas um Avatar não está sujeito a prakriti nem aos três princípios. Ele é Seu Mestre e controlador. O Avatar é Deus manifestado - só o invólucro externo da forma humana é material.

 

313-    Tudo que possamos conceber de mais elevado e glorioso com atributos só podemos compreender e ver manifestado num Avatar. Ele é a incorporação concreta de todos os atributos divinos. Deus mesmo age de múltiplas maneiras no corpo humano por Ele assumido. Mas o Avatar só revela Sua real natureza a um número limitado de devotos puros de coração e aos companheiros mais íntimos, com o propósito de cumprir uma missão especial no mundo. Como se comporta exatamente como um ser humano, as pessoas comuns não conseguem entendê-Lo e reconhecê-Lo, chegando mesmo a ridicularizá-Lo durante Sua permanência em vida corpórea.

 

314-    Como podem ser harmonizados o esforço próprio e a misericórdia de Deus? Essas duas palavras parecem ser contraditórias mas não o são. O esforço próprio é também uma dádiva de Deus: Sua misericórdia. Os devotos sem ânimo são de classe inferior. Veja como eram viris e heróicos os devotos Mahavira, Arjuna e Prahlada! Hanuman (Mahavira) não temia nem mesmo atravessar  mar, cruzou-o num salto, gritando: “- vitória a RAMA!” Prahlada não esmoreceu quando enfrentou repetidamente a morte mas, ao invés disso, tomou refúgio em VISHNU com a mente imersa Nele. Como resultado, VISHNU apareceu-lhe e salvou-o. A proeza de Arjuna é universalmente conhecida. Há muitas centenas de outros exemplos brilhantes nos Puranas.

 

315-    O devoto heróico diz: “- que tenho a temer, sendo eu filho da Divina Mãe, sendo eu um servo de Deus? Que existe que eu não possa fazer?” O devoto heróico exclama: “- a quem temerei nesse mundo cuja rainha é a Mãe, a Deusa Suprema? Eu posso comprar o estado de brahmacharya (a Mãe que é BRAHMAN) com a força de minha devoção”. E novamente: “- vem, ó Mãe a esse campo de batalha espiritual! Quero ver quem será derrotado, Mãe ou filho. Hoje, ó Mãe, decidirei isso duma vez por todas. Lutando Contigo, por que temer a morte? Capturarei facilmente o tesouro de mukti pelo som do tambor. O som agudo de minha língua vibrante escoará com o nome de KALI. Quem ousará continuar comigo a batalha? O sadhaka Rasikchandra dizia: “- ó minha Mãe! Eu a conquistarei na batalha pela virtude de Tua própria força!”

O Mestre costumava denominar apropriadamente esse estado como “devoção à maneira do ladrão”, ou seja, bhakti por violência, lançando-se ao tesouro de jóias da Mãe e pilhando-o com o terrífico grito de guerra “Mar, Mar!” Literalmente: “mata e destrói!”

 

316-    Deus ajuda e torna-Se compassivo com aqueles que são varonis. Os devotos sem coragem, entusiasmo e anelo são estéreis, sem vida e por isso são tamásicos por natureza. Pensam: “tomemos o nome de Deus de manhã - e à noite e sintamos alegria. Ele nos concederá Sua misericórdia e nos levará à meta quando a hora apropriada chegar. Aquilo que conseguirmos agora é suficiente. A ânsia de realizar Deus só lhes chegará após muitos nascimentos; são como assaltantes ordinários, cheios de temor e que se satisfazem com as quinquilharias que conseguem roubar. E, assim mesmo, podem se tornar ladrões experimentados, pois afinal, o roubo é feito numa casa onde o proprietário está desperto!

 

317-    Swamiji não podia suportar uma atitude covarde e aviltante em quem quer que fosse: - ele a detestava. Costumava dizer: “- isso é ateísmo; é uma espécie de enfermidade, uma demência. Se alguém se deprecia pensando: “eu não sou nada, não presto para nada”, torna-se uma não-entidade. Dizer isso é sinal de humildade ou egoísmo oculto? “Eu sou um pecador, sou totalmente indigno, sou um fraco” - continuando a pensar assim, a pessoa se tornará cada vez mais aquilo que pensa. O Ser não pode ser realizado pelos fracos! Aqueles que são fracos de corpo e de mente não podem praticar a religião, não é para eles. Nenhum trabalho de qualquer valor se pode esperar deles. Lance essas idéias daninhas aos ventos e, pelo contrário, seja positivo e diga: “em verdade, eu tenho infinita força dentro de mim mesmo; esse poder deve ser despertado. "Aquele que se considera um leão, procure escapar das malhas do mundo como um leão escapa da jaula”. Você há que ser um herói. “Abhih, abhih! Intrepidez, intrepidez! Deve esmagar o medo sob seus pés - quer pratique religião ou leve vida mundana; de outro modo permanecerá sempre submerso na escuridão em que já se encontra!”

 

318-    Tudo que for feito para seu bem real e para o de outrem é religião. Tudo o mais é irreligiosidade.

 

319-    Por mais que possa dar conselhos e instruções às pessoas que ainda não sentiram internamente a necessidade e a ânsia de auto-realização e que não têm sede de liberação, todo seu trabalho será em vão. O que eles ouvem por um ouvido deixam sair pelo outro. Em nosso país até mesmo os camponeses iletrados são filósofos; eles compreendem instintivamente as mais altas verdades da religião melhor que muitos eruditos do Ocidente. “BRAHMAN é real e o mundo é falso”- escutamos esta frase desde nossa infância. Se o solo não está preparado e as boas sementes não forem semeadas no devido tempo, como poderá a colheita corresponder à expectativa? A devoção daqueles cujo gosto pelos prazeres mundanos desapareceu, arde como uma centelha de fogo que cai num monte de feno. Lala Babu deixou seu lar, renunciando ao mundo, ao ouvir uma só palavra do tintureiro: “ateie fogo ao vasana!” Há um trocadilho com a palavra vasana aqui descrita que significa em bengali ao mesmo tempo “desejo” e “hastes secas de bananeiras”, que se queimavam até se reduzirem a cinzas, sendo usadas pelos tintureiros como alvejantes para limpar as roupas. Vilvamangal despertou devido à advertência que lhe fizera uma prostituta - renunciou ao mundo imediatamente e se tornou um mendigo por amor a KRISHNA. Que maravilhosa e austera vida de devoção eles levaram em Vrindavan, alcançando o objetivo a que aspiravam! Acontece exatamente da mesma maneira àqueles que estão para alcançar a realização nesta mesma vida.

 

320-    Seja perfeitamente sincero e todos os seus pecados serão perdoados. A sinceridade salvá-lo-á de uma infinidade de faltas. Um homem sincero, mesmo que seja um desprezível pecador, conquista a graça de Deus no devido tempo e se torna um santo.

 

321-    A vida não é um solo estéril. Sem o cuidado e o cultivo devidos torna-se uma selva cheia de plantas e feras, escorpiões e serpentes rastejantes, fazendo com que surja o medo. Se neste mesmo solo - a vida humana- for cuidadosamente cultivado, se as disciplinas espirituais prescritas pelo Guru forem firmemente praticadas com fé e devoção, trarão riquezas, felicidade, paz e bênçãos inestimáveis.

Assim cantava o Sadhaka Ram Prasad:

 

“Ó mente, não conheces a arte do cultivo!

Abandonas um solo tão fecundo - a vida humana-

que te poderia dar ouro e diamantes!”

 

322-    Nada há no mundo que seja matéria morta, sem vida. Aquilo que denominamos com estes termos é consciência ou inteligência cobertas por tamas, trevas ou ignorância. Quando essa capa de tamas for removida, a treva de Maya desaparecerá e a consciência pura ou Supremo Espírito será revelado. O mundo então se mostrará como sendo Todo Espírito e a fonte de Bem-Aventurança transbordará.

 

323-    No universo nenhum pensamento, ação ou energia se perdem. Oportunamente, de alguma maneira imprevisível, darão seus frutos aqui ou mais adiante, na forma de felicidade ou miséria, de acordo com a natureza boa ou má do impulso. Assim, você que tem intenções nobres, se deseja o mais elevado bem, siga o caminho da retidão e evite o caminho do mal.

 

324-    Sri Chandi é uma parte do Markandeya Purana, o mais sagrado de todos os livros dos adoradores do culto de SHAKTI. É cantado com as devidas cerimônias e regras shástricas, diariamente ou em dias lunares especiais, em ritos solenes para favorecer planetas e divindades funestas a fim de evitar possíveis males, para assegurar prosperidade ou se livrar de alguma doença incurável e, invariavelmente, como um acessório ao puja da Mãe Divina. Swamiji costumava dizer que uma idéia tão perfeita envolvendo a Suprema Divindade não se encontra em qualquer outra escritura religiosa do mundo, conforme é descrita no Chandi, na meditação e adoração da DEVI ou Mãe Divina. Além disso, há muitas coisas para se aprender e serem  praticadas no Chandi. Uma delas é considerar toda mulher como mãe, como parte da Mãe Universal, devendo ser respeitada como tal. Esta atitude é totalmente ilustrada na vida de Sri Ramakrishna.

 

325-    O Chandi descreve de que maneira Devi Chandika lançou-se à luta na batalha entre os Devas e os Asuras, incorporando o poder de todos os Devas e por esta incorporação personificada de energia agregada dos Devas, a terrível força dos odiosos demônios foi derrotada. A adoração de SHAKTI é, de fato, a invocação do Divino Poder concentrado na forma da Mãe do Universo.

 

326-    Aplicando a lição acima à presente situação da Índia: se, com o propósito de fazer o bem ao nosso país e ao nosso povo, esquecemos todas as diferenças entre nós mesmos e nosso interesse pessoal, unindo-nos e trabalhando juntos com uma só mente, obedecendo implicitamente à um líder escolhido, qualquer poder hostil, por mais poderoso que seja, não ousará nem poderá enfrentar-nos ou subjugar-nos. Seremos vitoriosos em todas as frentes.

 

327-    Pelo fato de nós, hindus, não sermos uma comunidade organizada compactamente, tornamo-nos fracos e desamparados. Daí sermos tiranizados de várias formas e termos de suportar tudo silenciosamente, fazendo da necessidade uma virtude. Consolamos nossas mentes com a idéia de que estamos praticando ahimsa mas, na realidade, estamos enganando a nós mesmos. Mahatma Gandhi condenava essa atitude como a “não-violência dos fracos”. A observância da verdadeira ahimsa em sua opinião é a “não-violência dos fortes”, isto é, alimentar o espírito de ahimsa para com o inimigo, tratando-o com amor, apesar de seu poder e habilidade, lhe revidando os atos de tirania, conseguindo assim abatê-lo. Este também era o pensamento de Swamiji. “Se para se vingar de um erro ou duma afronta não fores capaz de devolver as bofetadas em ambas as faces do teu agressor em resposta à ofensa recebida ou se verificares que ele está pronto para te matar e não fores capaz de matá-lo, como poderás exigir que te chamem de homem? Essa não-violência de tua parte não é um sinal de masculinidade”.

 

328-    Antes que Swamiji partisse para sua peregrinação a Amarnath, alguém lhe perguntou: “- Senhor, que devemos fazer ao vermos os fortes oprimindo os fracos?” Ele respondeu imediatamente: “- ora, batam nos fortes, sem dúvida!”. Disse ele numa ocasião similar: “- mesmo o perdão, se for fraco e passivo, não é real! A luta é melhor. Perdoa quando for possível trazer legiões de anjos para uma vitória fácil”. “Para o chefe de família, auto-defesa!”

 

329- Para que os hindus possam viver como nação é absolutamente necessária a aquisição de fortaleza. O meio principal de consegui-la é a união. Se tivermos fé firme em nossa religião, se não temermos dar nossas vidas pelo bem da religião, ninguém ousará aviltá-la nem profanar nossas imagens e templos. De modo idêntico, ninguém ousaria violar nossas mulheres e tratá-las de maneira tão desumana e abominável. Não há outra saída para os hindus sobreviverem como nação a não ser unindo-se e fazendo com que suas mentes soem em uníssono. Preservarão o dharma, a sociedade, a cultura e a própria nação se puderem se unir, esquecendo as diferenças de classe e os interesses particulares de pessoas e de grupos, banindo a malícia e a inimizade entre si; então, as pessoas de outras crenças temerão aviltar nossas regras e costumes  religiosos.

 

330- Nos tempos do Monastério de Baranagore, Swamiji contou aos seus companheiros (Gurubhais) a seguinte parábola: “um proprietário de terras tinha dois jardineiros. Um deles costumava sentar-se a maior parte do tempo diante dele com as mãos cruzadas e falar numa voz embargada de devoção: “- ah! Quão lindos são os olhos do meu mestre! Que nariz encantador! Que linda aparência!” E assim por diante. O outro jardineiro trabalhava o dia todo nos campos, produzindo uma variedade enorme de vegetais, flores e frutas e, colocando-as diante de seu amo todos os dias, saudava-o prosternando-se diante dele e ia embora. Qual dos dois agradava mais ao proprietário de terras? Do mesmo modo, o Senhor se agrada mais daquele que executa os deveres com ardor, considerando todo o trabalho como Sua adoração do que daquele que procura lisonjeá-lo  só com o cântico de hinos ou aleluias, negligenciando seus deveres. Dirigindo-se aos companheiros, Swamiji exclamou: “- tomai cuidado para que não vos misturais com o grupo dos que dizem: - quão lindos são teus olhos! Que nariz encantador! Ou com Ghantanarar Daley, isto é, com aqueles que só tocam o sino diante da Divindade no serviço vespertino”, aludindo àqueles cuja única ocupação é a adoração cerimonial.

 

331- O despertar da espiritualidade significa Realização do Atman ou Ser. É verdadeiramente religioso aquele que o consegue. De fato, todos nós somos ateus. Se pudéssemos ver a Deus externa e internamente em nós mesmos, se estivéssemos convencidos de que Ele é onipresente, como poderíamos cometer tantas faltas? Se pudéssemos acreditar que pela Sua onisciência Ele conhece todos os nossos maus pensamentos, não renunciaríamos a eles, envergonhados? Se soubéssemos que pela Sua onipotência Ele tem o poder de nos lançar ao inferno como punição por nossos atos pecaminosos, não desistiríamos deles, atemorizados? Tentamos ser bons externamente temendo a vergonha, o escândalo ou a punição, mas não no verdadeiro sentido. Mostrando-nos religiosos, não nos abstemos de praticar atos iníquos, cuidando somente de fazê-los engenhosa e secretamente, evitando o olhar público, receosos de sermos descobertos. Aqueles que admitem ser ateus são mil vezes melhores do que pessoas de tal caráter.

 

332-  Swamiji costumava dizer: “- ajuda a outrem quando puderes e de toda maneira que puderes, mas discerne qual o motivo que te leva a fazê-lo. Se o fizeres com algum fim egoísta ou para tirar alguma vantagem, sabe que isso não beneficiará nem àqueles a quem ajudas nem a ti. Por outro lado, se o motivo que te induz a agir é inegoísta, teu serviço trará não somente felicidade e bem-estar aos outros, mas também bênçãos infinitas a ti mesmo. Isto é tão certo como é certo que vives”.

 

333- Puja ou adoração é de duas classes: externa (cerimonial) e mental. Na primeira, puja é executado diante da imagem ou quadro da Divindade, de um jarro de metal ou barro, de um símbolo de pedra ou madeira, etc, invocando-se o sopro vital presente nesses objetos. Como seres humanos, todas essas coisas, necessárias à manutenção da vida ou que nos dão prazer, satisfação e contentamento são oferecidos em adoração. Por exemplo: água para lavar os pés e a boca; arghya, um assento, vestido, enfeites, ornamentos, grinaldas de flores, pasta de sândalo, flores de fragrância suave, incenso e lâmpadas acesas; naivedya, frutas e raizes, doces, arroz cozido, puris e curries, payasa ou arroz doce e água para beber; tâmbula (folha de betel preparada com especiarias para mascar após as refeições). Em seguida, um leito, leque para abanar, cânticos de hinos, música vocal e instrumental, danças; atatrika ou o serviço vespertino de movimento de luzes e queima de cânfora, etc. Na falta de qualquer dos elementos mencionados, o puja pode ser feito com a simples oferenda de água feita com devoção.

 

334- Na adoração mental não há necessidade de quaisquer materiais ou acessórios e nem mesmo de uma imagem da Divindade. No puja mental medita-se em Sua forma no íntimo do coração, imaginando-se a oferenda mental dos objetos de adoração à Divindade. Neste puja, o brahmin, o chandala e o chamado “intocável” têm os mesmos direitos: não há obrigação de observância de pureza física ou limpeza cerimonial, nem de tempo ou local, nem de qualquer regra shástrica. Requer-se somente a absorção da mente.

 

335- Todos os alimentos ou comestíveis são propriedade geral dos seres viventes, cada um tendo sua porção; tal é o ensinamento dos Upanishads. Não se pode pôr na boca o menor bocado de comida sem que se prive ou cause mal a outro. Aquele que cozinha para si e come sem primeiro oferecer alimento à Divindade e separar a parte dos atithis famintos (mendigos andarilhos), dos animais e dos pássaros é chamado pecador em nossos Shastras e tal comida é considerada pecaminosa. Os Shastras apontam inclusive sofrimentos no inferno para o chefe de família que se alimenta sem repartir com um homem faminto (Brihadaranyaka Upanishad, Cap.I, 5o Brahmana, 2a Sloka). Conforme a capacidade de cada um, deve-se fazer o máximo que se puder.

 

336-  O que quer que seja executado para se obter felicidade ou algum fim egoísta para si mesmo ou para a própria família e parentes não é dharma e sim assuntos mundanos. O apego excessivo à esposa, filhos e parentes chama-se Maya; refere-se à vida mundana ou samsara. O amor para com todos os seres chama-se prema, daya (compaixão). Similarmente, qualquer trabalho de mérito religioso, com austeridades, adoração e disciplinas religiosas, praticado com o objetivo de bem-estar e felicidade nesta vida ou na outra é egoísta e, nesse sentido, não é dharma nem espiritualidade. Mas esse trabalho, executado para o bem de todos os seres, sem qualquer desejo de gozo dos frutos e feito com a idéia de que todos têm parte igual em seus méritos produz mil vezes mais frutos para si mesmo e para os outros. O Senhor Buddha, personificação da misericórdia, declarou: “- enquanto todos os seres no mundo não alcançarem a salvação, eu não quero meu próprio mukti!” Que grande ideal!

 

337-  Mas, se você executar o trabalho inegoisticamente pelo bem de outrem e, secretamente alimentar a esperança de obter um resultado que lhe dê mil vezes mais, isso deixará de ser nishkama karma, ou seja, trabalho sem desejo. É o mesmo que plantar um fruto visando colher mil; é como as pessoas idiotas, tentadas a trapacear convertendo notas de dez rúpias em supostas notas de cem rúpias ou que entregam moedas de ouro ou enfeites para serem trocados por outros com cem vezes mais de peso e que, no fim acabam perdendo tudo que têm nessa barganha.

 

338-  Sri Ramakrishna não só foi a personificação viva da harmonia de todas as religiões como também o exemplo brilhante da perfeição na prática dos quatro Yogas - jnana, bhakti, karma e raja- em conjunto. Eis a única maneira de moldar um caráter totalmente perfeito. Iluminado pela luz de sua vida, Swamiji proclamou esta grande verdade da prática simultânea desses quatro Yogas e assentou-a como a senda da sadhana e o ideal do Ramakrishna Math e da Missão fundada por ele. Esta idéia foi maravilhosamente ilustrada no emblema do “Ramakrishna Math and Mission” que é uma criação de seu gênio. Este emblema está reproduzido abaixo com a interpretação dada por Swamiji.

 

339-  A expansão das águas do lago em forma de ondas no quadro representa karma; o lótus - bhakti; o Sol nascente - jnana; a serpente formando o círculo, o poder de kundalini desperto; o cisne simboliza o PARAMATMAN, o Ser Supremo Assim, o emblema traz a idéia de que, quando no Yoga se unem karma, bhakti e jnana, o PARAMATMAN é realizado.

 

 

 

- (REPRODUZIR AQUI NESTE LOCAL O EMBLEMA) -

 

 

 

340- A realização do ATMAN não significa só a percepção de BRAHMAN como seu próprio Ser mas também a visão de todos os seres como BRAHMAN. De acordo com os Upanishads, ver BRAHMAN em toda parte, dentro e fora de si mesmo é o sinal da Suprema Realização ou mukti. Encontramos uma evidência direta disso nas vidas de Sri Chaitanya e Sri Ramakrishna. Esta doutrina da identidade do jiva com BRAHMAN, sendo o propósito da sadhana dos Yogues e Rishis que vivem nas colinas e florestas e dum pequeno número de aspirantes espirituais, foi por longo tempo ocultada nas cavernas das montanhas e confinadas nas páginas dos Shastras e nos tratados dos filósofos.

Tendo Swamiji recebido conselhos de Sri Ramakrishna sobre a aplicação prática desta grande verdade nas vidas diárias dos chefes de família e sannyasins, sem distinção, proclamou ao mundo a idéia de servir a todos os seres vendo neles NARAYANA. Ele insistia que, pela prática, a Doutrina Vedântica da identidade do jiva com BRAHMAN  pode ser percebida diretamente e aplicada à serviço do homem. Com o propósito de ensinar à humanidade que o ideal “da salvação de si próprio é fazer bem ao mundo”, além de não ser contraditório, é mutuamente auxiliador.

 

341-A doutrina do serviço a Nara-NARAYANA (homem como Deus) iniciada por Swamiji é inteiramente nova. É radicalmente diferente do serviço humanitário dos bhikshus no período budista ou dos monges Católicos Romanos na Idade Média. O serviço dos monges budistas em prol da humanidade sofredora se inspira na misericórdia e compaixão como um meio de ajudá-los a alcançar o Nirvana. O serviço dos monges católicos foi também despertado pela compaixão e misericórdia. Mas em tais métodos de serviço, a idéia da distinção entre sevya-sevaka (servido e servidor) é inevitável. Os que servem desta maneira se colocam num pedestal mais elevado e acham que é dever dos servidos lhes serem gratos. Mas o serviço dos “Narayanas aflitos e dos Narayanas pobres”, palavras inventadas por Swamiji baseadas na idéia do advaita ou unidade proclamada pelos Upanishads, não faz diferença entre o doador e o que recebe, pois eles são uma só entidade do ponto de vista do ATMAN. Além disso, o fato de os receptores proporcionaram aos sevakas a oportunidade, o direito e o privilégio de servi-los como NARAYANA, deve levá-los a sentir-se muito mais gratos. Swamiji disse mesmo: “- que o doador se ajoelhe e adore, que o receptor permaneça de pé e permita!” Que grande diferença entre a velha e a nova idéia!

 

342- Se o Deus ou a Deusa podem ser invocados e adorados como BRAMAN ou como o ATMAN interno na matéria morta e inerte de uma imagem de barro ou madeira, jarra de barro ou metal, pedra ou retrato, por que então não adorá-lo no ser humano vivo que constitui a maior de todas as criações de Deus? A adoração do homem não significa a adoração do seu corpo denso, mas sim a adoração do NARAYANA residente como ATMAN dentro de mim e igualmente o mesmo dentro de todos os homens e mulheres existentes; que Ele está diante de mim na forma do ignorante, do pobre e do enfermo; servi-los com o pensamento da não-diferença, com todo cuidado e devoção, dando-lhes conhecimento, roupa, remédio e alimentando-os; isso constitui literal e espiritualmente a adoração do homem. Do mesmo modo que no puja de outros Deuses e Deusas, nesta adoração também tudo se torna trabalho perdido a não ser que haja a idéia de não-diferença do ATMAN. Os Shastras dizem: “- adora a SHIVA tornando-te o próprio SHIVA”. “Adora o Deva tornando-te o próprio Deva”.

 

343- Esta adoração de Nara-NARAYANA instituída por Swamiji, mas de karma inegoísta e desapegado para o bem dos outros a fim de se obter purificação do próprio coração é também um processo inteiramente novo de sadhana para a realização do PARATMAN ou Ser Supremo através da prática da harmonia maravilhosa de jnana, raja, bhakti e karma-yoga. E, pelo fato de ser assim, leva diretamente à realização de mukti. Pois nessa senda, o homem tem que ter a concepção de Deus pelo jnana-yoga como seu próprio ser, meditar Nele através de raja-yoga como o Ser Interno, estar ligado a Ele pelo bhakti-yoga com devoção e, através de karma-yoga, servi-lo com ações desinteressadas e inegoístas.

 

344- Esta doutrina de Nara-NARAYANA instituída por Swamiji, além de conferir ao homem a mais elevada honra, tem ainda outra característica: a de conduzi-lo a mukti. De acordo com ela, o homem não é baixo e depravado nem objeto de piedade, mas é SHIVA, merecedor do mais elevado respeito. A maioria dos padres e pregadores de religiões que se consideram os únicos representantes de Deus na Terra colocaram-No muito alto nos céus, num trono ornado de jóias, como um juiz severo, dispensando castigos eternos no inferno pelos pecados dos homens que nascem do pecado. E, estando as chaves do Paraíso sob a guarda dos padres, eles promulgaram como lei divina que os pecadores e  arrependidos adquirirão o direito de entrar no céu caso possam dar dinheiro e propriedades valiosas aos representantes de Deus na Terra.

 

345- Firmando-se contra essa doutrina mortal e deprimente, Swami Vivekananda, de voz tonitroante, proclamou no Parlamento Mundial das Religiões em Chicago: “- quem diz que sois pecadores, vós, filhos da Bem-Aventurança imortal? Vós sois herdeiros da imortalidade! É um pecado chamar-vos pecadores! Conhecendo o Senhor Supremo, atravessai o oceano do nascimento e morte. Não há outro caminho de liberação!” Que mensagem de esperança imortal! Do ponto de vista do ATMAN, as chamadas classes inferiores, os desamparados, os indigentes, os “intocáveis” são SHIVA vivente e, por isso, dignos de nosso serviço e adoração. Essas notícias alegres e estimulantes foram pela primeira vez proclamadas com palavras de austeridade por Swami Vivekananda; e a luz deslumbrante da inspiração foi seu Divino Mestre Sri Ramakrishna.

 

346- Nos tempos modernos vemos em todo o mundo o homem matando impiedosamente seu semelhante, uma nação destruindo desapiedadamente a outra para satisfazer seus desejos e interesses egoístas. Nesta época, a indigna atitude dos homens entre si é um insulto à humanidade; sua atitude vil, seu comportamento dominador e doente atingiram um ponto extremo. Com sede sanguinária, o homem ultrapassou até mesmo o comportamento dos animais mais selvagens e ferozes. As nações poderosas ditas avançadas do Oriente e Ocidente, em nome do patriotismo e progresso nacional e com o disfarce de estabelecer a paz e implantar a civilização, levam à ruína completa as nações fracas e atrasadas, roubando-lhes as riquezas e posses. Aos olhos do Ocidente, os que não são brancos, os povos não-cristãos do Oriente não são homens, são bárbaros sem civilização! Ó! Eles são criados por Deus como instrumentos da produção de objetos de gozo para Seu povo escolhido, os senhores brancos! Um pensamento tão ofensivo e a rivalidade entre eles pela posse de todos os materiais de gozo foram as causas-raízes das duas guerras mundiais em nossa geração, as quais ocasionaram um cataclismo  universal.

 

347- Mesmo na Índia, atitudes tomadas em nome da sociedade, da religião, da seita e adhikaravada (doutrina de direitos e privilégios especiais nas funções religiosas), sectarismo, reconhecimento de diversos tipos de diferenças e o costume da intocabilidade, fizeram crescer o ódio e as hostilidades mútuas. Esses acontecimentos estão exercendo uma pressão terrível e saturando a vida nacional com toda a sorte de privação, miséria e desgraça. Assim, é evidente quer no Oriente, quer no Ocidente, que a adoção destas opiniões ultrajantes e desprezíveis para com os homens e nações, com o conseqüente comportamento monstruoso que engendram, é a causa-raiz de toda a malícia e hostilidade que reinam no mundo. O serviço ao ser humano como NARAYANA iniciado por Swamiji é o único meio de resolver esse problema tão difícil. Com tal finalidade em vista, Swamiji colocou diante de toda a humanidade este elevado ideal, imbuído do espírito de  igualdade, amizade e fraternidade universais. Aconselhou aos homens que regulassem e modelassem suas vidas em todas as esferas: social, religiosa e até mesmo na dos pequenos atos da vida diária, para atingir o objetivo. Pregar este grande Ideal ao mundo e lhe indicar os meios de fazê-lo frutificar é o propósito precípuo do Ramakrishna Math e da Missão Ramakrishna fundados por Swami Vivekananda.

 

348- Deus é amor e lei combinados. Todo amor e misericórdia como Mãe e dispensador de justiça como Pai. Ele é o doador dos frutos da ação e também o destruidor dos grilhões do destino daqueles que tomam refúgio Nele.

 

349- O vento junta as nuvens para dispersá-las novamente. As nuvens ocultam o sol como Maya oculta o Ser. Quando as nuvens se dispersam, o sol brilha. É a mente que cria os grilhões e ela também os destrói. Quando Maya é destruída internamente, o Ser refulge em Sua própria glória. Se Maya é somente uma sombra passageira, como pode revelar o Ser que é eternamente real e auto-manifestado?

 

350- Dizia Swamiji: “- as idéias de Sri Ramakrishna sobre a reconciliação de todas as religiões e da religião universal devem não só ser pregadas no mundo como um ideal de treinamento, mas também têm que se tornar práticas e efetivas na vida diária. Isso quer dizer que temos que refletir em nossas vidas, em nossas ações diárias sobre a espiritualidade dos hindus, a compaixão dos budistas para com todos os seres, a atividade organizada dos cristãos e o espírito de fraternidade dos muçulmanos. Com este objetivo em vista, temos de estabelecer a religião universal para toda a humanidade sem levar em conta  casta,  credo e  cor.

 

351- O hinduísmo gerou o budismo; o budismo gerou o cristianismo; o cristianismo gerou o islamismo. Essas quatro religiões devem se encontrar e se juntar na Índia, na época moderna, para formar um todo harmonioso. De acordo com Swami Vivekananda, Sri Ramakrishna nasceu com a missão de reconciliar as discussões e lutas dos filhos, dos netos e bisnetos, estabelecendo a paz e a boa vontade novamente na Terra.

 

352- Durante toda sua vida você ouviu muitos conselhos espirituais e teve instrução suficiente para se guiar. Conhece suficientemente os preceitos religiosos e com certeza prega-os aos outros também. Mas quem irá ouvi-lo a não ser que você possa mostrar que praticou ao menos uma parte dos ensinamentos em sua própria vida? Há uma enorme diferença entre a prática e a pregação. Não é necessário para a própria salvação ler volumes de Escrituras e ouvir sermões. Se puder pôr em prática na vida nem que seja um único preceito que conduza ao caminho da liberação, você se sentirá abençoado e o mundo será beneficiado. E, pela graça da Mãe do Universo, deixará essa vida indo para o reino da bem-aventurança, cruzando o oceano sem praias da existência terrestre!

 

353- Irmãos, viemos do ventre de nossas mães nus e sozinhos. Temos que deixar esse mundo também sós ninguém nos acompanhara, nem mesmo nossos mais queridos que não podem viver um momento sem nós, nem nós sem eles. Nem podemos tampouco levar conosco qualquer de nossas tão queridas propriedades,  mais bem consideradas que nossas próprias vidas. O choro do recém-nascido assinalou-lhe a vida e foi saudado com alegria por outros. Que chorem quando partir, mas sua partida será calma e em paz, com alegria celeste e bem-aventurança que emanam em seu semblante desde as insondáveis profundezas de seu ser. Terá então vivido sua vida de verdade. A vida não terá mais encanto e a morte não o amedrontará; terá conquistado a vida e a morte: encontrar-se-á num reino além da vida e da morte, além dos grilhões e além de mukti, além da luz e das trevas, além do bem e do mal, além do prazer e da dor; distante, bem distante de todos os pares de opostos. Esse é o reino do conhecimento de você mesmo, encontrando-se a si próprio como realmente é. Esse é o reino da eterna paz-existência-conhecimento-felicidade absolutos. Se aspira alcançar esse reino eterno, o supremo objetivo da vida, livre-se de toda Maya, todo apego ao irreal, siga os ensinamentos dos Mestres, seres perfeitos, profetas da Verdade, e afine-se com Seu Espírito. A realização será mais fácil de se alcançar com a ajuda de um Sad-Guru representante visível do seu Ideal Escolhido. Essa é toda a Verdade, o ponto principal dos ensinamentos de todas as escrituras. Só Ele é Real, tudo o mais é falso! Tat twam asi! Tu és Aquele! Esta é a verdade primordial que deve florescer em todo ser humano nesta vida ou depois de rondas intermináveis de nascimento e morte, conforme a lei da natureza.

Possa você, meu próprio ser querido, realizar a verdade agora, pela graça de Deus e ser livre desde este momento sempre e eternamente! Deus vos abençoe a todos! OM! Shanti! Shanti! Shanti! OM!

OM! A paz esteja convosco e comigo! A paz esteja interna e externamente em todos os lugares! A paz esteja com todos os seres! Que a paz esteja na Terra e em todas as esferas dos céus!

 

Paz!Paz!Paz!    OM! OM! OM!

 

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